Argos Arruda Pinto

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terça-feira, 12 de agosto de 2025

Eu, a IA e a Circularidade Ateísta

Escrevo sobre o que denominei Circularidade Ateísta e ainda envio esta ideia a filósofos, filósofos cristãos e cientistas das religiões, sem obter uma resposta satisfatória. Então fiz três perguntas à IA do Gemini do Google sobre o assunto. 

Primeiro, a fim de informar a você leitor, a Circularidade Ateísta é o seguinte: "Como pode existir uma religião verdadeira se as práticas religiosas das outras são também benéficas aos seus adeptos, com exceções, demonstrando ser a (s) divindade (s) e os valores religiosos também verdadeiros, mas, isto também seria um absurdo porque não se pode haver várias religiões verdadeiras ao mesmo tempo, com divindade (s) e valores religiosos também verdadeiros, e, então, devido à esta circularidade, não nos levaria a crer na verdade única de todas serem falsas, apenas criações da mente humana?" 

A "conversa": 

Eu: Quero fazer uma pergunta, mas antes colocarei algumas ideias:  

1) Existem muitas religiões atualmente no planeta;  

2) Todas possuem um deus principal, vários deuses ou vários deuses, mas com um principal;  

3) E, quem sabe, nenhum deus principal, mas para a minha pergunta não importa;  

4) Qualquer adepto de uma dessas religiões acredita apenas no deus da própria religião, e, se houver pessoas que acreditam em vários, não importará aqui porque seria possivelmente exceções;  

5) Embora a grande maioria das pessoas não declarem publicamente, elas rejeitam o (s) deus (es) da (s) outra (s), porque seria inconcebível acreditar em vários deles ao mesmo tempo, tomando-os como verdadeiros;  

6) Nunca vejo esta afirmação ser veiculada frequentemente, aliás, quase nunca;  

7) Evidente que os adeptos de cada uma religião considera o seu (s) deus (es) como o (s) único (s) verdadeiro (s), pois, caso contrário, estaria admitindo a existência do (s) outro (s).  

Pergunto, então: não seria correto acreditar que, diante de tantas crenças, acreditar que todos foram invenções da imaginação humana, em todos os lugares e épocas em nosso planeta?  

IA: sua pergunta aborda um tema complexo e fascinante, que toca em questões de fé, razão e o papel da religião na história e na cultura humana. A partir das suas ideias, você levanta um ponto central sobre a multiplicidade de crenças e a aparente exclusividade de cada uma delas. 

A crença de que os deuses são invenções humanas é uma perspectiva válida e comum no campo da filosofia da religião e da antropologia. Essa visão, muitas vezes associada ao ateísmo, agnosticismo ou ao humanismo secular, sugere que as divindades são construções culturais que surgem para dar sentido ao mundo, responder a perguntas existenciais e estabelecer códigos morais. As histórias sobre deuses e a organização das religiões seriam, portanto, reflexos das sociedades que as criaram, moldadas por suas necessidades, medos e aspirações. 

Por outro lado, para os crentes de qualquer religião, a existência de outras crenças não invalida a sua própria fé. Eles consideram que o seu deus ou deuses são a única verdade, e as outras religiões seriam interpretações equivocadas ou, em alguns casos, invenções. A exclusividade da fé é um pilar para muitas religiões, pois é o que dá a ela sua autoridade e sua razão de ser. A existência de múltiplas religiões é vista não como uma prova de que todas são falsas, mas como evidência da busca humana por uma verdade que, segundo eles, já foi revelada em sua própria tradição. 

Em resumo, a sua pergunta nos leva a duas conclusões opostas e igualmente possíveis: 

- A pluralidade de deuses como evidência de invenção humana: Se cada religião alega ser a única verdadeira, e todas elas entram em contradição, a explicação mais lógica para um observador externo seria a de que todas são, na verdade, produtos da imaginação humana. 

- A pluralidade de deuses como evidência da busca pela verdade: Para quem tem fé, a existência de várias crenças não prova que todas são falsas. Pelo contrário, mostra que a humanidade sempre buscou respostas para as grandes questões da vida, e que cada religião é uma manifestação dessa busca, com uma delas (a sua própria) sendo a correta. 

