Argos Arruda Pinto

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sábado, 31 de agosto de 2019

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Rápidas em Neurociência: a química da felicidade e do bem-estar

Muitos de vocês já conhecem esta imagem mas acho reveladora! Informativa com uma questão filosófica: onde estaria nossa alma neste contexto?

Apenas para iniciar uma conversa ou reflexão sobre o assunto, é até bíblico que a nossa alma é quem produz nossos sentimentos e emoções. Mas se todas essas substâncias interferem neles, em nossa felicidade, etc., a alma não estaria em um plano mais baixo? Mas ela fora criada por Deus e então não poderia ser rebaixada, ou, melhor dizendo, ser apenas uma coadjuvante neste contexto que digo.

Então como ficamos?

Se você quiser saber mais um pouco do que eu penso sobre o assunto e se aprofundar nessa reflexão, leia esse artigo meu de um blog, o qual foi muito lido: "O cérebro isento de alma". Link abaixo. Abraço a todos.

https://argosarrudapinto.blogspot.com/…/o-cerebro-isento-de…




Rápidas em Neurociência: a rede que nunca para a nosso favor

Neurônios pulsando, disparando, comunicando-se entre si e estimulando, além de redes lógicas para os nossos pensamentos, emissões de hormônios e neurotransmissores a produzirem nossos sentimentos e emoções, deixando nossas vidas mais ricas em se viver!



Rápidas em Neurociência: a verdadeira máquina da vida - o cérebro!

Belíssima imagem representativa do nosso cérebro funcionando ininterruptamente a manter muitas variáveis corporais sob controle, como a temperatura corporal, direcionando nossas ações e buscando outras, solucionando problemas lógicos de nossas vidas diárias, produzindo nossas emoções e sentimentos de acordo com as nossas experiências, tendo ideias, insights para resoluções oriundas de situações complexas em nossas vidas, pensamentos, imaginação e estímulos internos e externos! Ele está no comando sozinho, sem se valer de nenhuma fonte sobrenatural ou imaterial, como pensavam os antigos em épocas nada adiantadas em ciências e tecnologias...



Rápidas em Neurociência: nossa divindade o cérebro

Divindades? Divindade? Divino é este! Ele, nosso cérebro! Passe a não cuidar dele como você cuida do seu coração, estômago, rins, fígado, intestinos, pulmões, etc., e verá o que você pensa e sente alterados a não poder levar uma vida plena de bem-estar e felicidade. Pense nisto.




quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Sistemas e a origem da vida


Por Argos Arruda Pinto



ÍNDICE

(ainda sem numeração de página)


Introdução
1 - Ciência, filosofia e religião
2 - O que é a vida?
3 - Sistema
3.1 - Equilíbrio
3.2 - Equilíbrio de sistemas acoplados
3.3 - Propriedades emergentes
3.4 - Informação
3.4 - Retroação e cibernética
3.5 - Nível Funcional Sistêmico
4 - Estatística
5 – Astronomia e Astrofísica
5.1 - A importância dessas ciências
5.2 - O início
5.3 - Galáxias e estrelas
5.4 - Corpos excêntricos
5.5 - Expulsão
6 - A matéria primeva
7 - Os compostos orgânicos
8 - A vida


              Introdução 


     Este é um livro onde pretendo apresentar ao leitor os aspectos científicos mais importantes que levaram a matéria a se organizar e a constituir os seres vivos em nosso planeta. É necessário que o leitor possua uma formação de no mínimo de segundo grau pois muitos conceitos apresentados aqui requerem um conhecimento prévio de alguns tópicos de ciências como Biologia, Física, Matemática e Química.
      
       Para a Ciência os organismos vivos são máquinas de características singulares, máquinas naturais, com propriedades que em muito se diferem daquelas produzidas pelos homens. Diferentes em complexidade, funcionalismo e tratamento da informação. A origem da vida não fora um fato isolado no qual bastaria apenas um ramo ou um tópico de uma de nossas ciências para explicá-la. Ela em si é um resultado de fenômenos físico-químicos hipercomplexos e por isto deve-se reunir pelo menos alguns tópicos importantes de várias ciências para explicar como a sua origem tivera efeito. Detalhes de estruturas físicas e químicas, controle de funções, adaptação, envolvem o entrelaçamento de diversos ramos do conhecimento científico a fim de se chegar a não uma, mas a várias respostas que no seu conjunto explicam o surgimento da vida na Terra. Sim, a resposta final envolve um conjunto de fatos que ao meu ver sempre foram tratados individualmente. No máximo alguns deles, mas insuficientes, foram reunidos na tentativa de se resolver o problema, em obras incompletas quanto às principais linhas de pesquisa necessárias para tamanho empreendimento.

Esse entrelaçamento de informações é comum nas disciplinas atuais. A condução de impulsos elétricos em nossos nervos, na visão microscópica do fenômeno, vem de estudos da Física relacionados com as estruturas dos tecidos que o realizam. Se você quiser saber porque certos peixes são luminescentes, faz-se necessário entender a física quântica envolvida nas reações químicas no interior destes pequenos animais marítimos. Em algumas universidades já existem trabalhos e pesquisas interdisciplinares tomando forma como novos ramos da Ciência. A Biofísica é um exemplo, sendo já há décadas uma matéria dos cursos universitários. Os modelos matemáticos baseados no funcionamento dos neurônios do cérebro, as redes neurais, aonde se tem aplicações práticas desde a Engenharia até a Medicina, constituem um verdadeiro avanço de técnicas computacionais envolvendo diversas áreas. A verdade é que só uma Ciência não é suficiente, às vezes, para se analisar e compreender um fenômeno natural.

Só com o desenvolvimento da Ciência e da Tecnologia, principalmente nos últimos cem anos, e mesmo assim dependendo de descobertas e teorias bem antigas, é que foi possível ao homem chegar ao século vinte e estudar com propriedade o assunto da origem da vida.

Primeiro vou introduzir alguns conceitos sobre como é definida, tratando dos problemas envolvidos nesta definição. Depois focalizarei algumas noções sobre a Teoria dos Sistemas. Qualquer ser vivo, inclusive nós, é um sistema. Não é coincidência quando, ao referir-mos sobre o nosso aparelho circulatório, podemos colocar a palavra sistema no lugar de aparelho. Mas, será algum demérito ou desvalorização para o ser humano considerá-lo como um sistema? Devido ao cérebro que possui o homem é o sistema mais complexo do universo e carrega consigo aquelas características encantadoras como o conjunto dos sentimentos, inteligência e consciência que o fazem uma criatura especial diante de todo o resto das espécies de seres do planeta. Sistema é apenas o modo como a Ciência considera o conjunto de partes dos objetos, animados ou não, detentores de propriedades das quais a matéria é o suporte básico, e por isto não devemos nos preocupar com este enfoque científico do qual fazemos parte.

A partir de mecanismos compreendidos pela Teoria dos Sistemas e com a ajuda da Estatística poderemos ter uma noção de como havia tempo e condições para a natureza lentamente executar seus "planos", com base nas leis da Física e da Química, e fazer com que a vida aparecesse em todo o seu esplendor e abundância na Terra. A Estatística quase nunca é citada nesses assuntos mas a sua presença em um livro deste se torna fundamental e, portanto, alguns de seus conceitos serão muito úteis para nós. Por fim, a Astrofísica, um ramo da Física que estuda os fenômenos físicos dos corpos estelares, nos ensina como surgiram os átomos e moléculas que determinaram o aparecimento de compostos de carbono como os aminoácidos e as proteínas, os principais componentes materiais dos seres vivos. Estudar a origem da vida é também tentar compreender como surgiram as bases, os alicerces materiais de sua estrutura.






1 – Ciência, Filosofia e Religião






A questão da origem da vida na Terra é um dos maiores mistérios da Ciência que o homem enfrentou em toda a sua história. Mais ainda, envolveu a Filosofia e a Religião, na qual esta última apoiou-se em crenças onde um ou mais entes divinos interferiram, diretamente ou não em nosso planeta e fizeram com que a vida surgisse com propósitos talvez inquestionáveis. Esta é uma visão muito comum para as pessoas pois o ser humano é dotado de um forte sentimento de religiosidade. Certamente, nas dezenas de milhares de seitas ou religiões criadas pelo homem na sua história existem dogmas estabelecendo como não só a vida mas também como o nosso universo surgiu.

No cristianismo, precisamente no Gênese do Antigo Testamento da Bíblia Sagrada, Deus cria o céu e a Terra significando o surgimento de todos os elementos materiais de nosso universo, ele próprio, evidentemente. Depois cria os seres vivos tendo o homem como Sua “obra” principal, que haveria de predominar sobre todos os outros seres, aquáticos, aéreos e terrestres. No hinduísmo a entidade divina Brahma, surgido do deus Vishinu, é o criador de vários mundos sendo o nosso apenas um dentre tantos. De Brahma aparecem todas as coisas, animadas ou não, a matéria e a vida. Apesar de algumas similaridades sobre a Criação, essas duas religiões, as que possuem o maior número de adeptos em todo o mundo, são incompatíveis entre si na medida em que uma é monoteísta e a outra não, sendo isto considerado como uma grande diferença para qualquer conjunto de correntes religiosas.

Não entrarei em maiores detalhes sobre o assunto mas daí dá para se perceber como existe uma imensa relatividade no tocante a conceitos e princípios no que diz respeito aos temas ligados à criação do mundo vivo e do inanimado. Essa relatividade, essa diferença entre as religiões pode ser compreendida porque elas se apoiam basicamente nas “verdades reveladas”, aonde estas não necessitam de comprovações pois são objetos do lado emocional ou espiritual de quem as concebe, e, também, da aceitação ou não por parte das pessoas através das suas crenças e da fé que possuem.

Seria uma atitude correta se perguntássemos qual dos dois, cristianismo ou hinduísmo, estariam com a razão sobre o aparecimento da vida e do Universo? E comparadas com aquela singela crença indígena na qual o Sol teve como filhas a Lua e a Terra para com isso criar tudo o que existe na natureza, inclusive as florestas que tantas dádivas forneciam aos seus habitantes? Tribos permaneceram milênios, transmitindo de pai para filho ensinamentos baseados nessas crenças, sem sequer tomar contato, com qualquer parte de textos sagrados conhecidos por nós, e defenderam até com as suas vidas esses valores que um dia a nossa história iria registrar como apenas mais uma forma de crença. Seria até ridículo falar em tribos indígenas enquanto o hinduísmo e o cristianismo somam juntas quase dois bilhões de seguidores em todo o mundo? Não. A fé de um simples nativo pode ser tão grande quanto a de um grande sacerdote de qualquer igreja.

Na verdade, análises de quem está com a razão para assuntos deste tipo não merecem maiores preocupações porque não cabe dizer quem está certo ou não quando o assunto envolve nossos sentimentos, nossa capacidade de sentir o mundo de maneira muitas vezes diferente de outros povos ou pessoas. O homem de qualquer ponto do planeta tem sim uma bagagem em sua formação cultural e religiosa agindo e moldando a sua personalidade desde quando criança. Todos são doutrinados a aceitar uma ou outra corrente religiosa, geralmente aquela predominante em seu ambiente social.

A visão da Ciência, seus métodos de trabalho, por outro lado, não se deixa influenciar pelos nossos sentimentos. Ela é assim, sua natureza é assim. Seu método, o método científico, consiste em observar a natureza e, ao se deparar com um problema, reunir informações sobre o assunto, formular hipóteses para tentar resolvê-lo e, por último, realizar experiências na tentativa de verificar se as hipóteses estavam corretas. Daí se tiram conclusões as quais poderão levar a alguma teoria. Pode-se ver que a Ciência se apoia fundamentalmente na razão, ao contrário dos sentimentos, das crenças, nos quais se apoiam as religiões.

Temos então duas coisas totalmente opostas, separando a Ciência da Religião, já no princípio de qualquer discussão entre elas: a razão e os sentimentos, determinando entre outras coisas uma acirrada disputa pelas "verdades" acerca de nosso universo. E, apesar de muitas tentativas no sentido de aproximar uma da outra, ainda o homem se sente dividido quando o assunto envolve a Criação. Para muitos algo de divino necessariamente interveio em nosso planeta para que a vida pudesse aflorar em sua esplendorosa variedade de formas, comportamentos, cores e funções. Esta concepção é a chamada Teoria da Criação Especial e seus adeptos são os criacionistas. Para eles a vida surgiu diretamente através do Criador ou em etapas, uma para cada nova espécie no planeta.

A Ciência não pode se valer de entes sobrenaturais, criadores de espécies vivas. Ela tem que procurar elementos na natureza e estudá-los a fundo até chegar a alguma conclusão sobre o problema. Isto choca aqueles devotados à Teoria da Criação Especial, pois acham uma intromissão da Ciência em assuntos já resolvidos por eles e também uma prepotência ao tentar os cientistas em dizer a verdade sobre a Criação utilizando métodos racionais.

Na realidade, vivemos entre dois mundos em nossa mente que talvez nunca serão compatíveis: o emocional e o racional. Uma limitação de nosso cérebro de onde vêm conflitos muitas vezes insolúveis e ridículas indagações acerca da Criação. Perguntar qual o propósito da existência de tudo que vemos em nosso universo ou o porquê de um deus criar formas de vida é misturar essas duas faces de nossa natureza. Veja o significado da palavra "porque". Ela é usada em nosso modo racional de procurar entender as coisas, mas para as nossas concepções religiosas devemos sim voltarmos aos nossos sentimentos. É aí que reside o problema de se fazer uma pergunta errada no lugar errado. O problema então seria ao que devemos dar mais importância e isso fica para os nossos valores e para a consciência de cada um.

Mas, a intenção deste livro é conduzir o leitor aos fatos descobertos pela Ciência e que elucidaram as questões fundamentais a respeito da origem da vida.

Há muito se descobriu o que os cientistas batizaram de Big Bang ou a grande explosão, onde se teve início o nosso universo tal como o conhecemos hoje. Irei analisar cuidadosamente este fenômeno mais adiante; por ora quero ressaltar que a Ciência já consegue, com base nas leis da Física, da Química e da Biologia explicar como “se produziu" a vida no planeta após o Big Bang, não se necessitando com isso nenhuma intervenção divina direta. Antes do Big Bang, e não admitindo a existência de outros anteriores como pensam alguns cientistas, podemos falar em interferência divina pois a questão de onde veio a matéria e a energia de nosso universo pode ser algo realmente incognoscível.

Vale citar uma passagem do físico britânico Stephen Hawking com o papa João Paulo II em 1981. Em uma audiência no Vaticano após uma conferência sobre cosmologia organizada pelos jesuítas, Hawking, em seu livro “Uma Breve História do Tempo”, relata que o grande chefe da Igreja Católica fez uma observação na qual os cientistas poderiam estudar o universo após a grande explosão, mas o momento em si deste evento colossal fora a criação, obra de Deus e portanto não questionável. O próprio papa admitiu o Big Bang em uma compreensão pelo menos admirável e digna de registro em se tratando do maior líder católico.

A Ciência coloca que após a grande explosão não fora necessário a presença de algo sobrenatural agindo no sentido de criar as formas de vida às quais conhecemos e como muitas pessoas pensam que fora desse modo. Em minha opinião estritamente particular e sem querer me aprofundar no assunto, Deus foi o responsável pela criação da matéria e da energia, antes ou não da grande explosão, sabendo de tudo que ocorreria até hoje. Estou me referindo ao cristianismo, à Bíblia, e não tentarei conciliar o fato do Big Bang com outra religião embora isto até seja possível. O importante é tocar no ponto onde se tem o principal foco de discórdia, de modo geral, entre a Ciência e a Religião com respeito à Criação: a presença divina seria indispensável para diretamente colocar a vida em nossa Terra após a presença da matéria em nosso universo. Pode não ser desta maneira, de modo direto.

A Ciência caminhou lentamente durante milênios para chegar ao século vinte e explicar com suas teorias e fatos como se originou a vida na Terra e, essa origem é, como veremos, um fenômeno natural passível de ser entendido com base na razão. E os cientistas podem até descobrir muitas coisas sobre possíveis fatos ocorridos antes do Big Bang mas a noção de que um ser supremo estaria por detrás dele não seria abalada. Para a crença não há limites. Assim, o senso comum das pessoas sempre se voltou para, sem elas saberem, às origens da vida após o Big Bang com a presença do Criador.

De outra maneira a encarar as questões deste livro, sendo agora a linha principal de minha argumentação, exalto a capacidade do ser humano de pensar sobre o que quiser, como quiser, se libertando de quaisquer estruturas já consagradas ou criando para si e seus entes próximos novas maneiras de encarar seu universo, seu mundo. Tanto isso é verdade que se criou uma disciplina completa, a Filosofia, como aquela responsável pela busca das verdades através da razão e da argumentação. A própria Ciência veio desta liberdade e independência do pensar sobre o universo; para ela criaram métodos particulares, é verdade, mas a sua estrutura se baseia no pensamento puro, na maneira objetiva e matemática de se trabalhar sem influência de sentimentos e emoções. E veremos que as idéias a respeito das origens dos seres começaram em épocas nas quais não se tinha uma Ciência e uma Tecnologia avançada como hoje. Começou com o único recurso que os homens possuíam: o pensar.

A Filosofia estuda os métodos utilizados por quaisquer outras disciplinas, suas teorias, etc., tentando chegar às verdades de nossa realidade existencial e de nosso universo, abrangendo o estudo da razão, do pensar, tendo a capacidade de voltar-se aos próprios elementos dos quais se vale para entender o mundo que nos rodeia. Esta volta a si mesma, às suas estruturas, a qual pode questionar seus próprios métodos de trabalho, mostra o potencial da mente humana como algo possível de refletir sobre tudo e da maneira como bem entender, o que neste caso nada mais é do que as atividades de nossa consciência. Refletimos sobre nós mesmos e tentamos mudar nossa maneira de agir e pensar, de ser e estar, em um contínuo fluxo de aprimoramentos aos quais se dera o nome de amadurecimento.

Pois sim, a Filosofia pode abranger quaisquer pontos onde o principal objeto seja o conhecimento, a compreensão de qualquer coisa, seja viva, inanimada, etérea ou sobrenatural. Seu próprio nome deriva do grego “gostar da sabedoria”. O filosofo grego Aristóteles, trezentos anos antes de Cristo, dizia que a Filosofia era "a Ciência das causas primeiras de todas as coisas". Ela consegue se postar diante da Religião e da Ciência com ou sem comprometimento se as verdades de cada uma sejam, para quem observa, absolutas ou não. Analisa a Religião do ponto de vista da existência de Deus; é a Teologia. Estuda e discute a existência ou não de Deus baseando-se nas Revelações dos Livros Sagrados: a Bíblia, os Vedas do hinduísmo, o Alcorão do islamismo de Maomé, o Torah do judaísmo, etc. É a Teodicéia. Com a Ciência ela estuda, questiona os seus métodos, está por detrás de seus conceitos mais avançados ou mais simples, antecipa certas descobertas ao se refletir sobre o que existe e o que pode existir a partir daí; é a dedução, estudada na Lógica, outra de suas divisões. E a partir de um conceito singular pode estabelecer regras ou proposições mais gerais; é a indução, o contrário da dedução. Suas divisões são várias e não entrarei em detalhes aqui; basta saber, já de imediato, que foi com a Filosofia que todas as ciências tiveram origem, sendo talvez a Astronomia uma das primeiras, aparecendo na Grécia antes de Cristo .

Assim, nota-se que o homem sempre buscou conhecer as verdades a respeito do conhecimento muito antes de aprimorar a tecnologia tanto necessária hoje em dia para se chegar a descobrir o que só é possível através dela. Ele começou a usar desde o princípio a única ferramenta que dispunha: o seu pensar. E não fora diferente com respeito às origens da vida. Mesmo antes de Cristo, praticamente seiscentos anos antes de seu nascimento, os filósofos jônicos da Grécia antiga, sem nenhum conhecimento de biologia ou bioquímica diziam que o sol, o calor e o ar eram os agentes onde no lodo do mar a vida teria surgido. Alguma coisa isso tinha de verdade... Séculos depois, Aristóteles, com toda a sua autoridade em filosofia, já afirmava que os organismos vivos poderiam surgir da matéria inerte. Muitos adotavam essa linha de raciocínio mas introduziam conceitos divinos, principalmente na Idade Média para não se chocarem com os dogmas rígidos da Igreja onde não se permitia, e isso até hoje, falar em vida mencionando somente as leis naturais.

Nessas épocas aonde não se tinha como estudar as origens dos seres com conhecimento e instrumentos adequados, figurou durante muitos séculos a Teoria da Geração Espontânea ou a Abiogênese, segundo a qual mesmo animais como mamíferos e aves surgiam espontaneamente da matéria bruta. Verdadeiros delírios se configuravam nas mentes das pessoas que acreditavam até em pássaros aquáticos surgindo no fundo de lagoas, árvores dando origem a pássaros, ratos nascendo de restos de roupas e comida. Mesmo assim alguns homens, realizando experiências simples, tentavam provar o absurdo desta teoria.

O médico italiano Francesco Redi, no século XVII, fechou com gaze um vidro contendo carne demonstrando serem os ovos das moscas as responsáveis pelas larvas que tanto apareciam nas carnes em putrefação. Mas, no mesmo século, logo após a invenção do microscópio, o holandês Anton van Leeuwenhoek descobriu alguns microorganismos presentes na matéria orgânica e muitos argumentaram serem esses pequenos seres vivos oriundos de forma espontânea como na Abiogênese. E se eles surgiram espontaneamente, nada impediria que outros mais desenvolvidos poderiam ter a mesma origem. As conclusões das experiências de Redi ficaram desacreditadas mas um padre italiano, Lazzaro Spallanzani, um século depois, argumentou que mesmo esses microorganismos eram provenientes de outros através de simples reprodução e não de aparição direta da matéria bruta. Ele submeteu diversas infusões com microorganismos ao processo de esterilização e mostrou que nenhum micróbio novo aparecia nesses experimentos. Mesmo assim os adeptos da Abiogênese se defenderam, principalmente o biólogo francês Buffon e o clérigo escocês Needham, alegando a destruição de um princípio ativo quando da esterilização. Esse princípio ativo seria uma espécie de força vital a qual ativava a matéria e surgia daí uma nova teoria conhecida como Teoria da Força Vital.

Essas polêmicas se havia ou não uma força criadora por detrás da matéria inanimada, a Teoria da Geração Espontânea, a Teoria da Força Vital, levou a Academia Francesa de Ciência, em 1860, a oferecer um prêmio a quem resolvesse o assunto esclarecendo o que, afinal, ocorria com a matéria nessa estranha propriedade de promover repentinamente o aparecimento de seres vivos.

O químico francês Luis Pasteur, no século XIV, foi quem havia demonstrado que a fermentação é causada pela ação de microorganismos; sua linha de pesquisa fazia dele o homem certo para receber o prêmio e, assim, se empenhou neste trabalho primeiro provando a existência de microorganismos no ar. Isto já seria, provavelmente, um indício de que esses micróbios impregnariam qualquer porção de matéria orgânica em decomposição como nas experiências de Leeuwenhoek. Pasteur verificou que substâncias orgânicas após serem fervidas continuavam capazes de abrigar muitos microorganismos provando ser a força vital, se realmente existisse, uma propriedade não afetada pelo calor. Em primeiro momento esta descoberta parecia corroborar com a Abiogênese mas, com um final digno de um grande pesquisador, ele mostrou que se mantivesse condições apropriadas para não se contaminar uma solução previamente esterilizada e devidamente acondicionada, não apareceria nenhum tipo de organismo vivo em seu interior. O processo utilizado por ele fora o aquecimento e depois o resfriamento de caldo de carne com extratos de frutas e que passou a se chamar pasteurização pois conserva os alimentos por um longo período de tempo. Foi um golpe definitivo na Teoria da Geração Espontânea pois ficou demonstrado a incapacidade da matéria bruta gerar a vida de uma hora para outra. As pesquisas de Pasteur levaram-no a ganhar o prêmio em 1862 e, se um passo fora dado ao esclarecer a não validade da Geração Expontânea, por outro lado deixou em aberto as questões acerca das origens da vida.

Três anos antes, o cientista inglês Charles Darwin publicava "A Origem das Espécies", um marco na Biologia e uma das obras mais importantes da história da Ciência. Ele estabelecia a Teoria da Evolução, através da qual os seres vivos mais adaptados ao seu meio ambiente sobrevivem às mudanças desse meio e passam suas características "adaptativas" principais aos seus descendentes. Estes então prosseguem se multiplicando e gerando uma nova espécie àquele novo meio ambiente. Os menos favorecidos, menos adaptados, são fadados a desaparecerem neste processo chamado por Darwin de seleção natural.

A Teoria da Evolução veio como uma resposta de como a vida se transforma continuamente se concebendo novas espécies. Darwin tratou da evolução em um ponto de vista macroscópico e não de sua origem em si, a microevolução, falando de espécies de animais e plantas, inclusive o homem, que para ele descendia de parentes dos símios. Fora ridicularizado e até hoje sua teoria é, no mínimo, mal interpretada e mal ensinada.

O século vinte se aproximava e com ele todo o avanço da tecnologia que gerou os conhecimentos necessários para a microevolução ser compreendida.






2 - O que é a vida?






Esta é uma pergunta onde muita gente se embaraça ao tentar respondê-la. Fácil é pensar em algumas plantas, em animais como um cão ou um elefante e, mesmo em nós. Ao ver uma estrutura que se locomove por si só, não necessitando de qualquer coisa para ajudar, pensamos logo em ser um organismo vivo. Mas a maioria das plantas não se locomovem; daí apelamos para a sua estrutura, formato, se possui folhas ou caule, etc. Sempre tomamos como referencial alguma característica a qual os seres vivos, em geral, possui. O movimento é uma delas, mas existem alguns parâmetros principais que no seu conjunto podem indicar se um ser é vivo ou não e a organização é um deles. Tanto isso é verdade que ao vermos uma bactéria ao microscópio ou em uma fotografia logo reconhecemos como algo diferente dos seres inanimados. A forma, os detalhes da estrutura, tudo é mais complexo e diferente. Outra característica fundamental dos seres vivos é a capacidade de permitir a entrada de substâncias em seu interior e expulsar aquelas as quais são o resultado do processo que fornece energia e matéria para continuarem vivos. É o metabolismo. Estamos falando da respiração, com a devida expulsão de gás carbônico e retenção do oxigênio, e da digestão, onde se ingere diversas substâncias químicas para se obter aquelas necessárias ao organismo. A reprodução é outra característica marcante da substância viva. Se partimos da respiração, digestão, reprodução e excreção temos uma boa chance de acertarmos se algo é vivo ou não. Poderíamos falar ainda em adaptabilidade, evolução, sensibilidade, etc., mas classicamente essas quatro funções são suficientes para nós embora exista alguma arbitrariedade nesta definição quando um organismo apresenta um número menor delas.

O caso mais comum para exemplificação são os vírus. Causadores de cerca de 60% das doenças infecciosas no homem como a gripe, o sarampo, o herpes, a AIDS, etc., eles são compostos de uma capa ou envoltório, o capsídio, encerrando uma molécula de DNA(ácido desoxirribonucleico), a fantástica molécula detentora de todas as informações para a "construção" de um novo ser vivo, ou o RNA(ácido ribonucleico), a molécula sintetizadora de substâncias na célula, mas nunca ambos. Esse envoltório é constituído de proteínas e em alguns deles ainda existe uma membrana de proteína e gordura como uma segunda capa englobando todo o corpo viral. Eles se reproduzem mas não se alimentam, não respiram e nem excretam; ao penetrar em uma célula eles se dirigem ao DNA e fazem com que este material genético realize diversas cópias idênticas de si para se reproduzirem. Reside aí o seu potencial patológico nefasto pois a célula será destruída e o tecido ao qual pertence estará comprometido e por isto são extremamente dependentes das células às quais invadem pois sem elas não haveria chances de reprodução. Pela sua simplicidade organizacional e funcional, pois só se reproduz, o vírus não é considerado um ser vivo situando-se talvez entre os seres inanimados e animados: um conjunto de moléculas capazes de fabricar cópias de si mesmo. Outro exemplo é o micoplasma. Considerado um dos menores seres vivos conhecidos, é muito primitivo e não possui núcleo. É o causador da pleuropneumonia, sendo constituído de uma membrana limitante contendo proteínas, ribossomos e ácidos nucléicos - DNA e RNA. Como os vírus, precisam do material genético de outras células para reproduzirem comprometendo o perfeito funcionamento destas hospedeiras às quais servem apenas de um meio para sua reprodução, mas retiram do meio ambiente certos materiais necessários ao seu metabolismo, sua “alimentação”. Eles são bem mais complexos que os vírus possuindo a capacidade de digerir alimentos, excretar e reproduzir-se e seu metabolismo é limitado à digestão. Essa complexidade já é suficiente para os cientistas considerá-lo como ser vivo mesmo com o seu metabolismo limitado à digestão.

Já as células entram na definição de seres vivos do parágrafo anterior. Foram descobertas em 1667 pelo inglês Robert Hooke quando examinou amostras de cortiça ao microscópio. É a menor unidade viva dos seres vivos; a unidade básica. O primeiro ser vivo a surgir no planeta foi, com certeza, algo muito parecido com esta pequenina e eficiente máquina vital. De dimensões variadas, cerca de dois milésimos de milímetros para células do tecido humano, passando pela polpa da laranja e do limão onde atingem cinco milímetros, até a gema de um ovo de avestruz do tamanho de uma maçã, elas se dividem em procariotas e eucariotas. As primeiras, representadas pelas bactérias e algas verde-azuladas, são aquelas desprovidas de estruturas internas, as organelas, comuns às eucariotas como as mitocôndrias, lisossomos, complexo de golgi, cloroplastos, etc. Pela sua simplicidade estrutural as procariotas foram provavelmente os primeiros seres vivos a surgir na Terra. Algas verde-azuladas aparecem como fósseis em rochas de três bilhões de anos atrás e durante outros dois bilhões de anos permaneceram como os indivíduos mais complexos a povoar nosso planeta. Existem seres vivos os quais são constituídos de uma só célula, sendo esta então o próprio organismo vivo auto-suficiente, possuindo vida independente. São os chamados organismos unicelulares. Exemplos são a ameba, a euglena e o paramécio. Seres pluricelulares aparecem de diversos tamanhos, indo desde um pequeno inseto a uma baleia azul de vinte e cinco metros de comprimento.

De formas diferenciadas, as células podem se apresentar esféricas, em forma de bastão, retangulares, espirais, etc., onde suas posições no ambiente na qual vivem também variam. Umas se movem dentro de seus “habitats” para realizarem suas funções: as hemácias do sangue transportam e suprem de oxigênio os corpos dos animais superiores como mamíferos, aves, etc. Ainda existem aquelas onde vivem presas aos tecidos aos quais realizam funções específicas: as células dos órgãos dos animais, das folhas das plantas, caules, etc. Mais complexa em funcionamento que muitas indústrias nas quais temos conhecimento, ela produz substâncias específicas para o tecido e, consequentemente, ao órgão ao qual está inserida. O estômago produz diversas substâncias como a pepsina a literalmente quebrar moléculas proteicas para nossa digestão.

Uma célula eucariota de um animal ou vegetal é composta basicamente de três partes: membrana, citoplasma e núcleo. A membrana, além de não permitir a dissociação dos elementos e substâncias da célula para o meio circundante, atua como um importante meio regulador de entrada e saída de materiais úteis indispensáveis à vida da célula. É um órgão seletivo. O citoplasma contém diversas estruturas como as mitocôndrias, a substância de Golgi, o retículo endoplasmático, os lisosomos e os ribossomos. As mitocôndrias, em forma de salsichas alongadas e de tamanhos da ordem de três milésimos de milímetro, são os elementos do processo tão comum que é a respiração, onde se consome oxigênio para a produção de energia. Sim, quando respiramos são elas quem trabalham incessantemente nesta função indispensável às nossas vidas. Ao mover, por exemplo, qualquer músculo de seu corpo, elas é quem primeiro realizaram o papel principal deste ato ao quebrar as móleculas de ATP, abreviatura de trifosfato de adenosina, as quais liberam energia ao reagirem com uma enzima específica para esse trabalho. Na verdade, substâncias orgânicas energéticas como a glicose são primeiramente decompostas em regiões específicas das mitocôndrias, chamadas de câmaras centrais ou internas, e transformadas em ATP, às quais serão utilizadas posteriormente. Essas usinas energéticas deixam longe, em falando de conversão de matéria consumida em energia, qualquer máquina construída pelo homem. Seu rendimento é de quase cinqüenta por cento enquanto uma locomotiva não chega a dez por cento. Presente em todas as células, exceto nas algas azuis e nas bactérias, as mitocôndrias, segundo uma recente teoria, eram seres bacterianos simbióticos os quais penetraram em células comuns e passaram a viver em cooperação mútua, onde, naturalmente ambos, simbionte e anfitrião, obtiveram vantagens desta relação. Elas não têm posição específica ou regular nas células, com algumas exceções, e por isso acham-se submersas e livres dentro do citoplasma celular com seu número variando de milhares a dezenas de milhares de indivíduos. Possuem duas membranas seletivas, semipermeáveis, uma interna, já mencionada, demarcando uma região chamada de câmara interna ou central e outra externa também delimitando uma câmara, cada qual realizando suas próprias funções. A externa conduzindo enzimas para dentro e a interna, como vimos, decompondo material energético. Os lisossomos são estruturas na forma de vesículas contendo poderosas enzimas que atuam na digestão em células animais, decompondo grandes moléculas de proteínas e de lipídios e destruindo corpos estranhos à célula. O complexo de Golgi é uma espécie de recipiente no formato de discos achatados e lisos onde as proteínas são armazenadas para posterior secreção. O retículo endoplasmático é um sistema de pequenos canais de forma chata e alongada para transporte de substâncias no interior celular. Os ribossomos são os elementos onde são sintetizadas as proteínas. De formato granuloso ou esférico, muitos estão presos ao retículo endoplasmático e outros flutuam livremente dentro do citoplasma. São constituídos de proteínas e RNA - ácido ribonucléico e chegam a ser centenas de vezes menores que uma célula, sendo visíveis apenas ao microscópio eletrônico, mas seu número pode atingir de milhares a dezenas de milhares. Por fim, os cloroplastos das células vegetais, que são pequenos glóbulos onde as moléculas de clorofila captam a luz solar para converterem bióxido de carbono e água em açúcar e oxigênio na famosa reação química das plantas, a fotossíntese.

O núcleo é o local onde se encerra o material genético, o DNA, o qual, além de transmitir as características físico-químico dos genitores aos descendentes, atua como um gerenciador na produção de substâncias essenciais à vida da célula e ao tecido do qual é parte. Foi o bioquímico americano James D. Watson e o bioquímico inglês H. C. Crick, os responsáveis em 1953 pela descoberta do formato espiral da molécula de DNA e de seu papel transmissor de caracteres genéticos. Constituída de açúcares, fosfatos e de quatro bases nitrogenadas, adenina, timina, citosina e guanina, ela simplesmente encerra em si todas as informações sobre como será fisicamente o novo indivíduo a nascer. Sua cor da pele, olhos, cabelo, etc., e toda a sua estrutura interna detalhadamente, desde a composição química de uma célula do intestino até a disposição espacial dos órgãos como coração, fígado, pulmões, etc. Nos animais superiores como nós o DNA determina parte da personalidade, caráter e outras características comportamentais. É por isto que muito do nosso jeito de ser, não totalmente é claro, se parece com nossos pais e talvez quase a metade de nós já estaria programada antes de nascermos. A outra porção viria das influências do meio ambiente no qual vivemos. Ele então comporta a “planta” estrutural e funcional dos seres vivos. Suas bases nitrogenadas ligam-se umas às outras de forma peculiar: adenina somente a timina e citosina apenas a guanina. Formam uma seqüência de pares unidos e sustentados nas extremidades pelos fosfatos e açúcares como degraus ligados aos corrimões de uma escada. Uma escada emaranhada dentro do núcleo celular. Essa seqüência é o código no qual as informações são “guardadas” para a construção de um novo indivíduo e sua quantidade varia de espécime para outro. Um vírus contém cerca de 150.000 e tudo indica que a complexidade do ser vivo e o tamanho da própria molécula de DNA estão relacionados. Assim, uma bactéria, com sete milhões de degraus possui um DNA, se pudéssemos estirá-lo, de cerca de seis centésimos de milímetro; uma estrela-do-mar trinta centímetros; um pássaro sessenta centímetros e o homem de mais ou menos um metro e cinqüenta centímetros, contendo por volta de seis bilhões de degraus.

A seqüência das bases nitrogenadas do DNA é dividida em grupos denominados de genes, sendo os responsáveis pelas características biológicas e funcionais dos seres vivos. Eles formam os cromossomos os quais no ser humano são em número de quarenta e seis. Cada gene é posto a trabalhar para determinadas situações; a hemofilia, doença caracterizada pela incapacidade do sangue das pessoas fabricarem coagulantes suficientes para a cicatrização de ferimentos, aparece nos indivíduos que não possuem o gene específico para isso. Quando disse no parágrafo anterior em cor de pele, olhos, etc., me referia aos genes determinantes dessas características. Trabalhar com eles resultou em uma nova Ciência, a Engenharia Genética, a mais polêmica disciplina criada pelo homem do ponto de vista da moral e da ética porque, se de um lado ela nos ajuda a curar ou prevenir doenças hereditárias, fabricar substâncias só possíveis pela manipulação de genes, por outro mexe em questões de difícil aceitação como a clonagem de seres humanos ou programação, ainda que pequena, de caracteres em bebês recém nascidos

Os genes organizam a síntese de proteínas no interior da célula a partir da molécula de DNA do núcleo e de moléculas de RNA que se dividem em RNA ribossômico, mensageiro e transportador. O primeiro entra na composição do ribossomo, o mensageiro é o responsável pela codificação da planta estrutural da proteína a ser produzida e é fabricado pelo DNA no núcleo e o RNA transportador é aquele onde os aminoácidos são levados aos ribossomos para se agregarem na forma que o mensageiro especificar. A fabricação de uma proteína é uma verdadeira ação automática como em uma linha de montagem industrial na qual as peças vão se encaixando uma por uma. O RNA transportador carrega consigo aminoácidos que se encaixam ou se ligam ao mensageiro e, sendo este uma cópia de parte do DNA, um gene, ao final da tarefa uma proteína idêntica a este gene será produzida. Tudo se processa como em uma indústria automatizada: a informação do produto final, qual seja, está codificada e seus elementos constituintes vão sendo trazidos até completá-lo. Este é o caráter do DNA, um gerenciador químico de produção para as substâncias não só da célula mas para o tecido ao qual pertence irrigando o órgão respectivo a este tecido. A insulina no pâncreas, a bílis do fígado, os ácidos digestivos do estômago, todos fabricados mediante as informações contidas no DNA de cada célula desses órgãos.

O DNA para a história da Ciência é algo novo e revolucionário; ele colaborou com o ponto de vista mecanicista da organização do ser vivo, pois comanda as atividades celulares como um programa enviando ordens aos subsistemas subordinados a ele. Não se sabe se foi incorporado às células ou se a partir dele é que elas começaram a se organizar; de qualquer maneira, se um indivíduo está para nascer é necessário uma "planta" determinando como será a sua estrutura e seu funcionamento baseado nos componentes desta estrutura, as relações químicas e físicas entre eles e por isto que um defeito em um gene fará com que o novo ser apresente uma doença, hereditária ou genética, em alguma fase de sua vida. A diferença entre ambas está no fato da primeira ser transmitida dos pais aos descendentes via algum gene defeituoso que não se conserta para os descendentes, e a segunda está relacionada a uma alteração genética na qual os pais não tiveram culpa.

A célula então se encaixa perfeitamente dentro da definição de ser vivente; não é a toa que forma todos os outros seres e algumas vezes se apresentam como um só indivíduo em uma espécie como nos organismos unicelulares. Descobriu-se ser ela a menor unidade viva conhecida sendo a vida um conjunto de células com todas elas trabalhando em função do organismo, de sua sobrevivência. Mesmo se o critério para saber se determinado indivíduo é um ser vivo ou não, nos parece por ora até um tanto arbitrário, devemos nos concentrar na busca de um entendimento de como ela "funciona" ou se organiza em suas funções para daí termos uma compreensão do que é a vida. E veremos que é justamente a partir de sua estrutura o caminho no qual se compreenderá as origens da vida.






3 – Sistema






Sistema pode ser considerado como um meio, modo ou método de se trabalhar. Nos preocuparemos aqui com outra definição: consideraremos sistema como um conjunto de objetos ou entidades unidos por relações de interdependência e interações entre si, sendo fundamental analisar essas relações, os padrões presentes nas interações de seus componentes, e, também, em uma espécie de finalidade no conjunto visto como um todo, o seu comportamento. Assim nasceu a Teoria dos Sistemas, uma disciplina independente devido justamente ao fato de que sistema está ligado a várias ciências, com conceitos aplicáveis a todas elas. É uma maneira de encarar problemas específicos de cada uma, utilizando métodos próprios, pois estamos falando de algo que existe por detrás de tudo que existe na Natureza. Sem nenhuma pretensão em dizer isto porque, como mencionei no capítulo anterior, nosso universo é constituído de sistemas ligados a sistemas, cabendo aos cientistas a missão de desvendar suas relações, os padrões presentes nas intercomunicações entre eles.

Sistemas podem ser partículas trocando energia entre si e formando estruturas como um átomo, composto basicamente por prótons, elétrons e nêutrons. Uma molécula também o é. Organismos animados, um computador, uma comunidade de pessoas, a economia de um país, entram neste conceito

Ao se observar um fenômeno não compreendido da natureza nós tentamos alcançar algumas respostas sobre ele através do método científico. Até uma teoria pode surgir das conclusões tiradas desse problema. Isso já vimos, mas, o fenômeno ocorre em um contexto material ou local, "um lugar", constituído de partes conectadas e atuantes entre si. Este conjunto de partes são os sistemas que estudamos. Nós acabamos por abstraí-los e os colocamos no papel a partir de observações empíricas e estudamos as conseqüências que podem ocorrer se mudarmos algumas condições ou variáveis. Um caso famoso para exemplo, lenda ou não, fora a observação do grande físico e matemático inglês Isaac Newton, de uma maçã caindo de sua árvore. Ao indagar do porquê a maçã não voltava para cima, que tipo de força estaria prendendo esse fruto no chão, ele abstraía um sistema constituído da Terra e da maçã com uma força interativa entre ambas. A famosa lei da gravidade estava começando a surgir.

Mas não só de abstrações para o papel é que os cientistas se empenham: existem muitas variações nesse método de trabalho. Pode-se ver uma máquina funcionando e se ter uma idéia direta de como mudá-la para se conseguir outros efeitos; pode-se colocar um conjunto de fórmulas da Física e da Matemática no papel e transformá-las para se obter uma teoria que somente anos mais tarde irá ser comprovada nas experiências em laboratório. Foi o que aconteceu com a Teoria da Relatividade do físico alemão Albert Einstein. O que não muda é o fato das formulações matemáticas e físicas, ou de qualquer outra Ciência, expressarem, em última instância, as características e o comportamento de um sistema ou um conjunto deles.

Na concepção da natureza dos sistemas existem muitas variações de tamanhos, de complexidade, onde os cientistas chegaram a classificar, por exemplo, a engrenagem de câmbio de um automóvel como um sistema simples, um computador como complexo e a economia de um país e o cérebro humano como extremamente complexos. Uma diferenciação entre eles seria na maneira determinística ou probabilística de suas naturezas. A engrenagem de câmbio seria determinístico, pois é possível prever como as suas partes se encontrarão após uma mudança de marcha. No cérebro humano não conseguiremos saber, a não ser estatisticamente, que comportamento ele proporcionará a uma pessoa após determinado estímulo.

Por extensão da própria definição de sistema dada no primeiro parágrafo, o foco de atenção sobre um objeto, ao analisarmos seu comportamento, nos revela ser de grande importância quando queremos definir sua complexidade. Assim a caixa de câmbio de um automóvel é um sistema simples quando observamos os movimentos de suas partes macroscópicas. Mas se quisermos pensar em sua composição física com respeito ao movimento vibracional de suas moléculas ele se torna algo extremamente complexo.

Vários problemas estão presentes aos estudos dos sistemas. O relacionamento entre as entradas ou estímulos com as reações de saída, ou comportamento, poderá nos proporcionar informações importantes sobre eles. Este relacionamento, quando possível, se dá na forma matemática e a comparação de comportamentos entre quaisquer sistemas mostrará o quão equivalentes eles são. A formulação matemática será linear ou não linear, probabilística, com variáveis discretas, dependentes do tempo, etc., de acordo com a natureza do quê se está estudando. A otimização é outro problema importante com o qual os cientistas se deparam, pois se deseja sempre buscar um desempenho próximo do ideal para se ter mecanismos com maiores rendimentos com um mínimo de consumo de energia.

Um problema interessante é aquele onde um cientista observa um comportamento desejado quando se aplica determinadas entradas, tendo-se assim uma relação direta entre esses dois conjuntos como se estivesse trabalhando com uma fórmula matemática. Aplica-se isto e irei obter aquilo; mudo para outro valor e o comportamento se dará de certa maneira.

O universo é composto de inúmeros sistemas acoplados entre si e por isto podemos transitar livremente entre eles, cada qual mais ou menos complexo, mais amplo ou não que seu predecessor, e até nos confundir sobre onde um termina e outro começa. Desta maneira, temos que definir muito bem o objeto de estudo e sua relação com o meio ambiente, tendo assim uma identificação clara de determinado sistema para podermos estudá-lo. Essa divisão em subsistemas de todo nosso universo mostra o quanto de dependência existe, por exemplo, nos ecossistemas aqui na Terra, onde a destruição ou perturbação de apenas um acarreta em danos a vários outros. A atual preocupação mundial com a saúde do planeta, já há alguns anos e esperamos, de vida longa, mostra como o homem está tomando consciência de fatos outrora só motivo de estudos em universidades.

Como exemplos de acoplamento de sistemas temos os átomos formando moléculas, os planetas constituindo o sistema solar, os conjuntos de bilhões de estrelas chamadas de galáxias e os seres vivos... Mamíferos, aves e peixes são constituídos, pensando em escala descendente de complexidade e sem entrarmos na questão de estruturas intermediárias, de órgãos, tecidos, células, moléculas, átomos, partículas elementares da matéria... e cada um destes subsistemas edificadores dos corpos destes animais possuem propriedades próprias, características, mas contribuem eficazmente no funcionamento e, consequentemente, na existência do todo.

Os sistemas em sua maioria são abertos, ou seja, trocam energia, matéria ou informação, ou qualquer combinação delas, com o meio ambiente. O sistema fechado encerra as suas atividades em si mesmo. Os seres vivos são sistemas abertos trocando continuamente matéria, energia e informação com o meio e uma confirmação deste fato é que a própria sobrevivência está diretamente ligada a isso. Imagine uma célula não reconhecendo uma porção material venenosa a qual penetra em seu interior. Sua membrana, ao se "enganar achando" que este material é um alimento a fornecer energia para a célula, estará levando à destruição todo o sistema.

Outra classificação para os sistemas diz respeito às suas partes, se são móveis ou não. Estáticas ou dinâmicas. Os sólidos são estáticos. Eles ou seus componentes não escoam, não fluem. Existe, claro, uma vibração que é inerente a qualquer porção de matéria. O carbono de um diamante vibra como uma mola tridimensional enquanto seus elétrons giram incessantemente ao redor de seu núcleo. A água toma forma dos recipientes que a contém devido à sua viscosidade, sendo esta uma das principais características na definição de um líquido como tal. Suas moléculas deslizam umas sobre as outras e, por efeito de forças eletromagnéticas, não possuem energia suficiente para se desprenderem, a menos que se forneça energia de alguma fonte como o sol ou a chama de um gás. Quanto mais as moléculas estiverem próximas ou submetidas mais intensamente a essas forças eletromagnéticas, maior será a fricção entre elas e maior a dificuldade de fluirem. Aí está a diferença entre sólido, líquido, e também os gases. Nos sólidos a atração é suficiente para deixar o material sem fluidez, enquanto que nos gases as moléculas estão separadas a ponto de existir somente choques violentos entre elas. Os líquidos e gases podem ser definidos como sistemas dinâmicos.

O que acontece porém com os seres vivos? A matéria se apresenta em muitos casos como sólida, mas mole, como a carne. Possuem líquidos como o sangue dos mamíferos, a seiva dos vegetais, e a própria água, a substância de maior presença nos corpos de muitos organismos. Já os componentes ósseos dos animais e os caules das árvores são duros. De maneira geral, os seres vivos são classificados como sistemas dinâmicos porque existe um fluxo ininterrupto de substâncias em seus corpos.






Equilíbrio






Em primeiro lugar um conceito importante aqui é o de estado. Imagine uma esfera de metal presa ao teto por um fio. Colocamos este pêndulo em movimento, considerando este sistema como não tendo atrito, e determinamos suas posições, ângulos e velocidades com o decorrer do tempo. A estas variáveis e o conjunto de valores por elas assumidas em cada instante nós chamamos de estado. Ele revela como o sistema se encontra no momento. O pêndulo passará por inúmeros estados determinados por essas variáveis. Por exemplo, velocidade nula antes de mudar o sentido de sua velocidade; então este é o ponto, à direita ou à esquerda de quem observa o movimento, mais alto em relação ao solo e o que possui maior ângulo de afastamento da vertical tomada quando o pêndulo está em repouso.

Cumpre ressaltar a importância das chamadas variáveis essenciais de um sistema que em nosso caso do pêndulo são essas posições, ângulos e velocidades, sendo desnecessário analisarmos sua temperatura, cor, densidade, estrutura cristalina, etc., pois, para cada determinado fim em nossos estudos, analisamos um conjunto específico de variáveis. Estado é uma “fotografia”, a situação aqui e agora ,de como o sistema se encontra com relação às principais variáveis escolhidas por nós e que o caracterizam. Este conceito é geral podendo ser aplicado a sistemas complexos ou simples.

Considere uma esfera no interior de uma cuia. Este é um sistema simples formado por dois objetos e não interessará para nós as cores, densidades, materiais que são formados, etc., como variáveis essenciais. Nos preocuparemos com a posição da esfera. Ela será sempre a mesma em qualquer instante se nenhuma força atuar no sentido de colocá-la em movimento. Está em estado de repouso. Sistema como este e um pêndulo atravessam um conjunto de estados ou apenas um como o da esfera, os quais se repetem indefinidamente. Existe uma trajetória percorrida pelos estados do sistema na qual as variáveis essenciais valores conhecidos ou previsíveis. Quando isto acontece dizemos que o sistema está em equilíbrio; estático para a esfera e a cuia, e dinâmico para o pêndulo.