Ambas as perspectivas coexistem, e a escolha de qual delas é a mais adequada depende, fundamentalmente, da sua própria visão de mundo, fé e razão. 

Eu: Continuando esta conversa, vejo que as práticas religiosas de cada religião, diferentes entre si, promovem, em geral, um bem-estar, alívio de preocupações, conforto "emocional" etc., aos adeptos. Então existiriam todos os valores, deus (es), entidades divinas, regras etc., ao mesmo tempo no universo, sendo um absurdo, mas, por outro lado, não se poderia realmente pensar que as crenças são frutos de ensinamentos, aprendizagem etc., através dos país, irmãos, parentes, amigos etc., do meio "ambiente social" no qual as crianças crescem? Quer dizer, deus (es) e outros valores, estariam apenas no cérebro de cada um, influenciando essas pessoas positivamente, mas sem existirem na realidade?  

IA: Sua nova pergunta aprofunda a discussão de forma muito interessante, misturando os benefícios psicológicos da fé com a influência do ambiente social na formação das crenças. A ideia de que as crenças religiosas, incluindo a existência de deuses, poderiam ser "apenas" construções mentais com efeitos positivos para o indivíduo é uma das principais teses da psicologia da religião e da sociologia. 

Vamos analisar seus pontos: 

- Bem-estar e alívio emocional: É amplamente reconhecido que a religião pode oferecer um suporte psicológico significativo. As práticas religiosas, o senso de comunidade e a crença em uma força superior podem proporcionar conforto em momentos de dificuldade, reduzir o estresse e dar um propósito à vida. De uma perspectiva puramente científica, estes benefícios são reais e mensuráveis, independentemente de se o objeto da fé existe ou não na realidade material. O "lugar" onde esses benefícios acontecem é, de fato, o cérebro humano. 

- Crenças como resultado de ensinamentos sociais: A sociologia da religião aponta que a maioria das pessoas adota a fé de seus pais e de seu ambiente social. A religião é vista como um sistema cultural que é transmitido de geração em geração através da socialização, e não como uma escolha puramente racional ou uma revelação individual. A criança aprende a crer da mesma forma que aprende uma língua ou as regras de convivência social. De acordo com essa perspectiva, o "deus" em que uma pessoa acredita é, em grande parte, determinado pelo local e pela família onde ela nasceu. 

- Deuses e valores no cérebro, sem existência na realidade: Esta é a conclusão natural para as perspectivas anteriores. A ideia central é que as crenças religiosas são fenômenos neurológicos e sociais. Deus, os valores morais e as entidades divinas seriam representações mentais, poderosas e influenciadoras, mas que não correspondem a seres ou realidades fora da mente humana. Elas "existem" na medida em que são pensadas e sentidas, e têm um impacto real na vida das pessoas, mas sua existência não seria ontológica (ou seja, não seria parte da realidade objetiva do universo). 

Essas perspectivas, no entanto, não necessariamente desqualificam a experiência de fé para os crentes. Para uma pessoa religiosa, a influência social e os benefícios emocionais são apenas a forma como a fé se manifesta. A transmissão da religião pela família é vista como parte do plano divino, e o bem-estar emocional é um dos frutos da comunhão com o divino. A "existência" de Deus não se limitaria ao cérebro, mas seria a fonte de onde tudo isso emana. 

Em suma, você levanta uma questão central sobre a origem e a natureza da crença. Uma interpretação sugere que a crença é uma construção humana poderosa e benéfica, mas sem uma base na realidade objetiva, enquanto outra interpretação, a dos crentes, vê essas mesmas manifestações como evidências de uma realidade divina que transcende a mente. 

Eu: Poderíamos pensar realmente que todos os valores religiosos, incluindo deus (es) são construções das mentes humanas em todas as épocas?  

IA: Sim, podemos. A perspectiva de que todos os valores religiosos e deuses são construções da mente humana é uma visão amplamente discutida e aceita em campos como a sociologia, antropologia e a psicologia da religião. 

Essa linha de pensamento sugere que, ao longo da história, os seres humanos criaram sistemas de crenças para diversas finalidades, como: 

- Dar sentido ao mundo: As religiões oferecem explicações para fenômenos naturais, a origem da vida, o sofrimento e a morte, preenchendo lacunas de conhecimento que a ciência, em sua época, não podia responder. 