Um recipiente contendo gás está em equilíbrio dinâmico se não altera o sistema como um todo; se a pressão e o volume, por exemplo, permanecerem os mesmos. A instabilidade corresponderia ao fato do sistema não possuir uma trajetória bem definida, não previsível. Ao deslocarmos a nossa esfera ligeiramente e a soltarmos, ela voltará à sua posição inicial. Isto é o que se chama de equilíbrio estável. O mesmo procedimento em uma superfície convexa resultará em movimento para longe de sua posição inicial, tomando-se o ponto mais alto da superfície. Tal equilíbrio é instável, ou seja, o objeto, neste caso a esfera, não retorna ao seu ponto inicial. E por último o equilíbrio indiferente ou neutro, no qual o objeto não retorna e nem se afasta de sua posição inicial: a esfera colocada em pontos diferentes de uma superfície plana sem ser impulsionada.

Se alguma força externa e no sentido lateral deslocar por um instante o nosso pêndulo, ele mudará suas posições e velocidades e não mais retornará àquele movimento que vinha fazendo antes. Os ângulos com a vertical tornar-se-ão imprevisíveis; as velocidades não terão somente o sentido na direção da trajetória modificando por completo o conjunto das posições deste pêndulo agora caótico. Não será mais possível prever com fórmulas o conjunto de valores assumidos pelas suas variáveis essenciais. Deslocamentos ocorridos para estados vizinhos, nós damos o nome de perturbação. Perturbação é tudo que desloca um sistema de estado a outro, de um conjunto deles para outro, podendo levá-lo à instabilidade.

O pêndulo e a esfera no interior de uma cuia são sistemas extremamente simples quando comparados aos circuitos de um computador, à economia de um país ou, o que é mais relevante para nós, aos seres vivos. Como ficam esses conceitos de estado, equilíbrio e perturbação em sistemas complexos?

Uma célula contém inúmeras partes e funções. Um componente seu fabrica determinada substância em quantidade apropriada, a concentração de materiais específicos em seu interior permanece dentro de níveis aceitáveis devidos a mecanismos de regulação; sua reprodução não está descontrolada como no caso dos tumores. Cada função exige uma grande quantidade de fatores e variáveis mas, percebe-se, estamos analisando-os em um nível elevado de compreensão: não nos é de interesse saber qual é a posição no espaço de algumas moléculas, como o fizemos com as posições do pêndulo, se o objeto de atenção é saber se elas participarão de uma reação química específica no interior celular. Podemos sim, querer saber se esta reação é no núcleo da célula ou no citoplasma, mas não a posição de cada uma segundo um sistema de coordenadas cartesiano. Esse nível de compreensão é também entendido quando analisamos macroscopicamente algumas funções dos seres vivos. Para um animal respirar eficientemente é necessário que seus tecidos respiratórios estejam bem mas, para isso, as células respiratórias deverão estar realizando as devidas trocas de oxigênio e gás carbônico sem maiores problemas. Veja que abaixamos de nível até chegarmos ao equilíbrio de funcionamento das células individuais e consequentemente no plano molecular.

Pensemos em um sistema hipotético, constituído de um invólucro de matéria contendo dois outros subsistemas menores, encerrados cada um dentro de outros invólucros ou membrana. Seis reações químicas ocorrem nesses subsistemas obedecendo a uma condição e a um ciclo, uma seqüência característica de ocorrência: três acontecem primeiro no interior de uma membrana para depois as outras poderem se realizar no outro subsistema e, a partir daí, o ciclo irá se repetir. As últimas reações, com os produtos formados pelas outras, produzem algumas substâncias inúteis mas também substâncias de reposição de material à membrana principal, pois senão ela se dissolveria com o tempo destruindo todo o sistema. Ele é muito simples em comparação com uma célula típica, mas servirá a nós para entendermos não só os conceitos deste capítulo como muitas idéias que surgirão bem mais à frente. O meio ambiente consegue suprir a quantidade necessária de reagentes e os produtos inúteis são excretados ao meio exterior, através da membrana principal.

Um estado do sistema como um todo seria uma "fotografia", na qual veríamos, por exemplo, as três reações iniciais acontecendo no interior de seu envoltório. Outro estado seria as duas reações finais do ciclo se processando enquanto o primeiro invólucro ainda estaria longe de recomeçar as suas atividades. Veja que estado é neste caso, uma visão macro do sistema não importando se determinada molécula já entrou em uma das membranas, ou se outra pode ser considerada uma intrusa, pois desconfiamos ser diferente das demais. Evidente é a ocorrência dos acontecimentos macros devido aos elementos que compõem o sistema, as moléculas reagentes. Uma molécula se agrega a outra por meio de forças elétricas. Estamos no domínio da Física. Um conjunto delas irá se reunir e formar outras liberando, ou absorvendo calor em um fenômeno ao qual chamamos de reação química. Passamos a outro nível, a Química. Digamos que estas reações são aquelas do sistema acima e seus produtos são utilizados por outro sistema vizinho, para determinado fim. Chegamos à Biologia como o último nível.

Nada no universo está passível de permanecer sem alguma agressão exterior e o nosso sistema celular, como passarei a chamá-lo, obedece a esta regra implacável. De repente, uma substância consegue penetrar no interior da membrana principal e começa a reagir com os produtos das três primeiras reações químicas que iriam para o segundo subsistema. Pronto, todo o mecanismo de reposição das perdas da membrana principal está afetado. Se pudéssemos ver a "fotografia" dos estados do sistema, não mais encontraríamos as últimas reações se realizando e aos poucos a membrana principal deixaria de existir e o sistema celular se destruiria. Essa substância nova é algo que deslocou o sistema celular de seus estados normais e ele não voltou a funcionar como antes; é uma perturbação.

Antes de continuarmos faço aqui uma observação a partir da Termodinâmica, o ramo da Física responsável pelo estudo do comportamento dos sistemas, a partir dos processos de transformação de energia, principalmente nas trocas de calor com conseqüente realização ou não de trabalho: temos que precisar melhor o conceito de estado e equilíbrio para organismos vivos tomados como sistemas físico-químicos. Um sistema aberto, como um ser vivo, não é considerado em equilíbrio porque ele troca continuamente matéria com o exterior. Seu metabolismo, reações químicas para obtenção de matéria e energia para uso interno, necessita de substâncias do meio ambiente para qualquer organismo funcionar adequadamente. Os organismos vivos são considerados em uma situação quase estável onde se busca e sempre se está perto do equilíbrio. Há um capítulo da Termodinâmica tratando exclusivamente de fatos como esses, a termodinâmica dos processos irreversíveis, onde os sistemas estudados não são como aqueles fechados ao meio ambiente. De qualquer maneira, existem semelhanças entre sistemas vivos e sistemas não vivos em equilíbrio. Disciplinas como a físico-química aplicam com sucesso alguns de seus princípios, próprios de sistemas em equilíbrio, na fisiologia. É o caso das proporções entre o oxigênio, a hemoglobina e a oxi-hemoglobina na respiração dos animais. Outras aplicações incluem reações enzimáticas, fermentação, equilíbrio eletrostático, etc. Percebe-se daí que se pode relacionar as duas coisas, no sentido de uma fornecer instrumentos de análise para a outra. Irei mencionar os conceitos de estabilidade e equilíbrio, como se estivéssemos pensando em sistemas fechados.

As perturbações atuam em grande número quando tratamos de sistemas eletrônicos e biológicos dos mais complexos, como as substâncias nocivas que ingerimos afetando vários de nossos órgãos internos, ou quando as variações de tensão elétrica perturbam o funcionamento de muitos aparelhos, em uma cidade. Nossas doenças são deslocamentos do estado de equilíbrio de funções biológicas, no qual os medicamentos tentam restabelecê-lo. A diversidade da natureza das perturbações e como elas influem em um sistema são motivos para importantes reflexões porque elas poderão ser também benéficas. A entrada de uma substância em uma célula fará com que se destrua algum microorganismo nocivo a ela, sem comprometer a própria vida do sistema. Em nosso sistema celular poderia, por que não, entrar alguma outra substância, ou mesmo já estar presente, a inibir a atuação daquela que iria reagir com os produtos das três primeiras reações, a tempo de se não destruir a membrana externa.

Uma das perturbações mais comuns encontradas na natureza é o atrito. O desgaste por ele proporcionado sempre aparece nos sistemas que estudamos, fazendo parte de todas as estruturas universais, do próprio "funcionamento" do universo. Importante frisar que as ciências se ocupam primeiramente com aqueles sistemas onde o atrito não aparece, para depois verificar como ele se comporta em situações normais com atrito ou mesmo sob outras perturbações.

Como podemos então pensar em equilíbrio ao passarmos, por exemplo, de um sistema sem atrito no qual chamaremos de ideal, como o nosso pêndulo, para uma situação real? Bem, um pêndulo com atrito, seja do ar ou no ponto onde ele se prende, irá se movimentar em oscilações cada vez com amplitudes menores até parar. A menos que alguma força externa o ajude em seu movimento, o atrito fará para-lo. Na verdade, o atrito quase sempre atua no sentido de brecar o movimento dos corpos. O pêndulo em repouso está agora também em equilíbrio, mas as características principais no qual se estudava, suas posições, ângulos e velocidades, não serão mais as mesmas, mostrando-nos uma espécie de “morte” do sistema, pelo menos com respeito a essas variáveis essenciais.

Em sistemas hipercomplexos como os seres vivos, as perturbações também levam à destruição certas variáveis que colocam em risco a própria vida como um todo. Uma célula possui mecanismos para não deixar que substâncias nocivas prejudiquem seu funcionamento, mas, com o tempo, esses agentes poderão gradativamente, como uma lixa corroendo um metal, destruí-la. Enquanto isso não ocorre, os mecanismos de defesa tentarão manter o equilíbrio necessário para ela sobreviver. Dá-se o nome de homeostasia a essa manutenção das variáveis fisiológicas essenciais dentro de certos limites. É ela que não deixa um sistema mudar para estados nos quais o levariam para a destruição. Nossa regulação de temperatura corporal é um bom exemplo disso. Ela sempre está por volta dos trinta e seis graus centígrados independente das variações ambientais. Qualquer sistema, incluindo os vivos, possuem um desgaste natural no qual, mesmo com mecanismos reparadores, a morte é uma condição inevitável.






       Equilíbrio de Sistemas Acoplados






Suponhamos um sistema composto de duas partes acopladas. Isto significa uma condição de troca de energia, matéria e informação ou alguma combinação das três entre si; suponhamos ainda que cada uma delas está em equilíbrio. Segue-se que o todo também estará em equilíbrio. Este raciocínio é válido se pensarmos no sentido oposto: se o todo se encontrar em equilíbrio, então cada parte também estará em equilíbrio. Se uma parte recebe um conjunto de entradas da outra que está em equilíbrio, seu estado será sempre o mesmo porque a primeira permanece no mesmo estado enviando o mesmo conjunto de energia, informação e matéria. Podemos usar a palavra estado no singular significando um conjunto deles porque a palavra conjunto já nos dá idéia de vários elementos.

Uma perturbação, ao afetar uma das partes, poderá ou não transmitir alguma influência à outra. Temos assim vários casos nos quais podemos analisar. Em primeiro lugar, se não transmitir nenhuma influência, e a perturbação for superada pela parte em questão, o todo continuará em equilíbrio. Poderá acontecer de transmitir pouca influência a ponto de também não afetar, ou pelo menos, não ser por demais nocivo à sobrevivência do conjunto. Atingindo a parte vizinha levando-a ao desequilíbrio, o todo estará comprometido. Situações análogas acontecem em sistemas constituídos de muitas partes.

Sistemas acoplados são quase a totalidade dos sistemas que estudamos na prática porque é esta a natureza do nosso universo. Sistemas ligados a sistema. Eles vivem sofrendo perturbações em partes essenciais ou não e transmitem às porções vizinhas alguma entrada, sejam elas benéficas ou não. Poderíamos escrever um capítulo inteiro sobre isto mas alguns exemplos serão suficientes. O desequilíbrio de um subsistema pode ser devido também a problemas com o seu mecanismo interno. Uma célula cancerígena se multiplicará sem nenhum controle e, depois de comprometer o órgão do qual faz parte, irá fazer com que este próprio órgão afete o seu sistema de origem. Impressionante notar como um subsistema tão pequeno leva com o tempo todo o sistema à destruição. O vírus da AIDS ataca os centros de produção de células de defesa do organismo humano e com isto, ao ficar debilitado, a pessoa padece de inúmeras infecções e doenças. Bem, mas muitos descontroles não são tão maléficos. Os seres vivos carregam consigo defeitos pela vida inteira e mesmo assim podem levar uma vida normal por muito tempo. O que é interessante notar é o fato dos sistemas biológicos complexos continuamente passar por desequilíbrios em suas partes e reagir tentando não deixar que as influências negativas os prejudiquem. A homeostasia é um exemplo, no qual uma célula ou um tecido e mesmo um órgão se esforça por manter seus estados sob um certo controle, não deixando que quaisquer desequilíbrios afetem outras partes vizinhas.





        Propriedades Emergentes






A matéria bruta possui uma imensa variedade de formas, estruturas internas, cores, constituição química, etc. Estamos falando de rochas, minérios, enfim, do mundo mineral. Ele é formado de elementos incomparavelmente menos complexos em estruturas, que o universo dos seres animados. Neste capítulo farei algumas considerações sobre uma particularidade, com respeito a algumas de suas propriedades sendo de enorme interesse para quando chegarmos aos últimos capítulos.

O diamante é formado somente de átomos de carbono. Mas a distribuição espacial desses átomos nos dão as propriedades tão comuns dessa pedra preciosa. Embora considerarei aqui o diamante lapidado, chamado de brilhante, podemos compará-lo, por exemplo, à grafita, onde as diferenças quanto a cor, dureza, brilho e também muitas outras do campo técnico, como escoamento e ponto de fusão, são tais que qualquer pessoa acharia diferentes suas constituições físicas. Engano. A grafita também é formada da reunião de átomos de carbono. Então, como se explica esse aparente paradoxo? Simplesmente pela distribuição espacial dos átomos. Nada mais. No diamante eles estão dispostos em uma configuração na qual um átomo central está ligado a três outros em cada vértice de uma pirâmide de quatro faces; uma estrutura espacial tetraédrica. Essa estrutura se repete indefinidamente sendo de 109,5o o ângulo para quaisquer de cada três desses átomos. Elementos químicos como o germânio, o silício e o estanho se cristalizam da mesma maneira.

A ligação entre os átomos é a ligação covalente, onde há um compartilhamento de elétrons em suas órbitas e não uma transferência deles de um átomo para outro como na ligação iônica. Na grafita, os átomos estão também ligados pela covalência mas em planos hexagonais bidimensionais. É como se juntássemos vários hexágonos nos quais em cada vértice estivesse um átomo de carbono. Sobre esses planos atuam as forças de Van der Waals, as quais não são suficientemente fortes, permitindo o deslizamento de umas sobre as outras e conferindo à grafita uma propriedade lubrificante. Assim vemos que, em nível submicroscópico, atômico, a grafita e o diamante diferem apenas na distribuição espacial de seus átomos, mas em outro nível, o nosso, macroscópico, eles são completamente diferentes. Isso vale para todos os materiais que conhecemos. A própria Ciência dos Materiais, disciplina que estuda a matéria, diz que a estrutura de cada objeto é responsável pelas suas propriedades.

Nós enxergamos os objetos porque a luz por eles refletida sensibiliza nossos olhos e, através de processos bioquímicos de transmissão de informação, o cérebro interpreta aquilo que olhamos. Qualquer problema nessa transmissão ou nos centros cerebrais de processamento das informações recebidas, resultará na deformação ou perda da capacidade de reconhecimento de qualquer objeto.

Porque o espaço é escuro? Porque não há matéria para refletir a luz do Sol ou de qualquer outra estrela, caso não estivermos olhando a pontos onde o brilho solar não é suficientemente intenso. E um objeto não refletor? Ele nos apresentará totalmente escuro, negro, em uma intensidade nunca observada por ninguém porque não existe no universo nenhum tipo de material capaz desta façanha. Os objetos materiais sempre refletem um pouco de luz por mais negros que sejam. O inverso acontece para os materiais brancos onde refletem quase totalmente a luz nele incidida. E as cores? A folha verde de uma árvore reflete predominantemente a cor verde do espectro eletromagnético. Do conjunto das três cores primárias, azul, verde e vermelho, saem as misturas de cores que encontramos na natureza e também nos materiais concebidos pelo homem, toda a quase infinita e rica diversidade de tons apreciados pelos nossos olhos. E na realidade são as composições químicas e estruturas espaciais dos átomos de cada material que nos fornecem as reflexões necessárias para distinguirmos uma cor de outra, um tom de outro.

A cor é uma propriedade macroscópica dos objetos materiais. Vejamos o diamante. Ele deixa a luz atravessá-lo, mas alguma coisa é refletida porque senão seria invisível como aqueles seres de outro planeta, nos filmes de ficção científica. Mesmo assim dizemos que ele é incolor. Um átomo de carbono tem cor? Ele é tão pequeno que só o enxergamos com determinados microscópios especiais e mesmo assim não apresenta as cores com as quais estamos acostumados. Só aparecem nos registros tons escuros e cinzas e ainda devido às condições técnicas de observação dos aparelhos, pois senão seríamos levados a questionar se, como o tom escuro aparece, então haveria reflexão de determinadas freqüências. Os cientistas usam feixes de partículas subatômicas para tanto, não caracterizando uma observação normal das freqüências de ondas eletromagnéticas como o fazemos com nossos olhos. Então a cor é uma propriedade de objetos macroscópicos refletores de luz. Ela só aparece depois de uma reunião de objetos microscópicos, sendo assim uma propriedade emergente dos sistemas acoplados. O carbono determina as propriedades refletoras do diamante, através do arranjo espacial tetraédrico que é muito diferente dos hexágonos da grafita.

Se pararmos para observar notamos a ocorrência de propriedades novas, emergentes da matéria cada vez que passamos de um nível de complexidade organizacional a outro maior. Um elétron possui, por exemplo, carga elétrica. Um próton também. Mas a reunião dos dois leva-nos ao átomo de hidrogênio. Duas estruturas dessas, ou sistemas, como quiser, terão a propriedade de se combinarem com um átomo de oxigênio, este com nêutrons em seu núcleo, e assim formarem a água, com todas as suas propriedades físicas e químicas as quais nenhum agrupamento de prótons, nêutrons e elétrons teriam se nós os combinássemos de qualquer maneira que quiséssemos ou pudéssemos; a não ser do modo específico da água. Ela reflete pouco a luz do Sol sendo por isto incolor. É um solvente e é estável quimicamente com ponto de fusão a 0 oC e vaporização a 100 oC. Propriedades como estas nem são definidas para uma reunião qualquer de prótons, nêutrons e elétrons. Simplesmente não existem para um caso destes.

Propriedades emergentes são comuns no universo. Convivemos com elas e nem as percebemos, ou nem pensamos que fora de nossas vidas cotidianas, na natureza, existem sistemas constituídos de propriedades além daquelas de seus elementos constituintes.






Informação






Vivemos em um mundo de computadores, rádios, televisão, jornais, revistas, onde a informação se faz presente diariamente em nossas vidas. A quantidade de informação é tamanha que não temos idéia de quanta energia é consumida para, ao ligarmos a televisão, assistirmos ao que acontece, via satélite, no outro lado do mundo. Ao que acontece em nossa cidade, região, estado, país e no mundo. E não só energia elétrica, mas o trabalho de quem está envolvido direta e indiretamente em todos os processos nos quais ela circula de um lado para outro.

A comunicação, simplificadamente o envio e recebimento de informações, sempre foi um dos elementos relacionado com a sobrevivência do homem. Gestos, palavras, sinais, a escrita, ele sempre teve necessidade de se comunicar com os seus semelhantes. E na sua história no planeta, enquanto criava meios de locomoção, a utilizava para se comunicar o mais rápido, em maiores distâncias e com um maior número de pessoas ao mesmo tempo. Mensagens escritas enviadas por terra, mar e rios, foram durante muitos séculos o meio mais comum do homem se comunicar. Mas quando descobriu que a corrente elétrica poderia transmitir sinais codificados o nosso mundo começou a se configurar no que é hoje: uma rede de comunicação.

Primeiro o telégrafo. Em 1837, o norte-americano Samuel Morse, patenteou um sistema na qual impulsos elétricos, breves e longos, transmitia informações codificadas à distância. Um impulso breve consistia em um toque rápido no telégrafo ao contrário do impulso longo. Um ponto e um traço ou um sinal sonoro breve e um longo, eram tudo o que se necessitava para se transmitir qualquer informação. A cada letra do alfabeto era associado um conjunto de pontos e traços que representavam sons breves e longos e assim um texto poderia trafegar por um fio à quilômetros de distância. É o conhecido código Morse. Alguns aperfeiçoamentos deste sistema incluíram a possibilidade de várias pessoas utilizarem ao mesmo tempo um só canal de transmissão.

Em 1888 o físico alemão Heinrich Hertz conseguiu transmitir pelo ar as ondas eletromagnéticas previstas teoricamente por um outro físico, o britânico James Clerk Maxwell, também no século XVIII. O italiano Guglielmo Marconi, em 1901, converteu em sinais elétricos essas ondas eletromagnéticas e assim as mensagens passaram a não depender somente de fios metálicos. Nascia a radiodifusão que incluiria a transmissão de ondas para a conversão em sons. Mas, se com a corrente elétrica e as ondas eletromagnéticas se consegue sons e informações, por que não tentar imagens e cálculos? O cinema, a televisão e o computador, completaram de modo sofisticado os sistemas de transmissão e processamento da informação hoje tão arraigados em nosso mundo.

O conceito de informação é de grande importância na Teoria dos Sistemas. Ela possui dois sentidos, um em nossa linguagem habitual e outro na concepção científica. Usualmente informação é um conhecimento recente para utilizarmos com uma certa finalidade. Seria um tipo de conhecimento. Um jornalista ao escrever uma matéria, poderá levar um tempo razoável só para conseguir uma data a qual é imprescindível para uma determinada argumentação. Essa data é de grande valor como conhecimento, como informação para ele e os leitores do veículo jornalístico ao qual pertence. Para a Ciência, a informação é o conhecimento obtido a partir da análise de um conjunto de dados mas relacionado com a transmissão de sinais, suas combinações e freqüências de emissão e recepção, através de sistema a sistema.

O programa SETI(Search for Extraterrestrial Inteligence - Procura por Inteligência Extraterrestre), de busca de sinais provenientes do espaço poderá um dia obter talvez aquela que será uma das maiores descobertas já realizadas pelo homem: a existência de seres vivos com inteligência igual ou superior à nossa. Ele está em curso utilizando poderosos radiotelescópios apontados às estrelas e recebendo sinais de emissões de raios-X, gama, etc., dos mais longínquos pontos do universo. A função dos cientistas é procurar algum padrão inteligente, seqüências com alguma lógica, no meio de inúmeros sinais caóticos emitidos por astros distantes de nós. Alguma informação pode estar sendo transmitida por alguma civilização adiantada; mesmo se não conseguirmos decifrar um esquema de códigos, o fato de a recebermos indica a presença de seres no universo tão ou mais evoluídos que nós.

A informação flui de um sistema a outro através de um canal de comunicação ou transmissão. Um dos sistemas é o emissor e o outro um receptor; este modelo de acoplamento forma o menor conjunto possível para se estabelecer alguma comunicação. O mais simples sistema de comunicação. Na prática o número desses subsistemas é muito grande chegando a formar uma rede hipercomplexa, onde temos diversas fontes de emissões, vários receptores e canais. Os objetos de uma sala emite aos nossos olhos uma quantidade enorme de informação acerca de formas, cores, tons, posições, etc.; são emissores e o canal seria o ar transmitindo a luz na forma de ondas e o nervo óptico transformando-a em impulsos nervosos a chegarem em nosso cérebro, o receptor. Tudo isto porque estamos falando da luz sem considerar as fontes de som, cheiro, etc., a enviarem continuamente informações aos nossos sentidos.

Os meios pelos quais a informação é transmitida revela uma interessante relação entre ela e a energia. Veja o que acontece quando assistimos a uma notícia em um telejornal. Uma série de reações químicas que consomem energia têm lugar no cérebro do repórter ou apresentador e impulsos nervosos são enviados aos músculos da garganta para vibrarem e produzirem sons. Ao mesmo tempo em que a luz refletida por ele é captada pelas câmeras e transformada em impulsos elétricos, o microfone capta as ondas sonoras do ar para realizar o mesmo processo. Esses impulsos são enviados para aparelhos específicos que transformam-nos em ondas eletromagnéticas, a serem transmitidas às antenas das televisões onde novamente são convertidas em impulsos elétricos para logo em seguida se transformarem em imagem e som. É cansativo até descrever um processo como este e ainda eu resumi. A imagem e o som da televisão são transmitidos pelo ar à visão e audição do telespectador até o cérebro entender o conteúdo da notícia. Impressionante é o fato da energia mudar de forma mais de uma dezena de vezes, se analisarmos este fato minuciosamente, mas a informação é preservada.

Dizem alguns, e até exagerando em suas idéias, que a informação é algum tipo de substância ou meio; a verdade reside na concepção de conhecimento como uma estrutura lógica passível de ser entendida. Informação é conhecimento. É uma variante dele. Assim uma estrutura lógica com um significado é conduzida mesmo se a energia mudar de forma várias vezes. A energia então é o suporte, o meio pelo qual essa estrutura é transmitida. É a informação.

Nos caminhos percorridos pelas informações entre os sistemas, ou dentro deles, algumas podem se perder ou chegarem aos receptores um tanto diferentes de como foram emitidas. As músicas em um rádio não estão sendo ouvidas porque ele emite um chiado encobrindo a transmissão. Parte da informação foi bloqueada por um problema que chamamos de ruído. Contudo ele é relativo para quem está trabalhando com ele, pois a música no rádio pode estar não interessando ao técnico que justamente procura eliminar esse chiado do aparelho. Sua atenção está voltada para o barulho e seu local de origem. O ruído é indesejável quando prejudica a comunicação entre os sistemas e os técnicos, sejam eles eletrônicos ou não, trabalham incessantemente para diminuí-lo ou eliminá-lo por completo. Na Biologia ele é considerado como agressões do meio ambiente pelas quais um sistema vivo sofre, o que não está muito distante da definição para outros tipos de sistema.

Na década de 20 surgiu um ramo da Matemática Aplicada, a Teoria da Informação, como um meio de analisar problemas práticos nos quais se deparavam os cientistas da área de comunicação. Na década de 40, com os trabalhos do matemático inglês Norbert Wiener e do engenheiro elétrico americano Claude E. Shannon, houve uma conexão entre os conceitos de conjunto, comunicação e informação. Aí se formulou uma teoria geral sobre o assunto. A idéia de conjunto é entendida nos exemplos que seguem. Um rapaz quer avisar a namorada que não irá a um encontro, mas só dispõem de um mecanismo para se comunicar. Como o telefone da garota está com defeito e só emite o toque de chamada, não sendo possível a eles conversarem, então estabeleceram o seguinte código: se tocar uma vez haverá o encontro no lugar aonde sempre vão e na ausência de chamada isto não será possível. Mas, se o telefone passar a nem mais tocar o som de chamada, então não será possível marcar nenhum encontro. Das duas possibilidades, tocar ou não, o conjunto se restringiu a uma só e com isso interrompeu-se a comunicação entre o casal.

Consegue-se através de um conjunto de sinais dos mais diversos uma comunicação entre sistemas desde que algum código seja pré-estabelecido. É possível compor qualquer número utilizando-se sinais luminosos e fazer-se entender por outra pessoa que conhece a combinação, a codificação entre eles. Uma lâmpada acesa por menos de um segundo corresponderia ao algarismo um. Espera-se dois segundos e faça com que ela pisque três vezes em menos de um segundo: é o algarismo três. Esse conjunto de sinais indica o número 13. Existe um conjunto de possibilidades quando se transmite uma informação. Ela própria faz parte dele. Uma expressão do tipo "o livro que li possui capa azul" está mostrando, pelo adjetivo, uma cor específica e ao mesmo tempo excluindo todas as outras possibilidades, todas as outras cores. Ela possui mais informação que uma expressão do tipo "o livro tem capa de cor" porque reduziu uma incerteza, especificou uma cor para o livro. Desse modo os cientistas passaram a quantificar a informação, a buscar uma medida para ela. Mesmo na década de 20 eles já afirmavam que a informação é maior quanto mais possibilidades forem eliminadas. Mas só com Claude Shannon, em 1949, que a medida da informação seria estabelecida com rigor.

A comunicação do rapaz com a namorada estava dependente do toque ou não do telefone. São duas possibilidades. O logaritmo na base dois das possibilidades nos dá a quantidade de informação envolvida em uma comunicação. A expressão matemática é log2N = M onde N é o numero de possibilidades ou estados do sistema e M a quantidade de informação. Realizando o inverso desta operação temos 2M = N. Se o telefone apresentasse mais defeitos e o conjunto se reduzisse para um, a comunicação não seria possível. Claro, o logaritmo de um na base dois é zero(log21 = 0, pois 20 = 1) significando nenhuma informação transmitida. Para se ter o mínimo de comunicação é necessário duas possibilidades onde o logaritmo de dois na base dois é um(log22 = 1, pois 21 = 2). Para o casal o resultado é um, o mínimo de informação possível para o encontro se concretizar, tocar o telefone ou não. Esse "um" é o bit, a menor unidade de informação. Ele veio das palavras binary digit(dígito binário). O conjunto de oito bits é o byte onde tomamos por referencial ao analisar a memória de um computador, ou mesmo ao nos depararmos com alguns de seus periféricos, usando as terminologias como o Mb(megabytes) e Gb(gigabytes). Dígito é um algarismo e binário é um adjetivo significando algo com dois elementos. Um conjunto para nós. Dígito binário é então um algarismo formado por somente dois elementos.

Um computador realiza diversas tarefas, desde uma simples conta de somar até um projeto de arquitetura de um prédio. Nem dá para descrever aqui toda a sua potencialidade; basta vermos como está sendo largamente utilizado nas empresas, indústrias, bancos, pequenas empresas do comércio, etc., sem falar na rede mundial Internet. Se tentarmos defini-lo poderíamos dizer que é uma máquina automática de processamento e armazenamento de informações. Máquina porque os primeiros instrumentos de cálculo e de processamento de informação eram mecânicos.

O físico, matemático e filósofo francês Blaise Pascal, foi o primeiro a inventar uma calculadora mecânica em 1642. No começo do século XVIII se criou a primeira forma de uma máquina realizar um processo através de códigos. E não estava relacionado com cálculos. Para se introduzir um desenho em um tecido era necessário uma pessoa selecionar um conjunto de fios de um tear a serem trabalhados na confecção final do produto. O engenheiro francês Basile Bouchon, em 1725, construiu um rolo de papel perfurado onde as agulhas de tecelagem seriam lançadas para a frente, a penetrar no tecido, onde não houvesse os orifícos. Para cada desenho um arranjo de orifícios.

Outro francês, o mecânico Joseph Marie Jacquard, em 1804, aperfeiçoou esse processo utilizando um conjunto de cartões perfurados a empurrarem as agulhas. Mais complexo que o de Bouchon e utilizando-se mais agulhas, este tear permanece inalterado, em essência, até hoje. O que esses dois franceses fizeram foi um modo de se "comunicar" com a máquina, de faze-la trabalhar como eles queriam segundo programas variáveis. E a linguagem de comunicação foi a de orifício e não orifício...

O matemático inglês Charles Babbage foi quem primeiro tentou utilizar cartões perfurados em uma máquina e processar informações algébricas, números e cálculos. Ele fracassou porque enfrentou problemas técnicos com a limitada indústria metalúrgica da época. Mas em 1890, para resolver o problema do recenseamento norte-americano, no qual a população do país havia aumentado consideravelmente, Hermann Hollerith inventou um sistema onde as informações sobre as pessoas como sexo, idade, etc., eram computadas em cartões perfurados. Depois esses cartões eram colocados sobre alguns recipientes contendo mercúrio para que agulhas passassem pelos orifícios a fim de registrar eletronicamente as informações em um dispositivo específico.

Estava concretizada a moderna comunicação entre o homem e a máquina; décadas se passaram até que oficialmente o primeiro computador totalmente eletrônico fosse colocado para trabalhar em 1946. Era o ENIAC. Composto de 18.000 válvulas, pesando cerca de 30 toneladas e cobrindo uma superfície de 140 m2, foi o pai de todos os nossos computadores atuais.

O processamento das informações em um computador realiza-se automaticamente através da álgebra booleana interpretando os dois estados, 0 e 1, significando presença ou não de um sinal elétrico em cada milhar ou milhões de transistores de um chip. Números, letras, pontos luminosos coloridos, etc., são formados a partir dessa associação simples entre dois estados elétricos e uma lógica construída em 1854 pelo matemático Charles Boole.

As informações nos seres vivos são processadas de maneiras diversificadas quanto aos veículos que as realizam. Íons, moléculas, átomos, macromoléculas, interações destes entre si, etc. A passagem de um íon através de uma membrana carrega uma dose de informação pois a seletividade da estrutura deste envoltório “reconheceu” que aquele tipo de átomo poderia entrar na célula. Pode ser que a membrana não possuísse capacidade suficiente de reconhecer o quão perigoso esse íon seria ao sistema inteiro; mas outra, com estrutura diferente, não permitiria essa entrada e a sobrevivência da célula estaria assegurada. A diferença entre as duas está na quantidade de informação que elas conseguem processar.

O DNA, ao fabricar uma enzima com mais aminoácidos que outra, “processa” mais informação pois a própria codificação no gene específico para tanto é maior. A seqüência de bases naquele pedaço de ácido desoxirribonucleico é maior.

Outra forma de processamento no DNA consiste na sua capacidade de formar indivíduos, complexos ou não. Com algumas exceções, quanto mais complexo é um indivíduo, maior é o comprimento de seu DNA. O ser humano, possuindo o sistema mais complexo que conhecemos, o seu cérebro, tem o maior DNA conhecido. Uma exceção a esta regra é a rã, que tem as suas seqüências de bases nitrogenadas com um comprimento maior que as nossas. Mas muitos genes não são ativos ou não funcionam e vemos que só o nosso cérebro é muito mais complexo que todo o corpo da rã incluindo o seu cérebro.

Uma célula de defesa imunológica tem que necessariamente reconhecer um maior número de microorganismos para manter em níveis ótimos as atividades vitais do organismo a qual pertence.

Em geral, uma célula mais complexa que outra “conteria” mais informação, processaria mais informação. Não vou definir em bits ou bytes com uma analogia entre os circuitos eletrônicos, rígidos, de computadores, e os elementos sólidos, mas imersos em fluidos protoplasmáticos nos interiores celulares. Basta ao leitor compreender o exposto nesses últimos parágrafos; compreender que processamento de informação também existe dentro das células e não só em nível macroscópico como quando interagimos com o meio ambiente. Na realidade, tudo que vemos, compreendemos e sentimos, é processado microscopicamente, desde os terminais nervosos dos órgãos dos sentidos, olhos, pele, ouvido, nariz e boca, até chegar nas células cerebrais onde o trabalho é terminado.






Retroação e Cibernética






A homeostasia é a manutenção das variáveis de um sistema dentro de limites aceitáveis. Na Biologia essas variáveis são as fisiológicas, aquelas que mantém vivo qualquer ser conhecido por nós.

Para introduzir alguns conceitos de como isto ocorre, vamos imaginar um sistema simples constituído de um recipiente com um líquido suscetível de expandir-se com o calor. Uma haste é ligada a um êmbolo e a uma saída de gás que mantém aceso uma chama para aquecer o líquido. Conforme o líquido se aquece, ele se expande e move o êmbolo para cima e a haste faz diminuir a saída de gás, diminuindo assim o fogo e consequentemente o calor que expandia o líquido e o êmbolo. Por outro lado, ao diminuir o fogo, o êmbolo desce e a haste age ao contrário, liberando a saída de gás aumentando o calor do líquido e fazendo novamente o êmbolo subir. Temos então uma série de reajustes na posição do êmbolo levando-o a permanecer em uma determinada altura, ou, pelo menos, em uma determinada faixa de posições nas quais o sistema permanece em equilíbrio. Se alguma perturbação externa diminuir a quantidade de calor gerada pela chama, o êmbolo, através da temperatura em queda do líquido fará seu papel regulador acionando o gás e consequentemente aumentando a chama, deixando novamente sua posição no recipiente dentro dos limites anteriores, sendo válido o mesmo raciocínio, mas com o sistema funcionando de maneira inversa, para uma perturbação na qual aumenta o calor da chama. Este é o princípio da retroação ou feeedback. Ele é o agente, o motivo mantenedor da homeostasia de um sistema. Em termos conceituais, parte da energia de saída, do movimento do êmbolo, retorna para regular a entrada, chama gerada pela quantidade de gás, a fim de manter o sistema equilibrado. Se diz que o efeito, movimento do êmbolo, tem sobre a causa, o calor da chama, para condicioná-la a ele mesmo. Parte do efeito se torna parte da própria causa.

A retroação é negativa(reguladora) se o efeito for em sentido oposto à causa e positiva(amplificadora) se for no mesmo sentido. Se negativa, ela tende a regular o sistema pois não o deixa escapar da condição na qual suas variáveis essenciais permanecem dentro de limites aceitáveis. Um sistema, ao se afastar de uma posição ótima, em qualquer direção ou sentido, é trazido de volta. Se a retroação é positiva, haverá um deslocamento no mesmo sentido dessas variáveis, amplificando-as e levando o sistema a se afastar dos limites aceitáveis. Esta amplificação poderá ainda ser negativa ou positiva: se negativa haverá um amortecimento nos valores das variáveis, diminuindo seus valores ou, se positiva, esses valores aumentarão. Se um sistema possuir somente retroações positivas, ele não voltará à posição ótima, de equilíbrio, afastando-se até ser destruído.

Exemplo clássico de retroação é a tentativa de se atingir um alvo em movimento como um atirador treinando sua pontaria em um disco cruzando sua frente, a vários metros de altura. Se o objeto, em um instante, se mover para baixo devido a uma corrente de ar, o atirador corrige sua pontaria o suficiente para atingí-lo nesta nova posição. Esta correção nada mais é que a visão informando ao cérebro para onde seus músculos deverão se mover. A cada momento então, o atirador recebe informações e reage adequadamente para atingir seus objetivos. Fica claro o papel essencial da transmissão de informação no controle, na regulação de sistemas onde se tem retroação. A energia e a informação são dois pilares importantes para um sistema desses funcionar de maneira eficaz.

Imagine se o nosso atirador tiver alguma perturbação na passagem da informação visual em nível do nervo ótico, para o cérebro, a ponto de atrasa-la. Ele não conseguirá acertar seu alvo. Um motorista embriagado pode não manter seu veículo dentro de sua faixa por muito tempo, pode demorar a desviar de um obstáculo. Quando dizemos que o álcool afeta o reflexo de alguém queremos dizer algo a respeito, sem saber, do conjunto de retroações necessário para manter o motorista na pista dentro de limites seguros. Sim, porque só o ato de dirigir implica em uma série de correções onde, ao menor desvio para qualquer de ambos os lados, a pessoa corrige seu veículo o suficiente para não sair dos limites do caminho no qual está percorrendo. Evidentemente esse conjunto de feedbacks não é pequeno: podemos considerar ainda o aumento ou diminuição da velocidade do veículo nas situações onde se faz necessário, a própria relação entre velocidade e distância deslocada do pedal do acelerador, etc.

Dei esses dois exemplos de sistemas onde podemos tomar contato com o princípio de retroação, mas a vida, os seres animados, possuem uma quantidade imensa de dispositivos nos quais inúmeros “feedbacks” em conjunto mantém a engrenagem vital funcionando de maneira eficaz para a sobrevivência do todo. Note-se que pelo exemplo do êmbolo há, evidentemente, limites nos quais as perturbações podem destrui-lo em pouco tempo. Se aquecermos ou resfriarmos por demais o ambiente na qual se faz a experiência, o sistema em questão pode não funcionar. E assim existem diversas situações nas quais podemos prejudicar o funcionamento não só do sistema mencionado mas de qualquer outro.

Antes da segunda guerra mundial, nos Estados Unidos, muitos cientistas das mais diversas áreas se reuniam para debaterem assuntos relacionados ao controle em sistemas mecânicos, elétricos, etc. Cada um levava consigo problemas específicos nos quais trabalhavam. Haviam matemáticos, engenheiros, fisiologistas, enfim, uma boa variedade de pessoas interessadas em analisar seus problemas até do ponto de vista matemático, onde se equacionava os meios e os fins por onde a informação penetrava e se processava nos diferentes sistemas apresentados por eles. Máquinas eletrônicas, seres vivos, máquinas de telecomunicações, etc., tinham seus comportamentos analisados a partir de como se podia tratar o controle em cada uma. Sentiram esses homens que havia então um novo campo a se explorar, um campo ainda não batizado, não oficializado, pois muitos de seus principais tópicos já haviam sido isoladamente estudados, ou pelo menos muitos cientistas já estiveram em contato com eles, em alguma época em suas pesquisas. Perceberam que havia uma “supraciência” envolvendo muitos dos fenômenos das diversas ciências conhecidas, não somente daquelas as quais pertenciam seus trabalhos.

Norbert Wiener, um dos principais expoentes dessas reuniões, em 1948, publicou um livro – “Cibernética – Controle e Comunicação no Animal e na Máquina”, fundando oficialmente a Cibernética como a Ciência interdisciplinar dos sistemas em toda a natureza. Ele havia trabalhado para o governo de seu país nos problemas técnicos envolvendo a maneira pela qual um avião pudesse ser atingido por um projétil. O princípio da retroação fora identificado como talvez o principal tema dessa nova disciplina, pois está diretamente ligado ao controle, seja no animal ou na máquina.

A palavra cibernética está, em sua etimologia, relacionada com a viagem de Teseu a Creta na Grécia antiga. O sucesso dessa viagem fora festejada por muitas vezes e Teseu homenageava seus pilotos que o levaram àquela ilha. A palavra kybernytik seria usada por Platão no sentido de governar, na sua obra “República”, e no sentido de pilotagem de navios em “Alcebíades” e em “Górgias”. Pilotar e governar possuem significados semelhantes pois ambos, em última análise, se referem à busca de alvos específicos, sendo que governar encerra uma numerosa gama de variáveis e talvez diversos alvos a serem atingidos, ao mesmo tempo ou não. O físico francês André Marie Ampère, que viveu no final do século XVIII e começo do século XIV, chegou a utilizar a palavra cibernética quando se referia a controle ou direção. Mas somente no século vinte, quando da evolução da tecnologia em coeficientes tão altos como nunca visto na história da humanidade é que seria utilizada finalmente com um significado permanente. E chegou com o status de Ciência.

Cibernética é realmente a ciência do controle no animal e na máquina como Wiener a concebeu para o subtítulo de seu livro. Animal porque se refere aos seres vivos em geral, incluindo as plantas. Máquina porque, além daquelas às quais estamos acostumados em nosso dia a dia portadoras de peças, fios, chips, estruturas metálicas, etc., se refere ao universo físico e químico de nosso mundo. Para tanto ela se utiliza dos sistemas como o foco de atenção porque são eles os objetos aos quais queremos estudar. É um capítulo da Teoria de Sistemas onde o controle é o assunto principal. A informação não é menos importante pois ela é quem caminha no interior dos sistemas, e fora deles, nas transmissões de um a outro, para se obter o controle desejado. Assim, a ação em qualquer sistema, seja mecânico, elétrico, biológico, etc., é realizada em muitos casos através de objetos, partes físicas, mas, para isso, é necessário a transmissão correta e eficiente da informação em seus interiores. Na realidade, matéria, energia e informação caminham juntas quando falamos de controle em sistemas. 






          Nível Funcional Sistêmico






Pretendo expor agora a principal idéia às nossas discussões onde caberá em primeiro momento um exemplo bem simples, embora não pertencente à Física, à Química ou a Biologia, para depois voltar diretamente às questões da natureza. Imagine uma pequena empresa onde as pessoas trabalham com tarefas tão comuns a este tipo de sistema como o registro de entrada de mercadorias, vendas, cobrança, entregas dos produtos, etc. Cinco pessoas realizam eficientemente todo o trabalho com uma carga horária de oito horas por dia cada uma. A chegada de um computador pode ser uma ameaça aos empregos dos funcionários, pois ao realizar tarefas rotineiras com maior rapidez ele deixa algumas dessas pessoas com um maior tempo livre. Mas os dirigentes preferem canalizar esse tempo extra para os funcionários ajudá-los no crescimento desta empresa. Eles seriam usados em novas funções visando um maior faturamento e novas tarefas aparecem como uma novidade para eles: um dos funcionários passaria de burocrata a vendedor, outro ajuda seu chefe em novas metas de vendas enquanto o volume de mercadorias aumenta. E o tempo gasto para se gerenciar o fluxo dessas mercadorias, mesmo usando o computador, poderá aumentar pois a quantidade delas cresceu em um ritmo desproporcional ao esperado, requerendo mais trabalho de um terceiro funcionário.

O crescimento da empresa se torna algo viável onde o fluxo de informações se torna maior juntamente com o fluxo de mercadorias e do objeto principal de um sistema desta natureza, o dinheiro.

Não há como negar que existem mais coisas envolvidas em situações deste tipo como uma boa administração, visão para novos negócios, etc., mas a idéia básica de aumento na quantidade de informação e fluxo de mercadorias se revela algo muito importante na qual esse sistema obteve então uma transição de fase, digamos assim, de um plano mais baixo para outro mais alto em termos de funcionamento. Introduziu-se um elemento, o computador, que ao processar mais rápido e com qualidade as informações necessárias a um aumento da produtividade da empresa, ajudou-a em seu crescimento. Eu disse mais qualidade no sentido de buscar alternativas imprescindíveis a um empreendimento destes antes impossíveis aos funcionários e também ao dirigentes.

Entrando na Química, se uma substância na qual batizaremos de A, é reagente com B para uma determinada reação no interior de um envoltório ou membrana em suspensão, e C é o produto desta reação, podemos dizer que a membrana efetua constantemente uma seleção no meio ambiente pois, dentre centenas ou milhares de outras substâncias, apenas algumas serão aceitas. A eliminação de C, ao se reconhece-la como "algo sem importância”, evitará um acúmulo talvez indesejável desta substância no interior do sistema. Além dele possuir energia, pois em qualquer reação química ela está presente, notamos também um processamento, embora muito simples, de informação.

Outra membrana poderá deixará entrar em seu interior um número maior de moléculas ou átomos. Imagine então três substâncias como as citadas anteriormente, A, B e C, e na qual uma outra, D, penetre no interior da membrana prejudicando a reação em andamento. O sistema poderá ser destruído pelo menos no que se refere à reação, mas a presença de uma quinta substância, digamos, E, se acoplará a A, não a prejudicando e formando um subsistema limitando a ação de D. O fato de se acoplar, reagir, em qualquer caso, demonstra afinidade, reconhecimento, troca de informação. Então, em termos de matéria, informação e energia esse pequeno sistema passou de um nível a outro, agora superior na medida destas três variáveis.

Irei falar em nível funcional sistêmico tendo em mente o fato do sistema trabalhar com matéria, energia e informação presentes em quantidades passíveis de serem medidas, ou pelo menos comparadas com quaisquer outro sistema. Não quero com este termo criar algum conceito novo, mas apenas ajudar a explicar de maneira satisfatória alguns fatos relativos a vários sistemas no que se refere às suas maneiras de "funcionar". É o próprio funcionamento do sistema, encerrando uma certa medida dessas variáveis, a que chamarei de nível funcional. Ele seria o conjunto delas, um parâmetro onde a estrutura do todo, com o seu funcionamento, pudesse ser avaliada.

Em sistemas simples como esses descritos acima, o número de estados de qualquer conjunto de variáveis, se tomadas com respeito a partículas unitárias como os átomos, é muito grande, impossível de se medir. Só as suas posições, em contínua mudança no interior da membrana, seria objeto da Estatística e não de sistemas determinísticos. Mas o que importa para nós é o fato do recebimento de matéria do exterior, reação com uma ou talvez mais substâncias e posterior eliminação do subproduto. Isto sim é passível de conceituarmos em nível funcional sistêmico ou nível funcional, tornando este sistema uma fábrica de determinada substância.

As coisas então ocorreram em nossos exemplos de uma maneira que o nível funcional do sistema pôde se elevar, aumentando também a sua quantidade de matéria organizada. Nenhuma fantasia ou truque da natureza: ela, através das leis da Física e da Química age por si só desta maneira. A própria membrana possuía, antes de se formar, fechar, uma certa quantidade de energia e informação encerradas pelas forças de união entre suas moléculas, ou átomos, se fosse deles constituída. Veja também que o sistema estava em equilíbrio dinâmico antes da chegada da substância D e continuou assim depois da presença de E. Em primeiro lugar, equilíbrio significava, em linhas simples, o conjunto de estados nas quais o sistema passava com respeito à reação de A com B, produção de C e sua posterior eliminação ou saída. Logo depois significou a reação de A com B, entrada de E, entrada de D, produção de C e posterior eliminação ou saída. Na realidade, esta seqüência encerra em si uma certa dose de arbitrariedade pois poderíamos, por exemplo, ter a entrada de D antes que E, vindo esta última, se não demorasse, a salvar o funcionamento do sistema. O nível funcional então aumentou e levou o sistema para outro ponto ou conjunto de estados na qual se estabeleceu novamente o equilíbrio. Vale notar que o equilíbrio significou a sobrevivência do sistema perante a presença de uma substância nociva já presente no meio circundante ou que apareceu devido a mudanças no meio ambiente.

Considere agora uma molécula intrometida a qual possui a capacidade de sintetizar outras moléculas. Ela e seus subprodutos poderão ou não, se ajustarem ao sistema. Muitas possibilidades podem ocorrer: fabricação de substâncias às quais aumentariam o nível funcional do sistema através de reações químicas ou acoplamentos, desintegração de parte do sistema com subsequente substituição de componentes, etc. Essa molécula poderia até ser capaz de formar, sem necessitar de um "hospedeiro", uma membrana e a partir daí começar um ciclo de "vida" autônomo. A idéia básica é o aumento do nível funcional, mesmo partindo de uma só molécula, quando tratamos de compostos orgânicos.

O nível funcional sistêmico revela se um sistema possui muita informação em uma pequena quantidade de matéria e energia, muita energia mas pouco transporte de matéria e processamento de informação, etc.

Nosso cérebro possui uma massa por volta de 1.300 gramas e uma potência elétrica de 25 watts, nem o suficiente para uma lâmpada iluminar um quarto ou um cômodo de uma casa. Mesmo se juntássemos vários processadores de computador até atingir essa massa e uma quantidade de energia elétrica bem maior, não conseguiríamos um processamento de informação tão refinado quanto a de nossa mente. A rapidez na realização de cálculos é maior até em computadores antigos, mas o nosso cérebro é capaz de proezas jamais alcançadas até agora por nenhuma máquina. Intuição, imaginação, raciocínio abstrato e em cima de conceitos, etc., fazem dele algo incomparável na tecnologia e na natureza. Sua atividade sistêmica é alta em informação, a maior que existe, devido a esses complexos mecanismos do pensamento. Digamos que o peso do processamento da informação neste caso é maior que a energia e a matéria. Um computador de dezenas de quilos e utilizando correntes elétricas capazes de eletrocutar uma pessoa não tem um nível funcional como o cerebral.