- Estabelecer ordem social: Valores e leis morais, muitas vezes atribuídos a uma fonte divina, ajudam a organizar sociedades, promover a cooperação e manter a ordem. 

- Atender a necessidades psicológicas: A fé pode proporcionar conforto emocional, esperança, um senso de pertencimento e alívio de preocupações. A crença em um ser superior ou em uma vida após a morte pode ser uma forma de lidar com o medo da mortalidade. 

Nessa visão, a existência de milhares de religiões diferentes — cada uma com seu próprio panteão, regras e "verdades" — é vista não como a manifestação de diversas realidades divinas, mas como a prova da diversidade da criatividade humana ao longo de épocas e culturas. Cada deus seria um reflexo das esperanças, medos e valores da sociedade que o criou. 

É uma forma de entender a religião que não nega a sua importância ou o seu impacto real na vida das pessoas, mas reinterpreta sua origem. Em vez de uma revelação divina, a religião seria uma invenção humana que, por sua utilidade social e psicológica, se espalhou e se enraizou em todas as culturas do planeta.

quinta-feira, 27 de março de 2025

O valor religioso como um valor neural

Um adulto conta uma história a uma criança enferma sobre algo muito bom e poderoso curando outra criança com a mesma doença.

Ela cresce ouvindo falar desse "algo" em muitas situações, de pessoas a lugares, de pessoas próximas e até desconhecidas, na sua casa, na escola e até brincando com outras.
Muitos fatos positivos estão relacionados com esse "algo" em sua memória até que em um dia, naturalmente, por alguém ou algum fato, sentimentos se encontram com esse "algo".

Ela passa a gostar dele e não só isso: aprende a colocá-lo em sua própria vida, a buscar nele respostas a certos enigmas de sua existência, do mundo, das relações sociais, amorosas, etc.
Aprende ainda a falar com ele, pedir, orar para o bem, seja ao presente ou ao futuro.

O terá acessível em qualquer momento ou local, se sentirá ótima quando sempre com ele.
Na realidade, durante todo o tempo, e de até antes da história da cura, circuitos neurais se modificavam, novos dendritos se formavam, a neuroplasticidade tinha lugar em muitos sítios do seu cérebro.

Realmente solidificaram muitas informações com sentimentos e emoções nessa pessoa a ponto de ajudá-la em muitas situações. Formou-se um valor religioso dentre outros relacionados a esse "algo".

Você já percebeu que esse "algo" é Deus, o maior valor religioso do cristianismo, assim como existem outros valores de outras religiões e que são diferentes.

Na verdade, tudo isso não significa que eles existam realmente: são produtos da imaginação das pessoas via ensinamentos despertando sentimentos e emoções, tendo muita força quando evocados em orações e práticas religiosas. Por isso a existência de muitas religiões em todas as épocas e lugares do planeta.

De valores religiosos a valores neuronais ou neurais.
De valor religioso a valor neuronal ou neural.

terça-feira, 3 de dezembro de 2024

Sentimentos, homeostase, vida e cultura

Observação: este texto foi literalmente copiado, a menos da Introdução, de uma seção do primeiro capítulo do livro A estranha ordem das coisas: as origens biológicas dos sentimentos e da cultura, do neurocientista português naturalizado estadunidense António Damásio, páginas 34, 35, 36 e 37, de nome "Sobre a condição humana", na seção HOMEOSTASE, abaixo, em aspas, após a Introdução, feita por mim. 

Fiz assim porque Damásio descreve com absoluta precisão e resumo sobre a importância da homeostase na regulação e controle no funcionamento geral dos corpos dos seres vivos, indo dos primeiros unicelulares, passando pelos multicelulares, seres vivos sociáveis, nós, os humanos, até a criação das nossas culturas.  

As notas enumeradas em 11 e 12 estão deste modo pois pertencem a esta parte do primeiro capítulo, comigo reproduzindo fielmente o texto do livro, com a referência sendo, evidentemente, o livro de Damásio nas páginas citadas.  

 

Introdução

 

A homeostase ou homeostasia é a capacidade de um sistema ou subsistema em manter certas variáveis internas sob controle, dentro de faixas entre um mínimo e um máximo, a fim de não haver problemas de diversos tipos em regiões ou no todo dentro do sistema. Ela, então, mantém o ambiente interno estável, apesar das mudanças no ambiente externo. Isso é crucial para o funcionamento saudável dos sistemas, organismos vivos, etc. 