Esses sistemas celulares que venho descrevendo encerram reações químicas importantes à manutenção do conjunto, do sistema em si. O nível funcional aumenta com a entrada e acoplamento de moléculas, grupos de moléculas, possíveis reações, átomos ou íons, etc. Se o todo for levado a patamares de funcionamento onde existe equilíbrio, ele permanecerá como tal. É aí que acontece a passagem de níveis de organização da matéria onde também necessitamos da Química acima da Física, e da Biologia acima da Química, para estudarmos os fenômenos resultantes nesta escalada da natureza em organização.

Podemos pensar em nível funcional na retroação? Como vimos ela só existe se energia e informação estiverem presentes, em condições especiais, evidentemente. Ela nada mais é que um conjunto ininterrupto de transmissão de informação para o sistema se ajustar a um determinado fim. O sistema do êmbolo no recipiente com um determinado líquido, requer menos energia e informação que a do atirador usando sua visão, cérebro e músculos. A retroação, tão necessária à manutenção da vida pois ela mesmo se mantém devido a mecanismos de regulação e controle, se apresenta de muitas maneiras e quantidades nas engrenagens vitais e então podemos falar em nível funcional na retroação para qualquer ser vivo.






4 – Estatística






Ao ligar o rádio vem aos seus ouvidos aquela música em que estava pensando deixando-o perplexo: forças ou energias misteriosas atuaram em sua mente neste trabalho de previsão. Mas você já se esqueceu de quantas vezes ligou o aparelho pensando naquela música e não a encontrou imediatamente? Houve uma supervalorização daquele acerto a ponto de se pensar em forças ocultas. O homem não pensa estatisticamente!

Ao voltar de uma festa você está desesperado. Provou diversos pratos, bebeu bastante, tudo com um valor calórico o suficiente para deixá-lo preocupado com o regime que está fazendo. Mas se esqueceu dos meses anteriores nos quais cumpriu corretamente todas as regras estipuladas pelo seu médico, sendo que uma vez apenas saindo do regime, depois de tanto tempo, não irá prejudicá-lo. O homem não pensa estatisticamente!

Ao tentar a sorte em um jogo de loteria você invoca, até em momento não correto, na minha opinião em termos de religiosidade, todos os deuses, espíritos, santos, orixás, etc., e agradece a eles depois: sua vida mudou para melhor. Mas não questiona quantas milhões de apostas tiveram a mesma carga de invocações por detrás sem obterem êxito como você. O homem não pensa estatisticamente!

A Estatística é por definição um capítulo da Matemática na qual se analisam dados de uma população de seres; dados esses obtidos e organizados segundo determinados critérios, deduzindo-se padrões gerais de comportamento, tendências atuais, e fazendo-se previsões sobre como este conjunto se apresentará no futuro. Nessas previsões a probabilidade entra como fator fundamental de análise pois ela é quem nos dá, a partir dos dados coletados da população, uma medida quantitativa de quão provável uma determinada situação irá se repetir. Por exemplo, ao se notar que de cada cem crianças recém nascidas escolhidas sob certas condições, como a região onde os pais vivem, seus hábitos, etc., uma possui determinado defeito congênito, a probabilidade deste tipo de ocorrência para esta população será de cem para um. Deste modo, na média, a cada cem crianças recém nascidas, uma terá o problema. Talvez aparecerão duas simultaneamente com a imperfeição congênita após 198 terem nascidas com saúde, mas a média permanece. Média esta cada vez mais precisa quanto maior for o intervalo de tempo ou número de nascimentos observados. Se você se prender somente àqueles primeiros 198 nascimentos perfeitos achará que as leis estatísticas não possuem valor algum, mas, ao continuar observando os dados, já nos dois seguintes verá a média chegar ao valor cem para um. Vemos então que estatística está relacionada com tendências de situações ocorridas com populações ou conjunto de dados e não com um indivíduo específico. Melhor dizendo, você sabe que algo irá acontecer com a população, mas não poderá especificar com qual indivíduo será.

O método usado pela Estatística ao coletar dados para posterior análise consiste em observar um número pequeno ou menor de indivíduos em relação ao todo. É o chamado espaço amostral. Quantas vezes alguém estranhou o fato de um instituto de pesquisa só perguntar a algumas centenas ou milhares de pessoas sobre em quem votariam na próxima eleição? A população de um estado ou país é geralmente muito maior que isto. Uma resposta bem elucidativa a uma questão desta natureza, foi dada certa vez por um diretor de um desses institutos ao ser indagado por alguém não informado. Fora suficiente a ele tocar em outro fato relacionado a Estatística e muito comum em nossas vidas: nunca precisaríamos retirar todo nosso sangue para um laboratório analisá-lo! Bastaria uma amostra. Isto é o espaço amostral.

São notáveis quantas comparações podemos fazer em muitos pontos nos diversos ramos das ciências acerca do espaço amostral relacionado com distribuições de elementos em populações. Ao preparar uma mistura de água e açúcar, você não precisa, evidentemente, experimentar todo o produto para ver se acertou na quantidade do soluto; apenas algumas gotas são suficientes. O que realmente acontece é uma distribuição igualmente de concentração do açúcar em todo o recipiente. Seria improvável ele se concentrar na metade superior da mistura; ou na inferior. Isso quer dizer que os bilhões, ou mais, de moléculas se distribuem uniformemente por toda a mistura. Os votos de uma eleição também tendem a se distribuírem uniformemente pelo eleitorado e por isso pode-se usar o espaço amostral para se realizar pesquisas. Na verdade pode ocorrer algumas concentrações em determinados lugares ou conjunto de pessoas, mas em linhas gerais a distribuição é uniforme. Assim, o espaço amostral é extremamente útil na Estatística, e alguns critérios devem ser tomados a cada pesquisa. É a partir dele que se começa o estudo das variáveis de uma população de dados. Feito isso podemos, além de outros resultados, obter médias com respeito às variáveis em estudo e daí tirar conclusões sobre a população.

No terceiro parágrafo deste capítulo eu mencionei o jogo de loteria. Algo poderia estar errado se sempre saíssem os mesmos números em seu resultado ou se nunca ninguém ganhasse. Até aí podemos dizer que nós pensamos estatisticamente. O problema talvez não é com os extremos das situações de ocorrência mas sim com a média.

Certa vez um político tentou persuadir as pessoas pela televisão de que estavam erradas as pesquisas a respeito de sua posição nas intenções de voto. Ele se encontrava bem abaixo do primeiro colocado e isso, ele sabia, iria prejudica-lo, pois grande parte dos eleitores escolhem os primeiros de qualquer lista divulgada pelos meios de comunicação. Mostrou então uma família na qual pelo menos três indivíduos iriam votar nele dizendo que as pesquisas apontavam uma média de apenas um voto, um indivíduo por família, e então, pasmem, criticou a própria natureza da Estatística. Claro que existiriam pelo menos outras duas famílias onde ninguém iria dar o voto a esse político, permanecendo correta a média de intenções como os institutos competentes publicaram nos jornais. É o caso de distribuição com algumas concentrações isoladas. Ele conhecia Matemática e apostou na ignorância de muitas pessoas; tenho certeza que conseguiu muitos votos a partir daí, pois sua intenção era de quebrar em parte esse comportamento natural dos muitos eleitores indecisos, ou suscetíveis de serem influenciados pelas pesquisas nas eleições fazendo com que eles desconfiassem das realidades estatísticas. Felizmente não ganhou a eleição.

Esse exemplo mostra ao leitor apenas uma das muitas formas inescrupulosas de se manipular ou distorcer as verdades de fatos estatísticos. E esses fatos são coisas não muito bem conhecidas por todos e portanto fáceis de alguém tirar algum proveito.

Alguns políticos brasileiros teriam revelado à população que no ano corrente daquela época, diminuira o índice de desmatamento da floresta amazônica, assim como no anterior. Mas a verdade era que a média dos últimos seis anos era de crescimento... Houve uma flutuação momentânea dos dados nos quais aquele ano e o antecedente apresentaram uma queda no índice. Esses dados serviram de propaganda enganosa, pois nada garantiria um verdadeiro decréscimo no desmatamento a não ser um estudo cuidadoso na qual envolveria uma apuração sistemática nas médias entre vários períodos.

Os fenômenos estatísticos possuem um aspecto bem diferente daqueles chamados de determinísticos. O número de variáveis presentes é tão elevado que se torna impossível prevermos com certeza qualquer situação de ocorrência e por isso falamos em probabilidades. Nos fenômenos determinísticos o número dessas variáveis é bem menor. Imagine duas bolas de bilhar se chocando em uma mesa plana com um ângulo pré-determinado. Não será difícil, e isso requer algumas contas a partir de leis simples da Física, prever qual a trajetória posterior dessas duas bolas. Mas, se quisermos saber qual bola de loteria será sorteada, a partir de outras cem, enumeradas seqüencialmente e se chocando aleatoriamente dentro de uma gaiola suspensa com um orifício na sua porção inferior, teremos que apostar. Não há fórmula para se prever um fato desses com exatidão, pois o número de variáveis envolvidas é por demais numeroso, principalmente o número de choques dessas bolas por segundo.

Uma das mais simples leis da Física com respeito à sua expressão matemática, e ao mesmo tempo uma das mais abrangentes em termos de aplicações na teoria e na prática é a segunda lei de Newton da Mecânica. Força é o produto da massa de um corpo pela sua aceleração. Quanto maior a massa de determinado objeto maior será a dificuldade em acelerá-lo ou desacelerá-lo, sendo esta dificuldade, a força que usamos para tanto. Temos ainda que aumentar a força sobre um objeto se quisermos acelerá-lo ou diminuir a sua velocidade em intensidades cada vez maiores. Esta lei está presente desde na interação entre duas partículas como um próton e um elétron como nas engrenagens de uma máquina ou no movimento dos planetas ao redor do sol. Formulada por Newton em sua obra monumental de 1687, “Princípios Matemáticos da Filosofia Natural”, considerada por muitos a maior obra intelectual já realizada por um só homem, ela é acompanhada da lei da inércia, a primeira lei da Mecânica, e da lei da ação e reação, a terceira lei.

Na inércia, Newton diz que um corpo em movimento ou repouso, segundo um determinado referencial, permanecerá neste estado a menos que alguma força o faça mudar. O homem foi à lua, nossas pequenas sondas espaciais viajam por bilhões de quilômetros no espaço visitando os planetas do sistema solar, segundo este princípio. Basta desligar os foguetes que as impulsionam, quando atingem uma determinada velocidade desejada, para o movimento dessas naves não cessar pois não há atrito no espaço. Qualquer objeto aqui na Terra se comportaria da mesma forma se não houvesse o atrito a para-lo. Já a terceira lei nos diz que para qualquer ação, de um corpo a outro, vem acompanhada de uma reação de mesma direção e intensidade, mas de sentido oposto. O choque de dois automóveis provoca danos aos dois, embora um possa sofrer maiores perdas devido ao local da batida ou material de que é constituído. Enfim, se poderia escrever não um, mas diversos livros sobre essas leis, tamanho os resultados teóricos e práticos derivados desses três enunciados, que são leis fundamentais do universo na qual vivemos. Mas elas não conseguem, principalmente a segunda e a terceira, se aplicar ao movimento de bolas se chocando dentro da gaiola no sorteio da loteria.

Mais de noventa por cento das leis da Física, cabem, cada uma, em meia linha de uma página de caderno e mesmo assim conseguimos construir um mundo altamente tecnológico e avançado.

Teremos algum dia um conjunto de fórmulas para determinarmos os resultados de fenômenos estatísticos? Não sabemos. Mas a Estatística continuará a nos dar informações sobre tendências de opiniões públicas, previsões de doenças, número de produtos defeituosos por lote nas indústrias, etc. Ela veio exatamente para ajudar-nos quando as variáveis essenciais de qualquer fenômeno natural, ou populacional, eram por demais numerosas para nossas eficientes mas limitadas formulações matemáticas de nosso universo. E as coisas são desta maneira porque o próprio universo é estatístico; nós é que particularizamos alguns de seus fenômenos, tornando-os simples para podermos analisá-los como escolher o plano com apenas duas bolas a se chocarem com um ângulo já calculado e prever o sentido de seus movimentos após o choque. Aumentando-se em qualquer fenômeno natural o número de variáveis saímos do campo determinístico e caímos no probabilístico.

Uma questão crucial neste ponto é o fato de quem conhece a Estatística saber do poder de uma lei chamada de regularidade estatística. Se todos os correntistas de um banco fossem ao mesmo tempo retirar seu dinheiro, o banco, ou seu conjunto de agências, não o teria prontamente. Os banqueiros sabem disso e os engenheiros de tráfego sabem que, em nenhum momento, todas as pessoas sairão de carro de uma só vez. Isto acarretaria congestionamentos muito piores daqueles habitualmente noticiados nos telejornais. Eles projetam suas ruas e avenidas contando com esse fato. O mesmo aconteceu com as notícias do desmatamento. Os políticos sabiam que poucos esperariam por novos dados nos anos seguintes e, portanto, a cobrança não seria grande, mas garantiriam votos nas eleições do ano corrente; no mínimo uma boa propaganda.

Volto a salientar a ignorância ou comodismo das pessoas em não tentarem ver as coisas pelo ângulo da Estatística. Talvez seja, para muitos, uma atitude cética e feia não acreditar de imediato em certos fatos. Mas que fazer perante uma realidade na qual o tempo é um fator fundamental para sabermos sobre os destinos de um conjuntos de dados? Parece também igualmente feio para as pessoas aquela velha estória do “pagar para ver”. Tomando ainda como exemplo o desmatamento, que poucos conheciam aqueles políticos. Particularmente me parece muito sensato esperar para ver até onde eles estariam falando a verdade para depois dar o meu voto.

Não vejo nenhum empecilho em tomar atitudes céticas, pois estamos lidando com situações estatísticas onde os resultados não são imediatos. O fator tempo é de importância fundamental na compreensão dos fenômenos estatísticos. Nada garante que os dados de um determinado fenômeno ou situação permanecerão sempre na mesma média se for pequena a escala de tempo, tomada como base. E para uma situação tão complexa como o desmatamento da Amazônia, na qual temos que levar em consideração os interesses econômicos envolvidos, seu tamanho e o quanto já foi destruído de sua mata, as necessidades do país e do mundo em madeira, etc., não podemos em apenas dois anos avaliar o seu futuro no tocante a essas constantes e mal controladas ações destruidoras. Mesmo se o governo brasileiro tivesse tomado medidas para controle do desmatamento, resultando naquela flutuação de dados que os políticos não alertaram, a espera por resultados satisfatórios levaria mais algum tempo pois, para se inverter uma média, só tomando medidas sistemáticas. O exemplo dos bebês mostra muito bem este fato. A partir de diagnósticos corretos sobre as causas dos defeitos congênitos e de seu tratamento sistemático é que teríamos resultados.

No começo deste capítulo, eu, ao criticar como o homem não pensa estatisticamente, quis realmente dizer sobre essas médias quando as pessoas se deparam com ocorrências ligadas a populações. É difícil alguém parar para refletir se alguma vez tirou uma média de quantos acertos obteve ao encontrar uma música no rádio na qual estava pensando no momento de ligá-lo, pois assim veria um dos pontos importantes, dizendo agora de forma generalizada, do qual trata este capítulo: de tantas possibilidades, de tantas tentativas, não será difícil acontecer. Se nunca ocorresse, aí sim seria estranho.

Eu evitei até agora em falar da palavra que mais assusta as pessoas quando o assunto é a Estatística: o acaso. Ele é um conjunto de causas levando a um acontecimento no qual se desconhece as leis envolvidas. Aconteceu porque foi casual, sem nada que levasse a isso.

Mas para muitos ele não existe. Se algo acontece é porque existe uma razão para isto e esta razão deve vir de algo sobrenatural, de forças ocultas, etc. Falar em origem da vida a pessoas assim é como dizer que por acaso os seres terrestres surgiram. E não é bem assim; veremos que não foi por acaso e a falta de conhecimento sobre as coisas é que levam muita gente a pensar deste modo.

Para finalizar entro na questão da importância do tempo na ocorrência dos fenômenos estatísticos, que será fundamental esclarecer ao leitor como mais uma ferramenta à minha argumentação neste livro.

A probabilidade de sair o número quatro no lançamento de um dado é de um para seis(1/6). Isto porque das seis faces do dado apenas uma se posicionará para cima. Mas a probabilidade de sair o número quatro duas vezes seguidas é de (1/6)x6, ou 1/36, onde , na média, em trinta e seis lançamentos se conseguirá o número quatro saindo duas vezes, uma imediatamente após a outra. Imagine então se quisermos dez, vinte, trinta dessas ocorrências ou mais. Somente lançando esse dado muitas vezes. Demoraríamos muito mais para alcançar um resultado desses se os lançamentos forem realizados em intervalos cada vez mais longos. Se lançarmos trinta e seis dados quase que simultaneamente veríamos rapidamente o número quatro aparecendo duas vezes. Diminuímos o tempo entre as tentativas e o fenômeno teve sua ocorrência abreviada.

Assim, o objetivo principal é entender este caráter temporal de ocorrência dos fenômenos na medida em que se consegue um resultado desejado após uma enorme quantidade de tentativas. E o tempo para conseguirmos será tão menor quanto maior forem o número de tentativas realizadas em um período, também curto de tempo.






5 – Astronomia e Astrofísica






        A importância dessas ciências






Para começar eu pergunto do que é feito nossos corpos. Qual a sua constituição? Qualquer porção de matéria é constituída de alguma coisa e alguém poderia se precipitar: somos feitos de carne e osso! Expressão antiga, verdadeira até certo ponto, mas extremamente simplista. O homem atravessou milênios em sua história no planeta sem saber que, de tantas partes do corpo humano, cada qual diferente das outras, ossos, pulmões, coração, etc., se escondia uma organização precisa, complexa e hierárquica, mantenedora de sua própria vida.

Essa organização, em muitos níveis invisível aos nossos olhos, só nos pôde ser revelada após centenas de anos de investigações de disciplinas como a Medicina, a Biologia e a Química até que se chegou à descoberta dos tecidos, células, moléculas e átomos, os constituintes da engrenagem de nossa máquina vital. Isto não é uma volta ao primeiro capítulo e sim uma breve introdução para logo após o leitor tomar contato com os conhecimentos da Ciência que explicam de onde veio a matéria estrutural básica constituinte dos seres vivos.

Os átomos nos mostram um lado curioso nesta história, algo que nos faz refletir sobre uma aparente coincidência em termos de estrutura dos seres vivos, mas que, na verdade, é uma pista da explicação do porquê a estrutura vital é parecida em todos estes seres animados: dos noventa e dois elementos naturais, por volta de quarenta podem ocorrer nos seres vivos, mas dez estão presentes em todos eles. São eles o carbono, oxigênio, hidrogênio, nitrogênio, cálcio, fósforo, magnésio, potássio, sódio e enxofre. O corpo humano, para responder à pergunta do primeiro parágrafo, é constituído em massa seca, sem o oxigênio e o hidrogênio da água, de 50% de carbono, 20% de oxigênio, 10% de hidrogênio, 8,5% de nitrogênio, 4% de cálcio, 2,5% de fósforo, 1% de potássio e menos de um por cento de magnésio e enxofre. Entra ainda pouquíssimas quantidades de outros elementos como o ferro, o manganês e o iodo. Ele possui tecidos duros e esbranquiçados como os ossos, moles e avermelhados como os músculos, tem formações de células mortas como os nossos pelos e unhas, diferentes cores de peles para várias raças, diferentes cores de olhos e cabelos, órgãos de várias formas, funções e tamanhos, etc.

Os seres vivos possuem uma infinidade de conjuntos de formações que muito podem intrigar como tanta complexidade reúne-se em apenas um indivíduo. Eles próprios são um conjunto quase infinito de variedades de cores, formas, tamanhos, etc. E dá para se imaginar que tudo isso provém da reunião de uma dezena de variedades de átomos?

Poderíamos relacionar milhares e milhares de espécies viventes com respeito a estruturas particulares, semelhantes entre si como o fígado humano e o fígado de um bovino, ou não semelhantes como o caule de uma árvore e os ossos de um dinossauro, que chegaríamos, em última análise, a estes constituintes básicos presentes em todos eles. Seria ingenuidade se não atentássemos para esse fato, porque se algo, e esse algo representa toda a massa de seres vivos no planeta, é formado do mesmo substrato material, então de alguma forma esses componentes se uniram, e, a partir de níveis cada vez mais complexos em hierarquia e complexidade, deram início a uma longa jornada evolutiva que levou ao primeiro ser vivo na Terra.

Assim temos, inevitavelmente, a obrigação de olhar para essa base estrutural que compõe os corpos dos seres vivos, esses tijolos edificadores, os átomos, para depois compreendermos a formação de moléculas e substâncias presentes nos seres vivos. E para tanto devemos olhar para a escalada de conhecimentos da Astronomia e da Astrofísica.






O início





A observação sistemática de nosso céu remonta há mais de 15.000 anos. Os antigos observavam mudanças constantes na posição de certas estrelas que muito mais tarde se descobriu serem os planetas. Tentavam entender porque outras caíam em direção à Terra; eram os meteoritos. Ficavam fascinados ao ver objetos deixando rastros no céu como uma nuvem fina, esticada em relação à sua principal extremidade; eram os cometas. Dessa maneira nascia a Astronomia como a Ciência descritiva das posições e observações dos corpos celestes. Mas pode-se imaginar o quanto de registros astronômicos não chegaram até nós por diversos motivos, sendo um dos principais a ausência da escrita com relatos e desenhos em lugares apropriados como o papel, inventados muito tempo depois.

Mesmo nestas precárias condições de trabalho, digamos assim, muitos aproveitaram suas descobertas para melhorarem o sistema de vida de onde habitavam. No antigo Egito um astrônomo descobriu que pouco antes do rio Nilo ter as suas águas invadindo e destruindo plantações, a estrela Sírius, nem ainda batizada com esse nome, permanecia em determinada posição no céu. Ele contou quantas noites ou dias se passavam até as próximas enchentes. O número deu trezentos e sessenta e cinco; sim, a base de nosso calendário estava formada e os egípcios começaram a construir canais de irrigação a proteger as suas plantações e aproveitar as águas do Nilo em sua agricultura. E fora daí que encontraram pedras abaixo do solo e, durante milênios, aprenderam a trabalhar com elas para, com o passar do tempo, construírem moradias, templos e, finalmente... pirâmides. Sua civilização floresceu de tal maneira que até hoje se estuda seus costumes, sua história, sendo uma singela observação astronômica de um homem, que poderia talvez ter ficado anos e anos olhando para o céu noturno como apenas um excêntrico para quem o notasse, um dos determinantes da evolução dessa majestosa e antiga cultura.

Na China, por volta de 2.000 a.C., existiam escolas de astronomia desenvolvendo métodos de resoluções de problemas envolvendo posições do Sol e da Lua. O mesmo desenvolvimento ocorrera na Mesopotâmia onde os sacerdotes estudavam eclipses solares e lunares. Na Grécia, devido à racionalidade de seus filósofos, importantes idéias e descobertas ocorreram durante os últimos séculos a.C. Aristarco foi quem primeiro imaginou a Terra como um corpo girando em torno do Sol. Eratóstenes calculou o valor da circunferência terrestre em uma época na qual se pensava que o mundo era, geograficamente falando, apenas algumas terras em torno do Mediterrâneo. Mas foi Hiparco de Nicéia, quem mais se destacou ao calcular a distância da Terra à Lua e também por organizar catálogos envolvendo posições estelares. É considerado o maior astrônomo da Antigüidade e mesmo após o nascimento de Cristo a Grécia continuou a gerar cientistas dos céus que influenciaram o pensamento moderno até hoje.

Ptolomeu, em seu trabalho intitulado "Almagesto", já no segundo século d.C., posicionou a Terra no centro do universo e Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno, os planetas conhecidos até então, girando ao seu redor juntamente com o Sol e a Lua. Era o chamado modelo geocêntrico do sistema solar. Para ele as estrelas estavam fixadas em uma esfera transparente que girava em um dia em torno do eixo terrestre norte-sul. O Sol e os planetas percorriam pequenas órbitas, os epiciclos, cujos centros moviam-se através de linhas ao redor da Terra, as linhas deferentes. Aí estava lançada uma teoria a respeito do universo a qual permaneceria intacta por quase quinze séculos principalmente porque na Idade Média, com os seus rígidos preconceitos e valores baseados somente em conclusões obtidos da Bíblia, não deixaria a Astronomia, como as outras ciências, se desenvolverem plenamente com base na razão e na experimentação. Fora a conhecida "Idade das Trevas" para o pensamento racional e só a partir do Renascimento no século XVI as coisas puderam ter suas chances de mudar.

Em 1543, o astrônomo teuto-polonês Nicolau Copérnico publica o livro "Sobre a Revolução das Órbitas Celestes" no qual concebe um modelo do Sistema Solar colocando o Sol no centro de todos os planetas. Este modelo, denominado heliocêntrico, viria a ser reconhecido como aquele mais próximo da realidade, principalmente após o uso sistemático de uma invenção na qual a Astronomia ganharia um enorme impulso em seu desenvolvimento: o telescópio.

Fora o cientista italiano Galileu Galilei, no começo do século XVII, quem, dentre outras de suas valiosas contribuições à Ciência, fundou o método experimental na Astronomia ao utilizar o telescópio de maneira a observar e a registrar minuciosamente o que se via nos céus noturnos. Assim a Astronomia passou de uma Ciência praticada a olho nu à outra em que um instrumento científico trazia para mais próximo do observador aqueles objetos que há milênios eram admirados pelos homens. Ele defendeu a proposta de Copérnico e por isso fora julgado e condenado pela Inquisição à prisão domiciliar para o resto de sua vida. E ainda teve que se pronunciar perante o tribunal que era a Terra o centro do universo e não o Sol, pois senão seria condenado à morte. Conta-se de uma passagem sua após o pronunciamento no qual ele murmurou "no entanto ela se move", dizendo a respeito de suas crenças inabaláveis sobre a verdadeira estrutura do sistema solar.

O telescópio foi cada vez mais se aperfeiçoando e aumentando seu tamanho. Galileu usou o chamado telescópio refrator na qual dispunha apenas de lentes para as suas observações. Newton inventou o telescópio de reflexão introduzindo espelhos em seu interior para se obter melhores imagens dos astros. A Astronomia avançava graças a estes instrumentos sempre aperfeiçoados pelos cientistas mas uma revolução estaria por vir a partir da segunda metade século XIV e começo do século XX. Além do advento da fotografia começou-se a introduzir o espectroscópio para análise da luz emitida pelos corpos celestes. A presença deste instrumento na Astronomia aconteceu depois que diversos cientistas em todo o mundo começaram a realizar experiências com corpos aquecidos em laboratório. Uma porção de matéria quando aquecida a uma certa temperatura emite uma freqüência de radiação eletromagnética, sua cor, na qual se pode determinar, entre outras coisas, sua composição química. O elemento sódio, por exemplo, emite uma luz amarela intensa enquanto a cor da luz de compostos de estrôncio é vermelha. Desta maneira, o químico alemão Robert Bunsen, juntamente com o físico também alemão Gustav Kirchhoff, em 1860, descobriu o césio e, em 1861, o rubídio.

Para objetos como uma estrela ou qualquer outro emissor de ondas eletromagnéticas, obtém-se uma imagem batizada de espectro, no qual os comprimentos de onda presentes na radiação ficam ordenados em uma seqüência progressiva passível de uma análise minuciosa sobre os elementos constituintes do corpo. A luz do Sol, por exemplo, é decomposta nas conhecidas "sete cores do arco-íris", vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil e violeta, e, com isso, os cientistas passaram a estudar a sua composição. O astrônomo inglês Joseph Lockyer denominou de hélio a linha amarela no espectro solar a qual se achava pertencer ao hidrogênio. Este não emitia tal faixa e assim um novo elemento químico estava sendo descoberto. Só anos mais tarde o químico escocês William Ramsay descobriu o elemento hélio em nosso planeta confirmando a previsão de Lockyer.

Essas análises espectroscópicas ainda abrangem os objetos emissores de raios-X, raios gama, ondas de rádio, enfim, diversos comprimentos de onda espalhados pelo universo e que chegam até nós através do escuro e aparentemente vazio espaço sideral. Elas nos fornecem informações não só sobre a composição química dos astros mas também da temperatura, campo magnético, densidade e, o que é de grande valor aos cientistas, dos fenômenos físicos presentes nos interiores destes corpos celestes. Assim, pela primeira vez na história das ciências o homem pôde conhecer, utilizando instrumentos terrestres, o que ocorria dentro de estrelas, planetas, nebulosas, etc.; objetos estes localizados a bilhões, trilhões de quilômetros de distância ou mais, e que tanto foram contemplados a olho nu durante os milênios passados.

A Astrofísica surgiu para estudar este novo campo de conhecimentos que rapidamente começou a revelar muitos segredos sobre a constituição e origem de nosso universo. E o homem teve finalmente em suas mãos uma Ciência para diretamente relacionar fatos importantíssimos da Física com a Biologia no tocante aos assuntos que dizem respeito à origem da vida. Fatos estes sobre a base material da estrutura dos organismos vivos: os átomos e as moléculas.





Galáxias e estrelas






Em 1929, o astrônomo norte-americano Edwin Powell Hubble, descobriu que as galáxias se movimentam umas em relação às outras. Galáxias são enormes conglomerados estelares contendo centenas de bilhões de estrelas. Como Hubble descobriu? Através da análise espectral da luz das galáxias no batizado efeito Doppler. Uma onda eletromagnética como a luz tem, em seu espectro, uma cor azul predominante se ambos, objeto e observador estiverem aproximando-se entre si. Ao contrário, o registro espectral mostrará uma predominância da cor vermelha. Uma comparação para o leitor entender facilmente como o efeito Doppler se processa com as ondas eletromagnéticas seria dar um exemplo oriundo da mecânica, ou, mais precisamente, de ondas mecânicas, do estudo do movimento de partículas materiais. Ao avançar em direção às ondas em uma praia, você se encontrará com um maior número delas do que quando se afasta tomando o sentido do movimento das mesmas. O mesmo ocorre com qualquer tipo de onda eletromagnética.

Hubble verificou que as galáxias, em sua maioria, apresentam em seus espectros uma predominância para a cor vermelha a qual fora denominado de "desvio para o vermelho". Deduziu que elas se movimentam afastando-se continuamente entre si, e, ainda, tanto mais rapidamente quanto maior a distância uma da outra. Isto é realmente um fato muito curioso, pois elas não estão se deslocando aleatoriamente no espaço revelando um padrão no qual leva a uma conclusão completamente admissível em termos lógicos: outrora estavam todas juntas! Para entender como isto funciona, através de uma visão clássica sobre o assunto e mais uma vez com analogia aos fenômenos mecânicos, imagine a explosão de uma granada. Os estilhaços mais distantes do centro da explosão possuem velocidades maiores que os mais internos, em qualquer direção. Estilhaços vizinhos se afastam entre si pois se movimentam ao longo de retas que formam um certo ângulo medido a partir desse centro. É como dois automóveis em uma rodovia na qual, em dado momento, um deles toma outra estrada a partir de um entroncamento qualquer. Mesmo se o ângulo entre estas duas rodovias for pequeno, eles se afastarão entre si pois estão em caminhos divergentes. Portanto, em nosso universo, qualquer observador verá galáxias se afastando da sua, estando errado supor que vive no centro desta expansão, embora seja esta exatamente a sua impressão: galáxias vizinhas se afastam ou porque possuem velocidades menores, ficando cada vez mais para trás, ou velocidades maiores, se afastando continuamente para frente, ou porque, independente de suas velocidades, a distância aumenta devido à divergência de caminhos em que se encontram.

Uma explosão, como a da granada em nosso exemplo, dera início a esta configuração de posições e velocidades das galáxias observada atualmente nos telescópios do mundo inteiro. Este fora o que os cientistas batizaram de momento inicial de nascimento de nosso universo, citado por mim no primeiro capítulo, o Big Bang ou a grande explosão, tendo ocorrido há mais ou menos treze bilhões de anos. Embora esse valor possua algumas variações, indo até quinze e mesmo até dezoito ou vinte, sua ordem de grandeza está correta, situando-se na segunda dezena de bilhões de anos atrás. Existem hoje em dia teorias acerca do Big Bang mostrando um cenário um tanto diferente da maneira clássica de nosso exemplo mas que também corroboram com a idéia de expansão do universo. Uma dessas teorias, a do físico norte-americano Alan Guth, na década de 80, coloca a grande explosão como um inchaço de matéria e energia, chamado de cenário inflacionário, que com o tempo determinou o agrupamento de "ilhas" desse material do qual o universo se constituía, formando as nossas galáxias. Teorias deste tipo requerem um conhecimento aprofundado das partículas subatômicas e das forças interativas entre elas como as forças nucleares. Porém basta a nós a imagem de uma expansão de matéria em todas as direções.

Voltemos à nossa granada. Em uma foto tirada a qualquer instante após a sua explosão, notaríamos que seus estilhaços não guardam entre si a mesma distância. Claro, um grupo deles aqui pode manter uma distância média menor entre seus “componentes” que outro vizinho. Seria muito improvável termos todos os estilhaços guardando a mesma distância; uma configuração até quase que impossível em termos estatísticos.

Assim estava o universo em seus primeiros momentos de vida. Qualquer grupo de matéria, entre tantos, pôde ser levado a se aproximar continuamente devido aos efeitos da gravidade, se contraindo enquanto se afastava do ponto da explosão; e nessas contrações a matéria era levada por fim a se juntar formando estrelas e galáxias.

O Sistema Solar pertence à Via-Láctea, uma galáxia com mais de cem bilhões de estrelas. Calcula-se a extraordinária quantia de cem bilhões de galáxias em nosso universo e ainda sim este número não é definitivo pois novos pontos não estudados, estão sempre na mira de instrumentos cada vez mais sensíveis às radiações emitentes por estes gigantescos aglomerados estelares.

As galáxias podem ser divididas quanto às suas formas em espirais, irregulares e elípticas. O tipo espiral é a mais comum e geralmente possui dois braços em lados opostos ao núcleo. Uma concentração difusa, praticamente aleatória de estrelas dá origem às galáxias irregulares e, como o próprio nome indica, um agrupamento com formato elíptico corresponde ao terceiro tipo de galáxia mencionado. Muitas delas não se classificam nestas três categorias e podem levar o nome do astrônomo que as descobriu ou possuir uma designação baseada em um simples conjunto de letras. A Via-Láctea provavelmente tem o formato em espiral semelhante a um cata-vento com a maior parte das estrelas em seus braços que se dirigem ao seu brilhante núcleo. Pelo fato de estarmos em seu interior não podemos ter certeza de seu formato; na verdade estamos a uma distância de dois terços do comprimento do raio a partir do centro e, o Sistema Solar, percorre um longo caminho girando em volta desse centro completando uma volta em aproximadamente 200 milhões de anos!

As dimensões galáticas são algo realmente espantosas. Esse centro da Via-Láctea é um disco luminoso com um diâmetro aproximado de 100.000 anos-luz e com a espessura de 25 mil anoz-luz. Só para se ter uma idéia do que esses números representam, um ano-luz é a distância que a luz percorre em um ano viajando à incrível velocidade de 300.000 quilômetros por segundo. Isso corresponde a quase nove e meio trilhões de quilômetros!

A galáxia de Andrômeda é a mais próxima à nossa e pode ser visível, sob condições apropriadas, a olho nu. Possui cerca de quatrocentos bilhões de estrelas, é do tipo espiral e situa-se a mais ou menos 2,25 milhões de anos-luz; multiplique esse valor por 9,5 trilhões e terá a distância em quilômetros!

Você muitas vezes pode ter olhado ao céu e visto um pequeno ponto luminoso igual a uma estrela, sem saber que aquilo seria um conjunto de centenas de bilhões de corpos luminosos com tamanhos comparáveis ou maiores que o do nosso Sol. Andrômeda é muito estudada devido à sua proximidade; foi descrita pela primeira vez por Hubble na década de 20 e pertence ao agrupamento de galáxias, da qual também fazemos parte, denominado de Grupo Local. Sim, as galáxias também formam sistemas, grupos, e não são constituídas apenas por estrelas e também por gases e poeiras. A presença de gás e poeira nos interiores galáticos aparece em proporções diferentes para cada uma delas, sendo o hidrogênio muito fácil de ser reconhecido pelos radioastrônomos. Enfim, esses conglomerados de estrelas começaram a surgir logo depois do Big Bang e continua até hoje; além do mais podem ocorrer choques entre galáxias que se aproximam e mesmo Andrômeda, analisada pelo efeito Doppler, tem um desvio de sua luz para o azul indicando que se aproxima de nós.

As galáxias são reuniões de estrelas mantidas pela força gravitacional entre elas. É na formação das estrelas e nos fenômenos físicos em seus interiores que encontraremos as respostas necessárias ao objeto deste capítulo.

A matéria lançada ao espaço nas origens do universo era basicamente constituída de prótons, núcleos de hidrogênio por assim dizer, porque um átomo deste elemento químico contém apenas um próton no núcleo com um elétron orbitando ao seu redor. Conforme os núcleos de hidrogênio se uniam, mais e mais matéria se aglutinava devido à força da gravidade agindo nas vizinhanças desses pontos, gerando atrito e consequentemente calor, proporcionando o início das reações de fusão nuclear. A fusão nuclear depende de temperaturas elevadíssimas para se processar e aí começa a vida de uma estrela. Dentro delas os núcleos de hidrogênio se fundem formando núcleos de hélio, liberando energia na forma de neutrinos, partículas de massa quase zero e sem carga elétrica. São liberados também os raios cósmicos que são também prótons, núcleos de hidrogênio ou algum elemento mais pesado com altas velocidades e portadores de carga elétrica. Por último, como não poderia ser de outra maneira porque se não fosse assim não enxergaríamos nenhuma estrela, há uma descarga violenta de fótons de luz. Essas emissões de fótons abrangem o espectro eletromagnético indo dos energéticos raios gama até as ondas de rádio. As reações desta natureza são chamadas de fusão nuclear porque há uma união de núcleos de átomos para formarem outros, sendo que as bombas nucleares de fusão ou de hidrogênio possuem o mesmo princípio, liberando rapidamente energia com fins de explosão e, portanto, com fins militares. Nas também famosas bombas atômicas ocorrem fissões ou quebras de núcleos de átomos com posterior liberação de energia na forma de calor, raios gama, núcleos de hélio, etc. Praticamente uma é o inverso da outra, com algumas diferenças no tocante às radiações emitidas e pelo fato de que a bomba de fusão é muito mais violenta. Para se ter uma noção dessa violência, basta dizer que a bomba atômica ou de fissão é usada como estopim para se produzir as temperaturas necessárias de ignição da bomba de hidrogênio.

Se as estrelas necessitam das reações de fusão para existirem, o nosso Sol não fuge a esta regra. Em seu núcleo, a uma temperatura perto de 15.000.000 de graus centígrados, a fusão converte cerca de 600.000.000.000 de toneladas de hidrogênio em cerca de 595.800.000.000 em hélio por segundo. Essa perda de matéria, 4.200.000.000 de toneladas, é convertida nas radiações já descritas no parágrafo anterior. Essas fantásticas cifras explicam o porquê do brilho de uma estrela ser tão espantoso.

Elas na verdade, são corpos gasosos como também são os grandes planetas de nosso sistema solar, Saturno, Júpiter, Urano e Netuno. O Sol tem uma densidade média de 1,41 g/cm3, bem maior que os gases daqui da Terra mas parecida com a densidade média desses planetas. Mas porque ele é considerado gasoso? O gás mais denso conhecido possui uma densidade de apenas um centésimo desse valor 1,41 g/cm3. Devido à enorme pressão gravitacional no interior do Sol, os átomos são esmagados entre si e os elétrons perdem suas órbitas regulares. Os núcleos atômicos conseguem mais espaço e começam a se movimentar e até chocar entre si; a matéria entra em um estado diferente de tudo que conhecemos, na qual sua densidade é elevada mas suas partículas permanecem em um contínuo movimento rápido e desordenado como em um gás. Muitos estudos revelam que nesse estado a matéria se comporta como um gás, tendo muitas de suas propriedades e por isto as estrelas são realmente consideradas como gasosas. Nos núcleos dos planetas como Saturno, a densidade chega a ser maior que em suas camadas exteriores, mas não há força da gravidade suficiente para uma ruptura de seus átomos como acontece em uma estrela.

Mesmo o Sol, com um diâmetro de 139.200.000 de quilômetros, quase cento e dez vezes maior que o diâmetro médio da Terra, é considerado uma estrela de quinta grandeza, bem menor que as de primeira grandeza.

Esta denominação de quinta grandeza pertence a uma classificação feita pelos cientistas. Ocorre que quanto maior é a massa de uma estrela maior fora, evidentemente, a massa na qual sua ignição tivera início. Portanto, maior é a sua temperatura interior e, também, a sua luminosidade. Essa relação direta da massa com a luminosidade foi proposta pela primeira vez pelo astrônomo inglês Arthur Stanley Eddington e recebeu o nome de lei da massa-luminosidade. As estrelas obedecem rigorosamente a esta regra e, desde as mais quentes até as mais frias, seus espectros apresentam traços característicos, as raias, nas quais seus formatos e cores nos informam o quão luminosas elas são. Os cientistas classificaram as estrelas de acordo com o que chamaram de classes espectrais, em uma seqüência de letras, O, B, A, F, G, K, M, R, N e S, nesta ordem, respectivamente, para a grandeza de suas massas e luminosidade; e dividiram cada uma em dez subclasses enumeradas de 0 a 9. Por exemplo, uma estrela K0 possui maior massa e luminosidade que uma K3, mas seu brilho não é maior que qualquer uma da classe G ou anterior. Esta seqüência de classes é denominada de seqüência principal, onde abrange 90% das estrelas conhecidas, sendo as outras 10% estrelas nada comuns que mencionarei mais adiante. O Sol pertence à classe espectral G2, uma estrela de tamanho médio. Estrelas de primeira grandeza, da classe O e suas subclasses, chegam a possuir uma massa de dezenas de vezes a do Sol e ter uma luminosidade 6.000.000 de vezes maior.

Dentro dessa classificação espectral podemos ir mais longe e relacionar a temperatura com a cor destes astros. A classe O apresenta estrelas azuis com temperaturas superficiais de 25.000 a 40.000oC. Indo em direção da classe F as estrelas vão se tornando brancas e atingindo temperaturas de 6.000 a 7.500 oC enquanto que o Sol, com sua superfície a quase 6.000oC, é amarela. Na classe K elas apresentam uma coloração alaranjada a 3.500 a 5.000oC e, por fim, de 3.000 a 3.500oC estão aquelas mais frias e de cor vermelha.

Se olharmos toda noite atentamente o céu, nos parecerá que ele sempre se apresenta do mesmo modo, com as estrelas sempre no mesmo local como da última vez. Na realidade elas estão se movendo a velocidades altíssimas pois, não esqueçamos, o Big Bang arremessou toda a matéria do universo em uma fantástica explosão, como já disse, há treze bilhões de anos aproximadamente. Mas as estrelas às quais estamos acostumados a embelezar nosso céu, estão longe demais da Terra para que seus movimentos sejam notados.

Outra impressão errônea diz respeito aos seus tamanhos. Os quatro corpos mais brilhantes que nos apresenta o nosso céu são o Sol, a Lua, o planeta Vênus e a estrela Sirius. Mas esta última se situa a nada menos que 8,8 anos-luz de nosso sistema solar e possui um diâmetro quase duas vezes o do Sol e irradia 35 vezes mais energia que ele. Ainda tão ou mais intrigante é o fato de vermos os brilhos estelares como eles eram a milhões ou bilhões de anos atrás. Sim, porque, como a distância é muito grande, mesmo a luz viajando rapidamente até nós, ela demora muito tempo para vencer toda a distância que separa essas estrelas de nosso planeta.

O Sol está a 150.000.000 de quilômetros da Terra; no momento em que ele emite um raio de luz este demora por volta de oito minutos para chegar por aqui. Assim nós o estamos vendo como ele "era" há oito minutos atrás. A estrela mais próxima da Terra se chama Próxima Centauri e está localizada a quatro anos-luz de distância ou aproximadamente 40 trilhões de quilômetros. Sua luz leva, portanto, quatro anos para chegar aqui. Nós a vemos como era há quatro anos. Objetos situados a dezenas de bilhões de anos-luz já foram detectados pelos cientistas proporcionando informações de como era o nosso universo naquele tempo. Deste modo todo o nosso céu "pertence" ao passado e o que vemos nele já aconteceu, então, há centenas, milhares, e até bilhões de anos atrás.

Quando da contração da matéria que forma uma estrela, a força gravitacional aglutinadora fica contrabalanceada pela energia gerada pela fusão no sentido oposto. A matéria em contração tem um limite para obedecer. Lembramos que a força gravitacional sempre está agindo onde exista qualquer concentração de matéria no sentido de reunião, de agrupar elementos, sejam eles quais forem. Um fato a mencionar, diz respeito à diferença fundamental entre estrelas e planetas. A estrela, por possuir massa bem maior que um planeta, gera uma maior quantidade de calor por atrito durante a sua formação, conseguindo assim iniciar as reações de fusão nuclear responsáveis pela sua luminosidade. Elas possuem luz própria, são incandescentes. A Terra, como os outros planetas, e também satélites como a Lua, apenas refletem a luz solar. Há uma ressalva para Júpiter porque ele reflete aparentemente mais luz do que recebe. Este paradoxo, dizem alguns cientistas, pode ser resolvido se conseguirmos confirmar uma hipótese que ele, o maior planeta do sistema solar, teve uma temperatura interior suficiente para desencadear reações de fusão, ainda que não tão violentas como em uma estrela típica. Júpiter situa-se, provavelmente, com respeito às definições correntes, como um objeto intermediário entre estrela e planeta.

A fusão nuclear, então, mantém uma estrela irradiando energia ao espaço e conforme o tempo vai passando o hélio acumulado em seu interior, ao chegar em um ponto crítico em termos de quantidade, se funde formando núcleos de elementos ainda mais pesados com conseqüente liberação de energia. Dessa maneira são produzidos o carbono, o nitrogênio, o oxigênio, etc. Sim, os átomos de nossos corpos foram produzidos nos interiores de estrelas há bilhões de anos mas algo tinha que acontecer para expulsá-los pois senão nenhum de nós estaria por aqui!






Corpos excêntricos






Neste momento das reações nucleares de uma estrela onde se tem a fusão de átomos de hélio, a pressão de dentro para fora faz com que ela se expanda até chegar a um estágio denominado de gigante vermelha. Rompe-se o equilíbrio gravitacional-fusão nuclear e ela literalmente aumenta de volume.

Gigantes vermelhas ocorrem muitas vezes em nosso universo e o Sol, daqui a aproximadamente cinco bilhões de anos atingirá este ponto. A expansão levará sua superfície até Mercúrio, a uma distância média de 58.000.000 de quilômetros de seu centro, ou até mesmo Vênus. A temperatura aqui na Terra passará de 100oC, onde o destino do homem do futuro estará ameaçado a não ser que se mude para outros mundos. Mas, como todo combustível tem o seu término, a fusão nuclear em uma gigante vermelha chegará próxima de seu fim e a força da gravidade suplantará qualquer pressão ainda existente no interior da estrela. Ela diminuirá de tamanho até formar o que os cientistas chamam de anã branca, um objeto pálido e pequeno, onde seu limite de tamanho é determinado pelo contato das eletrosferas, a região espacial dos átomos onde os elétrons giram ao redor do núcleo, e que não se deixam interpenetrarem devido à imensa repulsão eletromagnética; força mais forte que a gravitacional. A grande estrela vermelha chega a decrescer em até 20.000 vezes de volume e sua luminosidade é de 1.000 a 10.000 vezes menor que a luminosidade das estrelas médias. Sua densidade no núcleo pode chegar a 100.000 kg/cm3; imagine um pequeno cubo de um centímetro de aresta possuir uma massa de 100.000 kg ou 100 toneladas!

Sirius B, uma anã branca componente de um par de estrelas, um binário, juntamente com a sua companheira batizada de Sirius A, outrora possuía massa e volume quase igual a do Sol. O raio solar é de 700.000 quilômetros, enquanto Sirius B possui um raio de aproximadamente 25.000 quilômetros.

Muitas anãs brancas foram detectadas daqui da Terra e mesmo elas perderão continuamente o pouco de energia que ainda resta em seus interiores para se tornarem escuras e frias. Neste estágio elas são denominadas de anãs negras e possuirão temperaturas pouco acima do zero absoluto que é de -273oC. O Sol chegará um dia, daqui a uns cinqüenta bilhões de anos, a deixar o estágio de gigante vermelha para se contrair e se transformar em uma inexpressiva anã branca. Presume-se que a superfície terrestre estará a 200oC negativos neste futuro sombrio e gelado de nosso sistema solar!

Anãs brancas formam-se a partir de estrelas com massas de até 1,4 vezes a do Sol após passarem pelo estágio de gigante vermelha. Este possui uma quantidade de matéria da ordem de dois quatrilhões de trilhões de toneladas, pouco mais de 330.000 vezes a massa da Terra que é da ordem de seis bilhões de trilhões de toneladas. As estrelas com massa entre 1,4 e 3,2 vezes a do Sol possuem um campo gravitacional suficiente para esmagar os átomos comprimidos de seus interiores onde suas órbitas eletrônicas estão em contato. Mas desta vez, ao contrário do interior do Sol, os elétrons são forçados para dentro dos núcleos atômicos e, a partir disto, se combinam com os prótons até formarem nêutrons. Como o número de prótons é quase igual ao de elétrons surgirá então dessas reações um objeto predominantemente, mas não por completo, composto de nêutrons denominado de estrela de nêutrons. Seu diâmetro é reduzido a 100.000 vezes do tamanho original e se a Terra fosse convertida em um corpo desse, sem perder sua massa, ela teria aproximadamente só 130 metros de diâmetro. Se a densidade nuclear de uma anã branca assusta a qualquer um, a de nêutrons atinge números fantásticos da ordem de 1,5 bilhões de toneladas por centímetro cúbico!