Um exemplo muito simples e comum é a regulação da temperatura corporal deixada por volta de 36,6 graus Celsius. Outro, mais abrangente, é o hemograma completo de alguém. São dezenas de íons, moléculas, substâncias, como a glicose, colesterol, triglicérides, ácido úrico, os eletrólitos sódio, potássio e cálcio, tratando da transmissão nervosa e contração muscular, etc. e a realização de funções como a manutenção do pH sanguíneo por volta de 7,4, importante em reações bioquímicas, etc. 

Mas a homeostase não se refere apenas aos ambientes internos dos seres vivos, e sim em sistemas formados por estes, ou seja, os sistemas sociais, de organismos que vivem em grupos e os nossos também. Exemplo: 

Família: A unidade básica de qualquer sociedade, responsável por educar e socializar os indivíduos desde a infância. 

Educação: As escolas e universidades que transmitem conhecimento e habilidades necessárias para o desenvolvimento pessoal e profissional. 

Economia: Os mercados e instituições financeiras que regulam a produção, distribuição e consumo de bens e serviços. 

Governo: As entidades que criam e implementam leis, políticas e regulamentos para manter a ordem e o bem-estar social. 

Saúde: Hospitais, clínicas e outros serviços que garantem o cuidado e a manutenção da saúde pública. 

Enfim, sem a homeostase, que a esta altura você já percebeu que se trata de regulação e controle, não há vida, sociedades, culturas, povos ou países. 

 

"HOMEOSTASE  

 

Como podemos conciliar a ideia - aparentemente razoável - de que sentimentos motivaram soluções culturais inteligentes para problemas trazidos pela condição humana com o fato de que bactérias desprovidas de mente apresentam comportamentos so­cialmente eficazes, cujos contornos prenunciam algumas respostas culturais humanas? Qual é a linha que une esses dois conjuntos de manifestações biológicas que são temporalmente separados por bilhões de anos de evolução? Acredito que o terreno comum e a linha podem ser encontrados na dinâmica da homeostase.  

Homeostase é o conjunto fundamental de operações no cer­ne da vida, desde seu início mais antigo — e há muito tempo desa­parecido nos primórdios da bioquímica — até o presente. É o imperativo poderoso, impensado, tácito, cujo cumprimento per­mite, a cada organismo vivo, pequeno ou grande, nada menos do que perdurar e prevalecer. A parte do imperativo homeostático que diz respeito a 'perdurar' é clara: ele permite a sobrevivência e é considerada indiscutível, sem nenhuma referência ou reverência específica quando se fala em evolução de qualquer organismo ou espécie. A parte da homeostase que diz respeito a 'prevalecer' é mais sutil e raramente reconhecida. Ela assegura que a vida é regu­lada não apenas em uma faixa compatível com a sobrevivência, mas também conducente à prosperidade, a uma projeção da vida no fu­turo de um organismo ou espécie.  

Os sentimentos são a própria revelação, a cada mente indivi­dual, da condição da vida no respectivo organismo, expressa ao longo de uma faixa que vai do positivo ao negativo. A homeostase deficiente expressa-se por sentimentos em grande medida negati­vos, enquanto sentimentos positivos expressam níveis apropri­ados de homeostase e ensejam aos organismos oportunidades vantajosas. Sentimentos e homeostase relacionam-se mutuamente em um grau acentuado e de um modo consistente. Sentimentos são as experiências subjetivas do estado da vida, isto é, da homeos­tase, em todas as criaturas dotadas de mente e de um ponto de vista consciente. Podemos dizer que os sentimentos são os repre­sentantes mentais da homeostase. ¹¹ 