Como a matéria consegue chegar a este ponto? Faz-se necessário explicar aqui certos fatos para o leitor ter uma noção de como isto é possível. Um átomo possui um núcleo com elétrons girando ao seu redor. Até aí não é novidade para ninguém. O tamanho total do átomo, seu diâmetro, é cerca de 100.000 vezes maior que o tamanho de seu núcleo ou, seu raio, 50.000 vezes maior pois o raio tem a metade do diâmetro. Então ele é simplesmente constituído na sua maior parte de vazio! Se o núcleo de um átomo tivesse um centímetro de diâmetro os elétrons estariam girando a uma distância de 50.000 centímetros ou 500 metros de seu núcleo. E se conseguirmos colocar todos os elétrons encostados no núcleo do próprio átomo? O diâmetro decresceria 100.000 vezes mas a sua massa continuaria a mesma.

Nós somos constituídos de átomos; por isso uma pessoa de 80 kg seria reduzida a um tamanho menor que um grão de poeira, mas continuaria com a mesma massa. Nossos corpos são também constituídos em sua maior parte de vazio, mas não percebemos por apenas uma questão dos limites de nossos sentidos.

Estrelas de nêutrons foram previstas teoricamente nas décadas de 30 e 40 mas o grande problema era detectá-las porque seus diâmetros seriam da ordem de poucas dezenas de quilômetros e, mesmo com uma temperatura superficial altíssima, perto de 10.000.000 oC, as distâncias em que se encontravam da Terra poderiam ser muito grandes. Mas como eu já afirmei aqui, nosso século foi marcante, entre tantos desenvolvimentos tecnológicos, no aperfeiçoamento das análises das radiações eletromagnéticas provenientes do espaço. Na década de 60 foram detectadas emissões fortíssimas de microondas vindas de uma direção específica no céu, mas com uma peculiaridade jamais conhecida pelos cientistas: uma emissão pulsante regular, precisa, com uma pulsação a cada 1,34 segundos. O emissor dessas radiações teve o nome de pulsar e até agora mais de uma centena deles já foram descobertos e acredita-se na existência de centenas de milhares somente em nossa galáxia. O período de pulsação varia de um objeto para outro e os cientistas puseram-se a trabalhar no intuito de descobrir o porquê dessas emissões tão regulares de radiações.

Uma estrela de nêutrons contém uma certa quantidade de elétrons e prótons que não se combinaram por ocasião da contração estelar e por isto possui campo magnético. Ele é bem intenso devido ao próprio tamanho reduzido desse tipo de estrela. Os elétrons são arremessados para fora dela pelos pólos magnéticos, os únicos lugares permitidos porque é onde há uma neutralização das forças eletromagnéticas. Devido ao campo magnético e a força gravitacional da estrela eles descrevam uma curva mas voltam em seguida e perdem energia na forma de microondas. Assim, como no caso de um esguicho rotativo de água, a estrela periodicamente emite radiação para a Terra. Esta é uma teoria aceita hoje em dia na qual então os pulsares são as estrelas de nêutrons previstas em teoria há décadas atrás.

As estrelas de nêutrons formam-se a partir de estrelas com massas, entre 1,4 e 3,2 a massa do Sol. E para estrelas maiores? O arrasto gravitacional pode ser suficiente para que os nêutrons não aguentem tamanha força e a estrela continuaria a se contrair até um volume infinitesimal. Não há reações físicas ou químicas, com conseqüente liberação de energia, a contrabalançar essa tremenda força gravitacional que irá comprimir os nêutrons até a estágios inconcebíveis de densidade. A partir disto chegamos em um dos corpos mais misteriosos e ao mesmo tempo mais espetaculares do universo: os buracos negros. Negros porque a luz não escapa de dentro deles devido à gravidade; e buraco porque a sua massa irá atrair constantemente quaisquer outros objetos ao seu redor. São objetos oriundos de estrelas de massas tão grandes que atraem facilmente sistemas solares inteiros, nuvens de gás dispersas no espaço, aglomerados estelares, etc. Deste modo, há um aumento de sua massa pelo qual ele fica mais poderoso com capacidade de atrair outros corpos mais distantes. Existem teorias as quais predizem que o universo inteiro pode um dia terminar em um imenso buraco negro! Mas este assunto foge ao propósito deste livro.

Um corpo atraído por um buraco negro será simplesmente despedaçado pela enorme força gravitacional a qual será submetido e, pelo chamado efeito de maré, ele ganhará calor e emitirá uma enorme quantidade de raios-X. O efeito de maré consiste em um "esticamento" de determinado objeto, pela diferença da gravidade entre a porção mais próxima e a mais distante do corpo que o está atraindo. A força da gravidade atua com maior intensidade quanto maior for a proximidade dos corpos envolvidos. Nós estamos submetidos aqui na Terra a uma maior gravidade em nossos pés que em nossas cabeças, mas a nossa altura não é tão grande a fim de que essa diferença de forças seja percebida. A própria massa do planeta também não permite tamanha diferença. Mas com objetos de proporções imensas como os estelares e nas vizinhas de um fortíssimo campo gravitacional as coisas realmente são outras. A matéria nesses lugares será como se estivesse sendo rasgada e com isso emitirá raios-X pelo calor que produzirão.

Encontrar um buraco negro no espaço não é fácil porque ele não emite luz, mas é só os cientistas se concentrarem nos locais do universo onde as emissões de raios-X possuem uma atividade incomum. Foi na década de 60, a partir de observações realizadas em foguetes, que na constelação do Cisne se descobriu uma fonte de raios-X a qual recebeu o nome de Cisne X-1. Mais tarde verificou-se que Cisne X-1 é um sistema composto de uma estrela e um invólucro gasoso ao seu lado onde possivelmente um buraco negro esteja sugando este material o qual emite raios-X.







Expulsão







Um fenômeno raro de acontecer, o qual provavelmente o leitor jamais presenciou, é uma estrela repentinamente aparecer no céu. Com os telescópios os cientistas já observaram estrelas invisíveis a olho nu aumentando de brilho, em dias ou semanas, para depois, em até meses, empalidecerem. Evidentemente, após a invenção do telescópio foi mais fácil se notar algum acontecimento deste tipo. Muitas estrelas aumentam de brilho de uma hora para outra mas como estão situadas a enormes distâncias de nós seria necessário o uso do telescópio para realmente notarmos um fenômeno assim. Estas estrelas são as novas, designação proveniente do título de um livro, “A Respeito da Estrela Nova”, do astrônomo dinamarquês Ticho Brahe, onde ele descreveu uma aparição repentina de uma estrela na constelação Cassiopéia, em 1572. Mesmo de dia essa nova podia ser vista; seu brilho era por volta de cinco a dez vezes maior que Vênus e, se não havia Lua no céu, ela conseguia formar sombra, embora fraca e à noite, nos objetos aqui na Terra. Cerca de vinte a trinta novas ocorrem em nossa galáxia a cada ano. Hiparco de Nicéia preparou seu mapa estelar após uma aparição de uma nova em 134 a.C. só para identificar qualquer estrela que porventura surgisse no céu. Trata-se mesmo de algo impressionante, algo nada comum pois a nossa impressão do céu e das estrelas é de imutabilidade, permanência e jamais alguém desconfiaria que além dessas poucas modificações percebidas ao longo dos séculos, estariam fenômenos dos mais incríveis e inimagináveis para a mente humana.

As novas são estrelas duplas, uma anã branca e outra comum. Esta segunda ao chegar no estágio de gigante vermelha perde massa na forma de gás para sua companheira menor. Esta desencadeia rapidamente reações de fusão nuclear, explodindo e lançando gás a temperaturas altíssimas ao espaço, aumentando temporariamente seu brilho. Mas acontece que a estrela de Hiparco não era na verdade uma nova típica. Ela aumentara de luminosidade em grau muito maior que as novas comuns, e isso Hiparco nunca poderia saber pois sua época era escassa em tecnologia e conhecimentos. A nova de Ticho, como outras catalogadas nos anos de 1006, 1054 e 1604 dC., haviam aumentado de luminosidade em dezenas de milhares de vezes que uma nova típica e, em 1885, na galáxia de Andrômeda, se descobriu uma nova que havia aumentado em 100.000 vezes seu brilho original. Deste fato apareceu o termo supernova. São estrelas com massa de até 50 ou 60 vezes a de nosso Sol com uma temperatura interna atingindo cinco bilhões de graus centígrados, que possibilitam o acontecimento de fenômenos nada comuns para as estrelas mais leves. Em determinadas situações a produção de neutrinos é muito elevada e estes, por possuírem massa bem pequena, escapam rapidamente do núcleo da estrela tornando-o mais frio em pouquíssimo tempo. Neste instante há um desequilíbrio momentâneo entre as pressões de dentro para fora e de fora para dentro, levando a matéria circundante ao núcleo se aproximar com uma força suficientemente poderosa para desencadear violentas reações de fusão que levarão por fim a uma explosão da estrela. Ela chega a perder 95% de sua massa original enquanto que uma nova não arremessa grandes quantidades de matéria ao espaço.







A matéria primeva







A Astrofísica revela uma face surpreendente mas não menos excêntrica da realidade de nosso universo. Anãs brancas, gigantes vermelhas, estrelas de nêutrons, buracos negros, novas e supernovas são alguns dos objetos mais estranhos que o universo possui. Neles, a matéria e a energia se apresentam em uma forma diferente da qual estamos acostumados com o que vemos aqui na Terra, razão pela qual eles são realmente corpos excêntricos. O Sol irradia energia e, em comparação com objetos a temperaturas elevadas em nosso dia a dia, qualquer um poderia supor que haveria uma época na qual ele cessaria de brilhar por esgotar a sua fonte de combustível. Mas quem imaginaria um aumento de tamanho nas proporções de uma gigante vermelha, terminando com a vida aqui na Terra, para depois se transformar em uma pálida e pequena anã branca? Como seria possível um fenômeno destes? Que objeto terrestre, ao perder imensas quantidades de energia continuamente, incha em tamanho de uma hora para outra, modifica a sua cor, e depois decresce com uma coloração diferente das anteriores? As pessoas mal sabem da designação gigante vermelha... E o que falar de explosões de estrelas as quais atingem um brilho de galáxias inteiras? E os buracos negros? Existe coisa mais fantástica que um "nada" atraindo estrelas para seu interior onde a densidade de matéria em seu centro encontra-se em uma densidade quase infinita?

O século XX foi um período da história da Ciência onde o homem se deparou com problemas surgidos da sua própria investigação, a partir de teorias e da tecnologia por ele criada, do universo "infinitamente grande" e do "infinitamente pequeno". Criou a Astrofísica e a Mecânica Quântica para estudar muitos desses problemas aparentemente insolúveis ao seu intelecto. Talvez ele achasse que fenômenos estelares ou atômicos poderiam corresponder àqueles aos quais estivessem presentes em sua vida cotidiana não fugindo ao seu senso comum de analisar as coisas. Einstein disse certa vez que "o senso comum são aqueles preconceitos adquiridos antes de completarmos 18 anos de idade". Ele se referia basicamente às dificuldades que a sua Teoria da Relatividade teve para ser compreendida.

Nosso universo "infinitamente grande" possui fenômenos macroscópicos regidos pelas leis do universo "infinitamente pequeno" onde as reações nucleares de fusão são em grande parte responsáveis pelos eventos cataclísmicos que descrevi neste capítulo. São eventos realmente fora do comum.

A vida é uma obra sublime de engenhosidade. Talvez as etapas vencidas na formação de sua matéria prima nunca poderiam ocorrer a partir de fenômenos comuns. E, se dentro do ciclo de vida de uma estrela, ocorre o nascimento dos átomos principais constituintes de nossos corpos, é a partir de um daqueles objetos estranhos, as supernovas, que esses átomos são expulsos ao espaço exterior para a vida, em algum lugar do universo, florescer em esplendor e abundância.

Estrelas de primeira geração é o nome dado àquelas onde são constituídas pela matéria inicial que sobreveio com o Big Bang: prótons, núcleos de hidrogênio. Uma supernova já passou por estágios onde núcleos bem mais pesados que os de hidrogênio e hélio foram produzidos e, com a sua explosão, a enorme quantidade de matéria por ela jorrada contém, além desses núcleos leves, núcleos de carbono, neônio, oxigênio, nitrogênio, etc.

Com restos de supernovas formam-se as estrelas de segunda geração, onde, há cinco bilhões de anos nosso Sol se formou. À sua volta, em um aglomerado de gás e poeira, a Terra nasceu há aproximadamente quatro e meio bilhões de anos. Existem algumas dúvidas quanto ao modo pelo qual um sistema como o Solar é concebido. A Terra seria "capturada" em sua órbita atual logo após de ter sido formada? Ou de um mesmo aglomerado de matéria o Sistema Solar se formou? A primeira pergunta parece não agradar aos cientistas. A segunda pertence a uma idéia corrente, de aceite perante a comunidade científica, na qual os planetas estavam se constituindo à parte enquanto o Sol se formava no centro dessa concentração de matéria. Eles se separaram do resto da nuvem de poeira e gás para constituírem pontos isolados de concentração de matéria.

Noventa por cento de toda a massa do Sistema Solar se concentrou no centro da nuvem de gás e poeira formando o Sol. Ele, por possuir maior massa, segurava uma quantidade maior de elementos leves como o hidrogênio que os planetas. Isto parece uma contradição: porque os planetas mantiveram em maior quantidade os elementos com mais massa? A força da gravidade entre dois corpos depende da massa conjunta de ambos; multiplica-se uma pela outra e o resultado é ainda multiplicado por um número, uma constante universal. Tudo isto é ainda dividido pela distância ao quadrado que os corpos mantém entre si. Este é o princípio da lei da gravidade formulada em 1687 por Newton. Nota-se que devido ao fato de multiplicarmos as massas dos corpos, a força gravitacional será maior para o conjunto que apresentar a maior massa total. Então o Sol e os elementos químicos leves irão se atrair com maior intensidade do que qualquer planeta com esses mesmos elementos.

Venho falando neste capítulo sobre a gravidade e a sua importância nos acontecimentos a respeito dos corpos estelares que determinaram o aparecimento dos elementos químicos indispensáveis ao surgimento da vida na Terra. São quatro as forças conhecidas no universo: a nuclear forte, a nuclear fraca, a eletromagnética e a gravitacional. A força nuclear forte é a responsável pelo agrupamento e coesão dos prótons no núcleo atômico. Eles possuem carga elétrica positiva e se repelem mutuamente devido à força eletromagnética mas não se afastam entre si porque a força nuclear é muito mais forte e por isso mantém esses prótons unidos. Não fosse ela não existiria núcleos atômicos, e consequentemente átomos, moléculas, enfim, toda a matéria que conhecemos. Sob certas condições ela deixa de atuar e alguns prótons e neutrôns são expelidos do núcleo liberando energia; é a radioatividade. A força nuclear fraca está ligada a certos fenômenos de decaimento radiativo nas reações nucleares e mesmo sendo mais fraca que a sua companheira nuclear, é muito mais poderosa que a eletromagnética. Esta última é bem conhecida: aparece nos ímãs, faz uma bússola apontar nos pólos magnéticos terrestres, movimenta motores elétricos, etc. A força gravitacional é a mais fraca de todas mas determina, como o leitor já verificou, muitos processos e fenômenos astrofísicos devido ao fato do universo possuir objetos de massa suficientemente grandes. Só desta maneira que a gravidade faz-se notar frente às outras forças naturais.

Os átomos constituintes dos futuros seres vivos já haviam sido formados quando a matéria do Sistema Solar dava os primeiros passos na direção da Terra. Ao mesmo tempo em que ela se formava esses átomos iam se combinando em estruturas mais complexas, como certas moléculas.

A Astronomia e a Astrofísica chegam ao seu final. Do Big Bang à Terra se passaram aproximadamente nove e meio bilhões de anos e nesta etapa da história de nosso planeta, a vida ainda teria que aguardar o seu momento de criação.





Os compostos orgânicos






O começo da Terra fora algo nebuloso e turbulento. Sua massa ainda estava como átomos isolados e pequenos grãos de poeira quando, pela ação da gravidade, ela começou a se concentrar em um determinado centro, se aquecendo por atrito. Quatro átomos de hidrogênio se ligavam a um carbono para formar metano. Um átomo de hidrogênio se ligava a outro semelhante formando o gás hidrogênio; oxigênio se combinava a dois átomos de hidrogênio formando água e como o metano e o gás hidrogênio ela permanecia como molécula separada sem formar outras moléculas mais complexas. Oxigênio se combinava com oxigênio resultando em uma molécula de gás. Uma molécula dupla como o gás hidrogênio. Um átomo de nitrogênio formava amônia ao se ligar a três átomos de hidrogênio permanecendo sem reagir com outros elementos.

Os átomos de silício combinando com oxigênio formaram os silicatos, onde estes, ao prosseguirem reagindo com potássio, sódio, magnésio, alumínio, etc., todos oriundos também de explosões de supernovas, deram origem às pedras, rochas, seixos e pó, que tanto caracterizam nossos solos. Já os átomos de ferro se combinavam com outros metais, como o níquel, e acabaram se concentrando no interior de toda essa massa de substâncias recém nascida.

As leis da Química se faziam presentes determinando o aparecimento de moléculas simples e se poderia continuar descrevendo a formação de mais e mais compostos, mas uma observação se faz importante. Não seria possível a esta altura da história da Terra o surgimento da vida devido às altas temperaturas envolvidas no surgimento destes compostos, atingindo mais de 5.000 graus centígrados sendo este o valor atual no núcleo de nosso planeta. Mas então, algo lento e irreversível iniciou uma longa jornada a preparar não só o ambiente mas também a matéria bruta, inanimada, em direção à vida. E esta preparação começa com um fenômeno simples relacionado até com muitas coisas em nosso cotidiano: todo corpo quente tende a esfriar a menos que receba calor de alguma fonte.

As camadas mais exteriores do planeta, mais próximas do frio vácuo do espaço ao seu redor, acabaram por esfriarem primeiro. Assim se formou a crosta terrestre, uma película de matéria tão fina em relação ao tamanho do planeta quanto o é uma casca de maçã para o seu fruto. Mas o interior quente e pastoso da Terra, pela pressão sobre sua crosta através de gases ali formados, abria fendas em vários pontos de sua superfície lançando torrentes de lava que formavam materiais sólidos e outros gases. A esta altura a água acumulada abaixo da superfície da Terra podia, através dessas fendas que nada mais eram que vulcões e gêiseres, fluir livremente para cima mas na forma de vapor pois a crosta terrestre ainda era quente o suficiente para evaporá-la. A atmosfera da Terra se formou e era constituída basicamente de vapor d'água, metano, amônia e hidrogênio, as principais substâncias químicas usadas como matéria prima nos compostos orgânicos, e também de pouca quantidade de monóxido e dióxido de carbono. O vapor d'água realizava um ciclo intermitente ao voltar à terra na forma de chuva para evaporar em seguida ao meio de quantidades infindáveis de faíscas elétricas. Os vulcões estavam em uma atividade jamais comparada a nada do que é hoje e o Sol banhava a atmosfera com os raios ultravioletas a colaborarem na agitação molecular e aumentar o número de novas e importantes sínteses químicas. Nesse cenário turbulento o qual se dera o nome de condições climáticas primitivas eram realizadas naturalmente uma quantidade enorme de reações químicas nas quais se produziam os compostos orgânicos como, além de outros, os aminoácidos e as proteínas, as principais substâncias moleculares constituintes dos seres vivos. Estas substâncias também são denominadas de compostos de carbono. Os aminoácidos formam as proteínas. Estas são cadeias de carbono ligados entre si como em uma fila "indiana" possuindo ainda diversos átomos como o hidrogênio, o oxigênio, o nitrogênio, etc.

Vale a pena mencionar a famosa experiência, em 1952, do químico norte-americano Stanley L. Miller na qual se reproduziu em laboratório as condições climáticas da Terra nessa época de intensas faíscas elétricas e turbulências na atmosfera. Miller colocou em um recipiente de pouco mais de 60 centímetros, com diversos compartimentos ligados entre si, vapor d’água, amônia, metano, hidrogênio e outras substâncias. Ele fez essas substâncias circularem durante semanas em condições semelhantes àquelas da Terra primitiva, sejam descargas elétricas, aquecimento da água em compartimentos, etc. O resultado da experiência, repetida com muitas variações introduzidas pelos pesquisadores no mundo inteiro, fora a presença de moléculas de aminoácidos e também de proteínas mostrando que seu pequeno e simples aparato era uma verdadeira fábrica de compostos orgânicos. Impossível, então, calcular a quantidade deles criados em nosso planeta naquelas centenas de milhões de anos ou mais de convulsões ambientais, tanto atmosféricas quanto terrestres. A Terra teve tempo e seus elementos uma quantidade inimaginável de tentativas de combinações para que enfim os compostos orgânicos pudessem surgir.

A superfície terrestre se resfriou lentamente e em certa altura da história do planeta a chuva que antes se transformava em vapor começou a formar os oceanos. Muitos milhões de anos se passavam enquanto as águas da chuva iam transformando nossa superfície. Apareciam rios e lagos, os oceanos se moldavam segundo o terreno do qual pertenciam, mas nada era igual ao que é hoje. Ainda a temperatura superficial da Terra não chegara a valores atuais; estava, digamos, apenas morna, mas suficiente para promover uma agitação molecular propícia a novos acontecimentos em termos químicos. Em mares e lagos, rios, poças barrentas, etc., a quantidade de material orgânico chegava a uma concentração tão grande que os cientistas apelidaram de “caldo” ou “sopa” primitivos. Moléculas estáveis parecidas com a hemoglobina de nosso sangue eram formadas juntamente com a clorofila das plantas e tantas outras indispensáveis à manutenção da vida. Enzimas, que são proteínas aceleradoras de reações químicas, formavam novas substâncias orgânicas. Elas participavam de diversas reações contribuindo para que mais e mais substâncias diferentes pudessem surgir. Enfim, mesmo tudo isso ocorrendo há cerca de quatro ou três e meio bilhões de anos atrás, sem o testemunho vivo de ninguém, dá para se ter uma idéia do número quase infinito de tentativas nas quais a natureza produzia e testava substâncias químicas. Mas algo tão importante quanto espetacular, em termos de aglutinação da matéria, também se processava lentamente. Ainda não era nada parecido ou próximo da vida propriamente dita, mas a natureza, mais uma vez, dava outro passo em direção a ela.

Ao dissolver açúcar em água em um recipiente suas moléculas se dispersam, não se aglutinando e ficando em movimento caótico. Assim ocorre para todas as substâncias orgânicas de pesos moleculares não tão elevados. Mas se você analisar aquelas de pesos maiores, seus comportamentos em solução começam a determinarem estruturas de aglomerados complexos onde a chamada química dos colóides passa a ser de relevância ao se querer estudá-las minuciosamente. Na realidade dá-se o nome de substâncias coloidais a esses tipos de estruturas. São substâncias intermediárias, em consistência, entre o estado líquido e o sólido, como uma geleia. A clara do ovo, a gelatina e o protoplasma, a região interna da célula, são exemplos típicos de colóides. Eles chegam ao ponto de se precipitarem quando suas concentrações atingem um determinado valor e podem possuir uma estrutura interna organizada segundo uma reordenação espacial de seus átomos e moléculas.

Em seu brilhante livro “A Origem da Vida”, o russo A. I. Oparin ressalta a química dos colóides, falando de sua natureza especial porque possui leis um tanto diferentes daquelas da química de compostos mais simples, citando experiências como a mistura em solução aquosa de gelatina e goma arábica ou mesmo de proteínas, na qual acontece uma aglutinação característica: formam-se estruturas individuais, isoladas de seu meio ambiente. Ao microscópio notam-se bolhas nitidamente separadas de seu meio aquoso às quais dera-se o nome de coacervatos. Eles muitas vezes crescem em tamanho, uns mais velozmente que outros, ao absorverem certas substâncias orgânicas ao redor, deixando quase pura a água na qual estão imersos. Assim, suas estruturas internas chegam a possuir muito mais substâncias orgânicas em número que água, tendo, o protoplasma das células, essa mesma característica. Oparin chamou o estado do protoplasma das células, embora mais complexo que o coacervato estudado artificialmente, como estado coacervático.

Outra vez o tempo e as possibilidades quase infinitas de combinações de compostos atuaram em favor da vida. Os coacervatos foram um salto evolutivo na organização da matéria. Eles possuem a propriedade, ao absorver matéria orgânica do meio ambiente, de modificar suas estruturas internas através de reações químicas, aumentando ou não de massa e volume. Podem se romper devido a entrada de certas substâncias mas também aqueles mais resistentes com relação ao seu meio ambiente permanecem como sistemas isolados com “vida” independente. Eles não eram sistemas vivos mas o primeiro organismo da Terra com certeza viera de algo parecido com esses conglomerados de substâncias hoje estudados em laboratórios.

Nos dois exemplos dados a respeito de sistemas que encerravam reações químicas, o sistema celular do capítulo Sistema, na parte Equilíbrio, e o outro no mesmo capítulo mas na parte Nível Funcional Sistêmico, eu não especifiquei qual seria a espessura ou tamanho das membranas. Nem a complexidade dos subsistemas necessários à manutenção do sistema batizado de celular. Eles poderiam ter membranas com uma espessura de algumas moléculas simples. São realmente sistemas pequenos em comparação com os coacervatos e foram dados como exemplo apenas para o leitor entender os conceitos daqueles capítulos. A realidade é bem diferente. Os compostos orgânicos formam estruturas de uma complexidade bem mais intricada e sutil. O coacervato é uma dessas estruturas na qual o nível funcional é bem maior que aqueles dos exemplos citados. Ele, ou qualquer estrutura similar, poderia englobar uma outra formação orgânica aumentando o nível funcional sendo digno de nota que não só substâncias comuns são capturadas ou deixadas penetrar em um coacervato, mas um conjunto delas já com um certo “funcionamento” ou atividade. As mitocôndrias poderiam ser um exemplo claro desse fato. Esses subsistemas acrescentaram uma maior atividade aos sistemas principais. Evidente porém o caráter ora nocivo de uma junção dessas. Um pequeno sistema no qual sua membrana seria admissível em um sistema mais amplo, tendo afinidade para entrar, poderia destruí-lo caso os subprodutos de suas reações, ou qualquer atividade sua, fosse nociva ao sistema hospedeiro. E não só a introdução de um novo elemento dentro de um sistema seria possível, mas também o acoplamento de estruturas para se chegar à estabilidade do sistema como um todo. Esses sistemas estáveis proporcionam, em nossa imaginação, claramente o que acontecera em inúmeros ambientes terrestres naqueles quase um bilhão de anos desde a formação da Terra até o surgimento do primeiro ser vivo.

Seriam essas idéias muito simplistas? Afinal, mesmo a mais simples célula procariota é de uma complexidade espantosa, deixando os cientistas perplexos e duvidosos que uma organização tão complicada poderia surgir da matéria bruta. Na verdade, ao pensarmos sobre este assunto, temos sim é que invocar, refletir, em tudo quanto a matéria necessitou de leis e fatos naturais para chegar no que chamamos de vida. Temos a necessidade de inverter nosso referencial, porque por detrás de uma idéia como esta existe uma infinidade de leis naturais, situações ambientais, propriedades da matéria e da energia, etc. Não devemos nos prender em uma afirmação como “a matéria bruta deu origem à vida” sem nos atermos ao conjunto de tudo que colaborou com este fato. Primeiro nós vimos o papel da Astrofísica no tocante à formação dos elementos edificadores dos seres vivos. Bilhões de anos se consumiram para isso. Depois, muito tempo fora necessário até o surgimento dos compostos orgânicos e seus aglomerados como os coacervatos.






           A vida






Se Stanley Miller através de um pequeno instrumento de laboratório, em poucas semanas, conseguiu chegar em substâncias orgânicas como os aminoácidos, imagine o quanto nosso planeta inteiro pôde produzir durante quase um bilhão de anos de atividades ininterruptas. E ainda, o quanto de variedade ele fora capaz de criar. A escala de tempo e quantidade de combinações químicas aqui são de magnitudes tão elevadas que podemos nos perder em nossa imaginação.

Na Astrofísica nós vimos fenômenos físicos de durações imensas como o tempo necessário para uma estrela chegar ao estágio de gigante vermelha ou consumir o seu combustível nuclear. Bilhões de anos. Na Astronomia as escalas de tempo também não são nada pequenas com aquelas às quais estamos acostumados em nosso dia a dia. Se a Terra leva um ano para completar uma volta ao redor do Sol, imagine uma volta do sistema solar em nossa galáxia em 100.000 anos! Ou ainda, tente imaginar a luz, viajando a uma velocidade de 300.000 quilômetros por segundo, demorando 2 milhões de anos até alcançar a galáxia mais próxima, a de andrômeda, sendo que existem mais cem bilhões de outras em nosso universo.

Será que em nossa Terra existem, a não ser em sua própria formação, processos naturais ocorridos em grandes períodos de tempo? Vou citar uma teoria da Geologia a qual dera uma nova dimensão a fenômenos outrora considerados limitados no tempo e, como conseqüência, ajudou aos cientistas do mundo inteiro a começar a enxergar a Terra com uma nova ótica temporal. Depois darei dois exemplos de fenômenos graduais acontecidos na Terra e tendo relação direta com as idéias dessa teoria. Por volta do começo do século XIX, essa teoria dizia que nosso planeta havia passado por intensas catástrofes naturais conduzindo sua geografia até a configuração atual: grandes vales e planícies, falhas geológicas e enormes fendas na superfície, desfiladeiros, planaltos e cordilheiras. Tudo isto porque acreditavam em uma idade de cinco mil anos para a Terra; para este curto espaço de tempo só acontecimentos violentos deixariam nossa superfície com este aspecto de hoje, pois eles acreditavam nesta idade em decorrência de uma data calculada por um arcebispo em 1650 e que se tornou o ponto de referência à cronologia geológica por três séculos. Foi o irlandês James Ussher quem fixou para o dia 23 de Outubro de 4004 a.C., às nove horas da manhã de um domingo, a criação da Terra. Esta era a Teoria da Catástrofe da qual eram adeptos muitos proeminentes cientistas da época. Sobre o presente ela acentuava o caráter vagaroso das mudanças; agora elas transcorriam gradualmente mas no passado suas ações eram rápidas a ponto de criarem cordilheiras e vales em um só dia.

Mas um cientista escocês, Charles Lyell, em 1830, ousou enfrentar todo esse conjunto de idéias publicando um livro, “Princípios da Geologia”, no qual ele defendia uma doutrina, a da uniformidade, que dizia serem constantes e uniformes os processos naturais no tempo e no espaço. Para ele não havia o obstáculo temporal daqueles seis mil anos, nos quais os antigos geólogos foram praticamente obrigados a construir toda uma teoria em cima dele só porque a igreja impunha esta restrição. Os acontecimentos do passado tiveram motivos iguais aos de hoje, sendo alguns catastróficos, mas não como seus opositores consideravam. Placas tectônicas sempre se movimentaram gerando terremotos e mudanças na superfície terrestre, a água das nascentes, dos rios e mares contribuíram gradualmente nas mudanças da paisagem. Lyell, antes do aparecimento da Astrofísica, mostrou a todos da sua época ser a Terra talvez muito mais velha do que se imaginava. E com esse desprendimento conseguiu fazer da Geologia uma Ciência de verdade, livre de dogmas religiosos. A ele fora atribuído a ousadia de ter sido o primeiro homem a desafiar as concepções errôneas a respeito da então consagrada limitação do tempo.

O rio Colorado, nos Estados Unidos, criou a famosa garganta batizada de Grand Canyon, um dos cartões de visitas daquele país. Se um de nós observarmos, durante semanas ou meses a ação desse rio retirando areia e pequenas rochas da margem e do fundo de seu leito, diríamos que nada mudou na profundidade desse glorioso ponto turístico. Ficaríamos frustrados achando que nunca haveria mudança na profundidade, pelo menos aceitaríamos a hipótese de mudanças a longo prazo. Bem, eu disse semanas ou meses de observações. Esse rio sulcou a terra durante um bilhão de anos! Nem se ficássemos dez anos, o que representaria muito em nossas vidas, poderíamos imaginar que fora tanto tempo assim de trabalho para o rio formar essa garganta.

Temos a mania de achar que o tempo para a ocorrência dos fenômenos naturais é compatível com a ordem de grandeza utilizada na contagem de tempo de nossas vidas; quando muito pensamos em algumas centenas de anos. Muitas vezes não temos a menor noção de quanto um fenômeno natural suplanta essas ordens. Foi só a partir de alguns séculos atrás que pudemos, devido a evolução da Ciência, conhecer diversos fenômenos em escalas temporais elevadas o suficiente até para desafiar nossa capacidade de concepção das coisas. Fenômenos nos quais se envolviam grandes dimensões temporais e espaciais demoraram para serem analisados porque a Ciência levou tempo até conseguir proporcionar ao homem as ferramentas necessárias para tanto.

Quantidades inimagináveis de substâncias orgânicas das mais variadas formas e características foram criadas por volta de quatro bilhões de anos atrás onde Stanley Miller reproduziu em laboratório, de maneira extremamente simplista, o meio ambiente da época produzindo alguns desses compostos. Vieram os coacervatos e eles não pararam de evoluir. Outras estruturas de formas desconhecidas para os cientistas de hoje deviam se formar, desaparecer ou sobreviver. Capturavam ou se acoplavam não só a substâncias comuns, simples, mas também a uma variedade considerável de sistemas estruturados capazes de proporcionar novas possibilidades ao seu funcionamento, à sua sobrevivência. A natureza criava e testava uma infinidade de variações possíveis de designs nas quais bastaria uma, dentre tantas, para culminar no que poderíamos chamar de vida. Afinal os sistemas se acoplavam formando outros que transcendiam, na visão realística da cibernética, as funções de cada um separadamente, e assim, caminhando nesta direção continuamente chegaram nos primeiros seres vivos.

Através dos capítulos deste livro chegamos finalmente a um conjunto de idéias no qual podemos resumir em poucas palavras o mistério que envolve a criação: a vida em nosso planeta surgiu devido às condições ambientais do que chamamos de condições da Terra primitiva, de quatro e meio a três bilhões de anos atrás, as quais deram tempo e possibilidade aos compostos de carbono se aglutinarem através de uma propriedade desses sistemas químicos, a qual diz que possuem a capacidade de se acrescentarem uns aos outros, continuamente, fazendo com que o nível funcional sistêmico aumente, levando os sistemas recém formados ao equilíbrio. Sistemas estes auto-sustentados, auto-suficientes, capazes de permanecerem intactos, a não ser que algum fator ambiental ou substâncias nocivas ameacem sua integridade. Sistemas não eficientes a sobreviverem ou sem equilíbrio foram dizimados dando lugar àqueles melhores adaptados ao meio ambiente. É neste sentido que os níveis de organização da matéria, energia e informação, passaram da Química para a Biologia como apresentados no subcapítulo "Equilíbrio", da página 21. Primeiro tínhamos os átomos para a Física e moléculas com seus conglomerados para a Química. Junta-se a elas esta propriedade organizadora que aumenta o nível sistêmico da energia, matéria e informação e chegamos à Biologia.

Esta explanação não é só válida para o surgimento da vida; desde as primeiras formações de compostos de carbono, passando pelos coacervatos, a matéria seguiu este caminho como se fosse um fim em si mesmo. Se pudéssemos presenciar todo esse movimento da matéria naquelas épocas, não poderíamos prever em quais estados os sistemas chegariam no futuro devido às influências aleatórias dos ambientes terrestres. Vemos o filme após o seu final e tiramos conclusões a partir de evidências e fatos presentes com a ajuda imprescindível da Tecnologia e da Ciência.

Não foi coincidência que Miller obteve resultados satisfatórios comprovando a eficácia em organização destes agrupamentos moleculares. Essa capacidade de organização dos compostos de carbono levou a matéria inanimada para além dos coacervatos ou de qualquer sistema tão complexo quanto eles e que não deixaram registros fósseis. A atividade sistêmica aumentava quanto mais compostos se aglutinavam formando estruturas, estáveis ou não. Subsistemas se acoplavam dando origem não só a estruturas rígidas, mas a combinações destas com substâncias fluidas nos interiores celulares. O meio ambiente da época forneceu a energia necessária para tanto pois promovia a agitação molecular suficiente para um maior número possível de combinações serem testadas e, mesmo assim , se levou muito tempo até que surgisse algum sistema no qual se poderia ser reconhecido como vivente.

Sistemas celulares surgiram em muitos ambientes terrestres há alguns bilhões de anos atrás, ocorrendo de imediato uma diferenciação entre eles nos quais a própria diversidade biológica que conhecemos hoje tivera início. Temperatura, luminosidade, concentração de substâncias na água, etc., influenciaram a organização das primeiras células no planeta, dando origem a esse começo de diversidade onde o meio ambiente influenciou a formação desses organismos. Uma concentração maior de sais em determinados locais fez com que o “funcionamento”, a atividade sistêmica de uma célula fosse um tanto diferente daquela onde essas substâncias estavam ausentes ou presentes em menores quantidades. Os fatores ambientais não eram uniformes em todo o planeta e por isto células diferentes ou com algum aspecto, por mais sutil que fosse, haveriam de aparecer determinando diferentes tipos ou designs aos seus descendentes. Existe uma sintonia com o meio ambiente no qual este determinou como seriam muitos dos sistemas surgidos em meio a agitações moleculares, faíscas elétricas, temperaturas, etc.

Nas modernas concepções referentes aos estímulos do meio ambiente na formação de sistemas vivos, coloca-se o nome de ruído organizacional para esse conjunto de fatores que levam os sistemas a se organizarem. Auto-organização é comumente usada no sentido de que os sistemas parecem se organizar sozinhos mas a influência do meio não deve ser desprezada. O potencial de organização - matéria-prima e leis físico-químicas - e a influência do meio são ambos necessários para tanto. Um exemplo simples corrobora com essas colocações: um grupo de pequenos ímãs são deixados longe uns dos outros dentro de uma caixa. Eles tem a propriedade de se agruparem formando um cubo devido às suas estruturas de como são imantados. Se balançarmos essa caixa eles finalmente poderão demonstrar essa propriedade pois, ao se chocarem aleatoriamente, conseguirão por fim se tocarem nos pontos onde se agruparão resultando o formato cúbico. Do aleatório, do caos, vêm a ordem, pois os elementos já estão preparados. O movimento molecular, a eletricidade atmosférica, os gradientes de temperatura, enfim, o conjunto de todos os fatores aleatórios do ambiente primitivo da Terra contribuíram com a organização dos seres vivos. Em um planeta estático nada disso ocorreria.

Neste momento chegamos na Estatística, no jogo de dados, no tempo, nos conceitos do capítulo 4. Sem a movimentação da matéria e da energia causada pelos ambientes terrestres não haveria tempo suficiente para as moléculas e grupos delas se aglutinarem. Nem tampouco para os sistemas celulares.

Centenas de milhões ou quase um bilhão de anos pode ser de magnitude elevada em comparação com o tempo em que estamos acostumados com fenômenos cotidianos. Mas fora o suficiente para promover o aparecimento da vida porque havia movimentação da matéria naqueles obscuros e inóspitos ambientes terrestres a acelerar o processo. Lembre-se dos trinta e seis dados lançados simultaneamente. Enquanto em um lado da Terra um sistema celular tinha dificuldades em se organizar devido, por exemplo, à temperatura local mais alta que a média, no outro um sistema caminhava rapidamente a níveis sistêmicos mais elevados pois estava livre de muitos fatores nocivos à sua sobrevivência. De tantas possibilidades, de tantas tentativas, não seria difícil acontecer!

Todo o planeta estava envolvido em um processo no qual a vida seria o fim de tudo. A natureza “testava” não só combinações de moléculas e estruturas moleculares mas de sistemas. E isto é que faz diferença quando não se acredita que a vida surgiu da matéria inanimada: de moléculas e grupos delas não houve um salto repentino em direção à vida. Nem dos coacervatos. Houve sim muitos processos intermediários até os compostos materiais chegar a um simples sistema com algumas características nas quais o definiríamos como vivente.

Existe um consenso entre os cientistas a respeito da posição dos planetas em relação à estrela mais próxima, na qual se permitiria desenvolver vida pois a temperatura não seria tão alta a ponto de destruir as moléculas de proteína. Veja que no início da história de um planeta é necessário temperaturas altas para os compostos se aglutinarem e formarem os aminoácidos, a base das proteínas, e só após esta fase quente é que a vida pode surgir e se estabelecer no planeta. Esta posição privilegiada de um corpo celeste é chamada de “zona de vida”; Mercúrio e Vênus estão próximos demais ao Sol para isso. Marte, embora longe, teria a possibilidade de desenvolver vida em épocas de intensas atividades geológicas nas quais sua temperatura, em média, estivesse mais elevada que hoje. É possível uma descoberta de formas elementares de vida já extintas no planeta vermelho; as sondas espaciais enviadas até lá não descobriram nada até agora mas é de se questionar se as autoridades não demorariam para revelar uma notícia destas tamanho o impacto filosófico-religioso que traria consigo.

Apesar de toda essa argumentação o leigo ainda se embaraça ao ouvir falar na origem da vida como um fato independente de forças superiores ou sobrenaturais. Qualquer um, por menos informado que seja, tem uma noção de tão complexa é a vida nas suas partes constituintes e funcionais; noção esta não necessariamente baseada na leitura, nas informações proporcionadas pelos livros, mas algo como a intuição ou percepção da realidade à sua volta. Pensar na estrutura de um material inorgânico como um diamante com a sua disposição espacial característica de átomos de carbono não é difícil. Mas com a vida a coisa é diferente. Uma grande dificuldade reside no fato de se entender como ela surgiu do “nada”, sendo este tipo de raciocínio bem comum para muita gente embora isto não passa de uma forma equivocada de se pensar. Não é do “nada”. Este pressuposto “nada” é simplesmente grande parte do conjunto das leis da Física e da Química, da Cibernética, da Estatística e da Biologia. Subestima-se séculos de avanços da Ciência e da Tecnologia em favor de uma posição cômoda, anti-científica, de não se procurar respostas onde elas realmente estão.

Outro argumento para se entender como seria possível a sistemas celulares surgirem "espontaneamente" está ligado ao tamanho da Terra, a quantidade de matéria que possui, ao pequeno tamanho desses sistemas e, mais uma vez, a tão desprezada por muitos, a Estatística. Apresentarei alguns números como base a esta argumentação e espero não cansar o leitor.

A Terra possui um raio médio, devido à sua forma achatada nos pólos, onde seu raio equatorial é maior que o raio polar, de aproximadamente 6.370 quilômetros e consequentemente um diâmetro médio de 12.740 quilômetros. Sua superfície quase chega a 510.000.000 de quilômetros quadrados. A população mundial já é de seis bilhões de pessoas, e se colocássemos cada uma delas em um metro quadrado cada, lado a lado em todas as direções, cobriríamos quase 6.000 quilômetros quadrados, o que corresponderia a apenas uma área de um quadrado de 77 quilômetros de lado.

Esses números indicam o quão pequenos somos perto do lugar que habitamos. Considerando que os seres vivos estão presentes em ambientes de até uma profundidade de dez quilômetros no fundo do mar e outros dez acima da superfície terrestre, o volume ocupado por este conjunto de habitats, mesmo incluindo os desertos e as regiões polares, é de 10.000.000.000 de quilômetros cúbicos. Sendo o volume da Terra de aproximadamente 1,1 trilhões de quilômetros cúbicos, a vida ocupa uma fração de apenas 0,9% deste total. Mas isso em volume bruto: os seres vivos não ocupam cada milímetro cúbico dessa fração. Por outro lado, estou considerando todas as espécies atuais com seus descendentes. Mas seriam preciso poucos quilos, gramas, ou até décimos de gramas de matéria viva, surgida nos bilhões de anos atrás em vários habitats terrestres, sem necessariamente ser ao mesmo tempo, para chegarmos na quantidade e diversificação que ela possui hoje. Células iniciais, clorofiladas, ou com processos de fermentação, etc., deram o início dessa longa caminhada de povoamento do planeta. Não apareceram seres dotados desta capacidade a qual denominamos de vida, de uma hora para outra e com tamanhos consideráveis em relação a nós.

Vivemos em uma estreita faixa ambiental em condições de proporcionar segurança e matéria prima à nossa sobrevivência, delimitada pela atmosfera logo acima de nós e o fundo dos oceanos, e sequer nos apercebemos disto. A Ciência revelou a verdadeira dimensão do homem no universo e em nossa Terra colocando-nos na posição de pequenos “pontos” de matéria organizada no meio de uma película ambiental, o ecossistema terrestre. Aí entra a Estatística. Seria estranho se em um planeta com matéria e condições ambientais como a Terra teve em sua história não surgisse um mínimo de organização material na forma de vida. Alguma coisa iria fermentar aqui e ali até que um sistema celular, ou vários deles, aparecesse e começasse a se reproduzir. Se nenhuma experiência como a de Stanley Miller fosse satisfatória, se nossos corpos não fossem constituídos de compostos de carbono, se para cada espécie viva a “matéria-prima” fosse diferente, se os átomos dos noventa e dois elementos químicos da natureza estivessem presentes aleatoriamente em cada ser vivo, daí sim não teríamos nenhuma pista e não conseguiríamos chegar a nenhuma conclusão satisfatória a respeito da criação. Poderíamos avançar quase que indefinidamente na Ciência e na Tecnologia, como avançamos até hoje, e não obteríamos respostas como essas que apresento aqui.

No capítulo dois “O que é a vida” sustentei a idéia da célula viva devido àquelas propriedades de nutrição, respiração, reprodução e excreção, e no capítulo três, “Sistema”, criei um item somente para descrever as propriedades emergentes da matéria inanimada. Conceitualmente, o que é a vida senão uma propriedade emergente de um sistema delimitado em seu meio ambiente onde se tem lugar conjuntos de reações químicas produzindo as propriedades descritas no capítulo dois? E o que é uma célula senão um conglomerado de organelas ou organóides, os ribossomos, as mitocôndrias, a substância de Golgi, o retículo endoplasmático, etc., apresentando esta série de propriedades as quais acabam em conjunto por resultar em uma só e que denominamos de vida? Afinal, basta um sistema possuir duas ou três dessas propriedades para nos confundirmos ao tentar classificá-lo como ser vivo ou não. Os vírus, que só se reproduzem, já causam alguma confusão. Vários autores os consideram como algo não vivo; outros consideram-nos vivos a ponto de merecerem uma classificação nem de animal ou vegetal, algo individualizado só para encaixá-los na definição de seres viventes.

Considerar a vida como uma “propriedade” da matéria e da energia, de leis físico-químicas, de funções materiais, não é uma simplificação extrema, um rebaixamento do status de algo especial na natureza. A sua organização e complexidade bastam para deixá-la em um nível jamais alcançado por qualquer coisa que conhecemos. Uma grande diferença entre as propriedades emergentes de um sistema rígido, como as que vimos no caso do diamante, e essas nas quais "produzem" um comportamento único na natureza, levando-nos a considerar o sistema todo como um ser vivo, é justamente a falta de organização, versatilidade e fluidez dos componentes. Aos sistemas rígidos não é permitido, pela sua própria natureza, se organizarem com a fluência necessária para evoluírem constantemente e chegar a um nível no qual teriam alguma propriedade que consideraríamos como a de alguma coisa viva. Suas partes não interagem como as dos sistemas celulares; não se encaixam aumentando consideravelmente o nível funcional sistêmico. Não fluem para interagirem formando estruturas complexas e ao mesmo tempo versáteis em funções.

Para a vida não há necessidade de algo imaterial a mantê-la do jeito que é, com as suas funções que denominamos de vitais. E não cabe aqui qualquer discussão do porquê da existência de uma alma a ser o ponto na qual ela estaria subordinada para existir. Discussões religiosas ou filosóficas acerca deste problema não está no domínio da Ciência; esta apenas mostra a auto-suficiência de sistemas com inúmeros feedbacks a garantir a sua existência e permanência como tal.

A matéria bruta se organiza de diversas maneiras e formas e consequentemente em funções. Mas uma linha de organização ou auto-organização, de bilhões de anos atrás, chegou a um conjunto de estados onde as suas funções não estavam limitadas à rigidez de uma rocha e nem tampouco a fluidez da fumaça de algum objeto incandescente. A estrutura "trabalhava" em um meio termo entre esses dois extremos e por isto a sua versatilidade de funções era muito maior que qualquer outro sistema de natureza diferente.

Talvez por isto a nossa concepção de vida tenha que sofrer algumas alterações. Não podemos nos prender somente àquela concepção rígida, descrita no capítulo dois, em que respiração, digestão, reprodução e excreção aparecem como uma referência básica do que seja a vida. Temos sim é que compreender como algo chega a ser vivo após um contínuo aprimoramento ou acúmulo de funções, o processo, quando o nível funcional aumenta gradativamente. Pensava-se na matéria bruta e na vida como duas coisas totalmente distintas mesmo sabendo que a segunda era também composta de átomos e moléculas. Ocorre que uma é extensão da outra porque existiu uma lenta continuidade em organização através das moléculas de aminoácidos e proteínas até o primeiro ser vivo. Existe uma auto-organização presente nessas duas formas de aglutinação da matéria, mas a diferença fundamental entre ambas é a versatilidade em funções e a complexidade daquela que gera os sistemas celulares.

Por outro lado, a vida não surgiu de repente como as pessoas pensam; elas no máximo se perguntam como da matéria inerte se pôde chegar aos habitantes da Terra. É quase a mesma coisa quando alguém olha para um macaco e nota quanta semelhança existe entre ele e o ser humano, mas não admite que viemos de criaturas parecidas com esses símios atuais através de mudanças significativas no decorrer do tempo. A Teoria da Evolução também mostrou a existência de uma continuidade e chocou o mundo quando de sua publicação; com a vida talvez ocorra a mesma coisa: não se sabia da continuidade entre o inanimado e o animado e por isto considerava-se que os seres vivos haviam surgido de forma repentina em nosso planeta.

E se um dia descobríssemos em outro planeta um sistema individualizado deixando penetrar algumas substâncias em seu interior no qual ocorreria reações químicas energéticas, de reparos para a sua sobrevivência e que fosse capaz de se reproduzir e, o que seria desconcertante, fosse constituído não de compostos de carbono mas de outras substâncias? Seria um ser vivo? Sim, e classificaríamos como um ser em um reino separado daqueles dos quais conhecemos aqui. Mas, como os átomos de carbono e todos os outros constituintes dos seres vivos na Terra, e que o leitor viu que não são muitos, existem em abundância em nosso universo, não seria difícil encontrar alguma forma de vida já completa ou mesmo em formação em planetas onde os sistemas celulares pudessem ter a chance de se desenvolverem. Pelos conhecimentos obtidos até agora pela Ciência e pela Tecnologia não é exagero nenhum dizer que a vida em um planeta aparecerá, como apareceu por aqui, bastando existir condições ambientais como aquelas da Terra primitiva. Isto é uma espécie de “dogmatização” da vida para o universo. Onde existir condições especiais ela se desenvolverá, colonizando os possíveis habitats propícios à sua sobrevivência, modificando seus designs e suas funções para se adaptar ao meio circundante, como o fez na Terra.