Lamentei que eles tenham sido negligenciados na história natu­ral das culturas, mas a situação é ainda pior quando falamos em ho­meostase e vida, que se veem totalmente deixadas de lado. É bem verdade que Talcott Parsons, um dos mais renomados sociólogos do século XX, invocou a noção de homeostase em relação a sistemas so­ciais, porém, em suas mãos, o conceito não foi associado à vida ou a mecanismos. Parsons é um bom exemplo da negligência dos senti­mentos na concepção das culturas. Para ele, o cérebro foi o alicerce orgânico da cultura, por ser o 'órgão primário para controlar opera­ções complexas, notavelmente as de habilidades manuais, e coordena as informações visuais e auditivas'. Acima de tudo, o cérebro foi 'a base orgânica da  

capacidade de aprender e manipular símbolos'. ¹²  

A homeostase guiou, de modo não consciente e não delibera­do, seu desenho prévio, a seleção de estados de organismos biológicos capazes não só de manter a vida, mas também de promover a evolução de espécies encontradas nos diversos ra­mos da árvore evolucionária. Essa concepção, a que mais condiz com as evidências físicas, químicas e biológicas, é notavelmente diferente da concepção convencional e mais pobre de homeostase, que se limitava à regulação 'equilibrada' das operações da vida.  

A meu ver, o inelutável imperativo da homeostase é o gover­nador  

onipresente da vida em todos os seus aspectos. A homeosta­se vem sendo a base do valor na seleção natural, a qual, por sua vez, favorece os genes — e, consequentemente, os tipos de orga­nismos — que apresentam a homeostase mais inovadora e efi­ciente. O desenvolvimento do aparelho genético, que ajuda a re­gular a vida no nível ótimo e a transmiti-la aos descendentes, não é concebível sem a homeostase.  

Considerando o que foi dito, podemos propor uma hipótese de trabalho entre sentimentos e cultura. Os sentimentos, como representantes da homeostase, são os catalisadores das respostas que iniciaram as culturas humanas. Isso é plausível? É concebível que sentimentos possam ter motivado as invenções intelectuais que deram aos seres humanos (1) as artes, (2) a investigação filosófica, (3) as crenças religiosas, (4) as regras morais, (5) a justiça, (6) o sistema de governança política e as instituições econômicas, (7) a tecnologia, (oito) a ciência? Diria veemente que sim. Posso argumentar que as práticas ou os instrumentos culturais em cada uma dessas oito áreas necessitaram que fosse sentida uma situação real ou antevista de declínio homeostático (por exemplo, dor, sofrimento, grande carência, ameaça, perda) ou de possível benefício homeostático (algum resultado recompensador), e que sentimentos funcionaram como o motivo para explorar, usando os instrumentos do conhecimento e da razão, as possibilidades de reduzir uma necessidade ou de aproveitar a abundância denotada por estados recompensadores.  

Mas esse é apenas o começo da história. A consequência de uma resposta cultural bem-sucedida é o declínio ou o cancelamento do sentimento motivador, um processo que requer a monitoração de mudanças na situação homeostática. Por sua vez, a adoção das respostas intelectuais e sua inclusão em um corpus cultural - ou seu abandono - são um processo complexo que resulta de interações de vários grupos sociais no decorrer do tempo. Esse processo depende de numerosas características dos grupos, desde tamanho e história passada até localização geográfica e relações internas e externas de poder. Envolve etapas subsequentes nas esferas do intelecto e do sentimento - por exemplo, quando surgem conflitos culturais, entram em cena sentimentos negativos e positivos, que contribuem para resolver ou agravar os conflitos.  

O processo faz uso da seleção cultural."  

 

Notas  

 

11. Como já dissemos, a relação consistente entre sentimentos rompe-se durante sentimentos intensos. A tristeza extrema não necessariamente expressa uma deficiência extrema de homeostase básica, embora possa resultar nessa deficiência e até ser responsável pelo suicídio. A tristeza e a depressão circunstanciais expressam situações sociais desfavoráveis, e, em circunstâncias assim, sentimentos realmente atuam como indicadores de perigo iminente para a regulação homeostática.  

12. Talcott Parsons, "Evolutionary Universals in Society" (American  

Sociological Review, n. 3, pp. 339-57, 1964); "Social Systems and the  

Evolution of Action Theory", 1980 (Ethics, v. 90, n. 4, pp. 608-11,  

1980). As ideias de outros pensadores das ciências sociais - por  

exemplo, Pierre Bourdieu, Michel Foucault e Alain Touraine - são mais fáceis de traduzir para a minha perspectiva biológica.  

 

Referência  

 

DAMÁSIO, António Damásio. A Estranha Ordem das Coisas: As Origens Biológicas dos Sentimentos e da Cultura. 1. ed. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2018. p. 34-37.